sexta-feira, novembro 23, 2018

Leiria e o Investimento Direto Estrangeiro

[Caro Professor Doutor José Cadima Ribeiro,

Sou jornalista no Jornal de Leiria e estou a contactá-lo pois gostaríamos muito de obter a sua opinião relativamente a um tema que estamos a tratar.
O tema em questão prende-se com a ausência de grandes grupos empresariais na região de Leiria, como acontece, por exemplo, com a Bosh e a Continental Mabor, em Braga, a Amorim, a Prio e a Renault, em Aveiro, ou a Autoeuropa e a Repsol em Setúbal, entre outras. Independentemente de ser uma vantagem ter este tipo de investimento nas regiões, haverá certamente razões para a região de Leiria nunca os ter sabido atrair.]

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Questões/tópicos.

1 - Na sua opinião, quais poderão ser as causas desta ausência?
Como aspeto prévio à questão colocada da “ausência de grandes grupos empresariais na região”, tenho que fazer notar que o conceito de Distrito nunca foi adequado para caraterizar a realidade económica de Leiria, em sentido amplo, mesmo enquanto existiu como instância de coordenação político-administrativa. Do ponto de vista da dinâmica socioeconómica, o conceito de região funcional oferece-se muito mais adequado. A região funcional é aquela que é definida a partir da interação social (intensa) e das trocas económicas que subsistem num certo território. Nessa perspetiva, as NUTS III, neste caso, a atual NUT III Região de Leiria, é muito mais apropriada para falar da dinâmica económica do território que tem sede principal em Leiria.
A ausência de grupos económicos importantes e, sobretudo, de investimento direto estrangeiro (IDE) significativo, prender-se-á com um conjunto de fatores que usualmente estão associados à sua captação, que vão desde fatores produtivos em abundância e a “bom preço”, infraestruturas e equipamentos públicos de boa qualidade, incluindo aqueles que se prendem com o acesso aos mercados internacionais, disponibilidade de espaço infraestruturado e/ou incentivos fiscais e financeiros, existência de potencial de criação de uma rede de fornecedores e outros agentes sociais e políticos, entre outros.
Sem desvalorizar a existência de alguns projetos empresais importantes noutros territórios, note-se que o principal destino do Investimento Direto Estrangeiro que tem chegado a Portugal tem sido, sempre, Lisboa, isto é, a Área Metropolitana de Lisboa. Se quisermos inquirir o porquê disso, facilmente identificaremos um conjunto de atributos que tem que não é replicado por mais nenhum outro território no país.
No caso dos grupos empresariais de origem nacional, a localização das suas sedes e estabelecimentos decorre, a maior parte das vezes, de motivações pessoais.

2 - O que exigem dos territórios estes grandes grupos que, na generalidade, são multinacionais?
Na sua expressão geral, a resposta a esta questão foi dada acima. Se quisermos olhar para casos concretos, por exemplo, a Autoeuropa, sabe-se que a sua localização ficou ligada, particularmente, às infraestruturas portuárias e viárias existentes na área metropolitana de Lisboa (a empresa é uma das nossas principais exportadoras), a uma mão-de-obra qualificada e relativamente barata, com alguma tradição no setor ou afins, a fortes incentivos fiscais e financeiros associados à implementação da unidade e à formação dos seus ativos, ao potencial existente em termos de constituição de uma rede local de fornecedores. A proximidade face às instâncias de poder político e económico-financeiro pode também não ter sido despicienda.
No caso da Bosh, em Braga, esta aproveitou a existência anterior de um complexo ligado às indústrias eletrónicas, onde se sedeou em termos físicos, e a uma reserva de mão-de-obra igualmente associada a esse complexo industrial, tira proveito da formação técnico-científica assegurada pela Universidade do Minho, nomeadamente nos domínios da informática e da engenharia de sistemas, e beneficia igualmente da proximidade física ao aeroporto Francisco Sá Carneiro, na Maia, a 40 km de distância. Obviamente, os custos do trabalho (relativamente baixos) não serão um fator que o grupo tenha desvalorizado.
O caso da Continental, em Famalicão, Braga, não é muito diferente do da Bosch, posto que a Continental adquiriu e dei continuidade a um projeto empresarial pré-existente, que era a Mabor (produção de pneus). 

(Continua)


(Reprodução parcial de respostas dadas, em 2 de novembro de 2018, a questões formuladas pela jornalista do Jornal de Leiria, Lurdes Trindade, no contexto de um dossiê jornalístico que estava a elaborar)

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