Planeamento Territorial
Espaço de divulgação e debate de ideias relativas ao planeamento do território, à economia do turismo e ao desenvolvimento regional.
domingo, maio 04, 2025
terça-feira, abril 29, 2025
terça-feira, abril 22, 2025
Discorrendo brevemente sobre a realidade transmontana
1.1 Como caracteriza atualmente o mercado de trabalho em Trás-os-Montes?
A nível nacional, o mercado de trabalho
tem apresentado uma taxa de desemprego que é geralmente considerada boa, pouco
acima dos 6%, que, todavia, não permite perceber dois problemas maiores: por um
lado, a escassez de trabalhadores que se regista nalguns setores de serviços
(restauração e alojamento, particularmente), na construção civil, indústria
transformadora e agricultura; e, por outro, as dinâmicas muito diferenciadas
vividas em diferentes parcelas do território nacional.
Da primeira vertente decorre a necessidade
geralmente reconhecida de se recorrer à imigração para dar resposta à procura
de mão-de-obra existente. No que se reporta à segunda dimensão há que sublinhar
que no caso da oferta de trabalho para algumas funções mais qualificadas ela só
existe num número restrito de lugares, com especial destaque para a área
metropolitana de Lisboa.
Trás-os-Montes sofre pela dimensão limitada
do seu mercado de trabalho e pela fragilidade do seu tecido empresarial na
indústria e serviços. Isso não dizer que a realidade seja a mesma em todo o território
da região, parecendo ser que a parte mais a sul se apresenta menos dinâmica que
a parte mais a norte, isto é, aquela que se usa designar por terra quente
transmontana. Isso dever-se-á a alguma maior capacidade empreendedora e ao
aproveitamento que vai sendo feito de alguns recursos desse território (azeite,
castanhas, produtos da agro-pastorícia, tradições culturais locais e recursos
ambientais potenciadores de aproveitamento turístico, nomeadamente), complementados
pela maior capacidade de captação de estudantes por parte das estruturas de
ensino superior aí sedeadas.
1.2 Quais
considera serem os principais desafios económicos estruturais que esta região
enfrenta, em especial na atração e fixação de emprego qualificado?
Não será fácil reverter as tendências de
longo-prazo instaladas no território num quadro tendencial de perda demográfica
e fragilização do tecido social e empresarial que lhe andam associados. A
resposta, com dificuldades indiscutíveis de implementação e sempre demorada nos
seus efeitos, deveria passar por políticas ligadas ao robustecimento da rede
urbana regional, conforme propôs, entre outros, um antigo Secretário-de-Estado
do ordenamento do território (Prof. João Ferrão), e pela alteração do modelo de
governação da região, com criação de reais capacidades de decisão política-administrativa
próprias.
Obviamente, isso também implicaria que se
alterasse a estratégia de organização/gestão económica e política do território
nacional continental, como um todo, e implicaria, nesse mesmo contexto, que se
implantassem políticas de solidariedade territorial que fossem além do discurso
público. Com essa estratégia, poder-se-ia tirar muito melhor partido dos
recursos endógenos da região, que os tem, indubitavelmente.
2. Que
fatores identificaria como determinantes para explicar o facto de
Trás-os-Montes apresentar persistentemente um PIB per capita cerca de 20% abaixo da média nacional, bem
como baixos salários e uma fraca taxa de atividade económica?
A resposta à questão agora enunciada foi,
em grande medida, dada antes. Os salários pagos num território têm relação
estreita com a procura de emprego aí registado e com o tipo de atividades que
se desenvolvem, isto é, com a qualificação da mão-de-obra empregue. Sublinhe-se
que não só os diferentes setores de atividade não pagam os mesmos salários como
as atividades de topo em matéria de qualificações não estão uniformemente
distribuídas por todo o país. Pelo contrário, estas últimas tendem a
concentrar-se em poucas cidades do país, como já foi dito. O que se disse sobre
a necessidade de alteração do modelo de governação e sobre a capacidade de
atrair e fixar mais recursos humanos e económicos são peças basilares dessa
alteração estrutural que se desejaria ver concretizar.
3. Que
estratégias económicas ou políticas públicas considera essenciais para inverter
ou atenuar a contínua saída de jovens formados da região transmontana?
Como procurei já deixar claro, as
dimensões demográficas, sociais, económicas, políticas e, até, culturais têm
estreita ligação entre si. Não é por acaso que Vila Real e Bragança elegem tão
poucos deputados para a Assembleia da República. Elegendo poucos deputados, as
realidades destes distritos eleitorais têm pouca auscultação nas instâncias de
poder público nacionais e a respetiva capacidade reivindicativa sai muito
enfraquecida. É sobre isso que importa atuar estruturalmente, conforme avancei
antes. A saída contínua dos jovens é um sintoma não a causa do problema
existente.
4. Identifica oportunidades concretas que poderiam ser
aproveitadas para impulsionar o desenvolvimento económico sustentável nesta
região, especialmente ao nível da valorização dos recursos locais?
Eu não subscrevo a ideia muitas vezes repetida que os problemas
de fragilidade económica enfrentados por muitas regiões do país são resultado
da ausência de recursos. Pelo contrário, em múltiplos casos, os recursos e as
oportunidades de valorização económica desses recursos endógenos existem, o que
não existe é capacidade empreendedora ou de projeto, e lideranças sociais e
políticas, neste caso, pensando na necessidade da definição de estratégias para
os territórios, no seu todo.
No caso de Trás-os-Montes, tive antes oportunidade de
me referir a recursos como o azeite, a castanha, produtos da agro-pastorícia
vários, tradições culturais locais e recursos ambientais potenciadores de
aproveitamento turístico, assim como à
existência de instituições de ensino superior com capacidade de serem peça
central na qualificação de recursos humanos e instrumentos de potenciação do
aproveitamento e valorização dos recursos da região. Podia referir-me, também,
ao vinho e ao enoturismo, à gastronomia tradicional, em muitos casos esquecida/desvalorizada,
aos espaços naturais e respetivos potenciais económicos, se explorados dentro
de princípios de sustentabilidade ambiental, económica e social, etc. Isto não
se faz, no entanto, sem projeto e sem liderança (coletiva).
Para se chegar a esse projeto e a essa liderança
importa, entretanto, mobilizar vontades e gente de diversas instâncias de
intervenção social e, daí, partir para o ataque aos problemas existentes no
território, percebidos a partir desse mesmo território.
5. Como vê o papel dos media regionais,
especialmente dos meios digitais (jornais online, redes sociais locais), na
promoção do desenvolvimento económico e social das regiões interiores como
Trás-os-Montes? Considera que têm sido eficazes na valorização económica,
cultural e territorial?
Eu não acompanho quotidianamente os media regionais de Trás-os-Montes e, portanto,
não estou capaz de me referir à sua ação no levantamento dos problemas sentidos
e no contributo que têm dado para a sua discussão e solução. Não tenho, no
entanto, dúvida sobre o papel essencial que podem dar no trazer a público esses
problemas e no espaço que podem reservar para um debate público alargado e
continuado sobre como podem ser potenciados económica e socialmente os recursos
existentes e, claro está, também a ajuda que podem dar para a visibilidade dos
protagonismos e projetos que vão existindo e, daí, ajudar à formação de
lideranças sociais e políticas locais e regionais.
Acresce que um projeto para o território, com a
respetiva liderança social, tem que ter suporte num projeto de comunicação
sólido e eficaz com os atores locais e populações do território, sob pena de
lhes faltar a amarragem social de que precisam e, portanto, também, o alcance em
matéria de contributo potencial para o desenvolvimento de Trás-os-Montes.
Braga, 20 de abril de 2025
J. Cadima Ribeiro
quarta-feira, abril 16, 2025
sábado, abril 12, 2025
Guimarães: um olhar sobre a respetiva dinâmica urbana, cultural e turística numa perspetiva de longo-prazo
1. O início da história
A minha relação com a realidade Vimaranense
começou quando cheguei ao Minho, no final de 1982, para iniciar uma carreira
como professor e investigador universitário.
Nesse contexto, desde então, desloquei-me a Guimarães muitas vezes para dar aulas, primeiro, no Palácio Vila Flor, e, depois, no Campus de Azurém. Obviamente, também realizei muitas visitas à cidade para desfrutar do seu património e vida cultural e cívica.
No quadro da minha atuação como investigador e técnico de planeamento, fui o primeiro académico que propôs que se trabalhasse na materialização de um projeto de articulação de interesses e estratégias de promoção económica, social e cultural entre Barcelos, Braga, Guimarães e V. N. Famalicão, o chamado Quadrilátero Urbano do Baixo Minho.
Isso (a formulação de uma estratégia centrada
no projeto do Quadrilátero) aconteceu em 1996, tendo ficado enunciada no Plano Estratégico de Desenvolvimento do Vale
do Cávado.
Mais tarde, já depois de materializada a associação para fins específicos Quadrilátero, estive ligado a alguma investigação que pretendeu destacar a valia de tal estratégia para potenciar a melhoraria da competitividade, da inovação e o reforço da internacionalização da região, e concorrer com as posturas não-solidárias e centralistas das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.
Continuo a defender essa estratégia, lamentando a falta de empenho na última dezena de anos de vários potenciais atores desse projeto.
Ironicamente, nestes últimos meses dos
mandatos de vários presidentes de câmara dos municípios “interessados”, o
Quadrilátero parece está a virar um Pentágono
Urbano, com a incorporação de Viana do Castelo.
A dúvida é se estamos perante um reconhecimento tardio das virtualidades de um tal projeto ou, simplesmente, de um salto para diante de quem poderá ter má consciência da forma como se posicionou ao longo do tempo.
O primeiro estudo que elaborei (em parceria com a minha mulher, Paula Remoaldo) sobre a dinâmica cultural e turística da cidade de Guimarães foi publicado em 2011, como capítulo de livro, tendo sido tratado o tema “Tourism development policies of a U.N.E.S.C.O world heritage city: the case of Guimarães” (As políticas de desenvolvimento turístico de uma cidade Património Cultural da Humanidade, da UNESCO).
Nos anos seguintes dediquei a minha investigação ao acolhimento por Guimarães da Capital Europeia da Cultura, abordando o tema centrando a atenção no período antecedente, durante a realização do evento, e no legado da CEC 2012.
Sobre esta última dimensão, isto é, do legado,
existe um livro publicado em português, datado de 2017, sugestivamente
intitulado O legado de Guimarães Capital
Europeia da Cultura de 2012: a leitura dos residentes e dos visitantes
(Porto: Edições Afrontamento).
2. O legado da CEC 2012 na perspetiva de alguns dos seus protagonistas
O livro sobre o legado da CEC, escrito em coautoria, também, com a minha mulher, professora do Departamento de Geografia do ICS, Campus de Azurém, Universidade do Minho, incluiu um capítulo onde constam testemunhos de vários dos seus protagonistas, a vários níveis, entre eles o Presidente da Câmara por altura da CEC, Dr. António Magalhães, e várias outras personalidades, como foi o caso do Doutor Francisco Teixeira.
Do que nos disse o Dr. António Magalhães,
entre outras coisas, retive o seguinte:
“Não há nenhuma dúvida que a CEC valeu a pena,
mas não é fácil alimentar a dinâmica cultural então criada. A CEC foi uma rampa
de lançamento. Nunca mais teremos outra”.
Antes, tinha-nos também dito: “O que começou a dar um sinal qualitativo a nível de atração turística foi a reabilitação urbana que vamos [fomos] fazendo a nível do centro histórico”.
Por sua vez, da leitura do legado da CEC feito
então pelo Doutor Francisco Teixeira gostaria de lembrar aqui a afirmação
seguinte:
“A CEC foi um evento turístico, isto é, a
projeção da imagem turística de Guimarães. Também teve sucesso do ponto de
vista da projeção política […]. Isso não quer dizer que tenha correspondido à
qualificação cultural do município”.
Acrescentando que “Um modelo que oriente [orientasse] a economia para as indústrias criativas e para a cultura é [era] bonito”.
No último texto que publiquei sobre Guimarães e a CEC, foi feito um estudo comparativo de Guimarães 2012 e de Košice 2013, na Eslováquia, em termos de modelos organizativos e de legados.
Em termos de resultados dessa investigação,
gostaria de sublinhar três coisas; a saber:
i)
os
resultados conseguidos evidenciaram ser significativamente diferentes - enquanto
Guimarães conseguiu melhorar a sua posição como atração turística, e a
visibilidade do seu património histórico, a cidade industrial de Košice seguiu uma
forma de desenvolvimento mais radical e dinâmica, liderada pela cultura;
ii)
Košice
levou alguns anos a ser descoberta pelos turistas; a mudança geracional e o
desenvolvimento de uma forte indústria de Tecnologias de Informação e
Comunicação levaram ao rejuvenescimento da cidade e à mudança da sua imagem;
iii) Aí (Košice), muitas pessoas qualificadas surgiram como organizadores, facilitadores e influenciadores. No dizer de um entrevistado local, “Estamos diante de um certo tipo de efeito Bilbao ou uma transformação urbana liderada pela cultura”.
Acrescente-se, a propósito, que Košice (em
leitura abrangente) tinha mais população que Guimarães, 240 000 habitantes,
segundo dados de 2016. Isso poderá ter ajudado na criação de massa crítica para
dar corpo ao projeto de desenvolvimento que foi implementado.
3. A diferença pode estar nos detalhes: algumas considerações finais
Fiz antes referência à circunstância do crescimento do turismo em Guimarães ter acompanhado o acolhimento da CEC, isto é, a CEC teve um efeito imediato nesse crescimento.
Ora, o que vale a pena acrescentar, como
resultou de estudos que também fizemos sobre o perfil e motivação dos
visitantes, comparando dados de antes e depois da CEC, é que
i)
o
motivo da escolha da cidade se alterou, por exemplo, a circunstância da cidade
ser Património Cultural da Humanidade era consideravelmente superior antes de
2012, e, por outro lado,
ii) os perfis dos visitantes sofreram também alteração, com (em 2015) um maior equilíbrio entre homens e mulheres, uma descida de visitantes mais jovens e um aumento de visitantes dotados de habilitações académicas mais baixas.
Isso parece indiciar um processo de normalização da imagem do destino Guimarães com a média nacional, isto é, o crescimento turístico que se deu aparece alinhado com a dinâmica genérica nacional, com esboço de um modelo apontando para uma lógica de turismo de massas e, logo, abrindo espaço para que se possa considerar a saturação do destino a um certo prazo, como já acontece noutros destinos nacionais (Lisboa e Porto, por exemplo).
Voltando ao legado da CEC 2012, como nos disse
um dos membros da equipa oficial de avaliação do impacte do evento, “em termos
de
investimento […] a componente imaterial teve algum efeito, mas poderiam ter sido conseguidos melhores resultados com os recursos investidos” (JC).
Um outro membro da dita equipa, defendeu, por sua vez, que “Onde se pode identificar algum tipo de mudança é em termos de capacidade de organização. Aí, parece haver algum tipo de legado” (FCC).
Como nota final, deixo o sentimento de que, com a mudança de protagonistas políticos locais, parece ter havido uma certa rotura de estratégia da gestão municipal, com algum esquecimento do elemento informador que conduziu à acreditação do centro histórico da cidade como Património Cultural da Humanidade pela UNESCO e ao acolhimento da CEC 2012, entre outros marcos desse percurso.
Isso não seria um drama se tivesse sido construído um paradigma de desenvolvimento alternativo, porventura baseado em apostas (mais) radicais. Ora, estou firmemente convencido que isso não aconteceu, e os resultados alcançados deixam isso patente.
Guimarães, 12 de abril de 2025
J. Cadima Ribeiro
quinta-feira, março 27, 2025
segunda-feira, março 24, 2025
“Profile and Motivations of Pilgrims on the Portuguese St. James Way and Their Assessment of the Route”
Abstract
There are many studies on the St. James Way, also known as the Camino de Santiago, but not enough attention has been paid to the pilgrims’ perceptions and motivations, particularly those who choose to do the Portuguese Way. Their motivations may be related to the landscape, the spiritual dimension, the search for well-being and self-therapy, or the need to cope with life’s challenges. This study aimed to identify the motivations, profile, and satisfaction of pilgrims on the Portuguese St. James Way. Regarding satisfaction, we also looked at the lack of services or goods provided along the Way. A total of 351 pilgrims responded to a questionnaire, which was complemented by participant observation to obtain some data. The results show that pilgrims’ motivations were mainly spiritual and cultural. Regarding the pilgrims’ profile, we concluded that most were between 25 and 64 years old, had a high level of education and a formal job, and were doing the Way on foot. Apart from nationality, duration of the walk, and who organized the trip, there were few differences between the pilgrims. Out of the total, 57.3% expressed great satisfaction with the Portuguese St. James Way (the Central Route), which corresponded to their initial expectations. Based on pilgrims’ and researchers’ assessments, we offer policy recommendations to the local authorities aimed at maximizing pilgrims’ well-being.
- Hélder Silva Lopes,
- Paula Remoaldo,
- Eduardo Duque,
- José Cadima Ribeiro &
- Vítor Ribeiro
https://link.springer.com/article/10.1007/s11089-025-01208-4