1. Qualquer balanço que se faça do caminho percorrido por Portugal desde que aderiu, em 1986, à União Europeia (então, Comunidade Económica Europeia - CEE) tem que sublinhar o enorme progresso económico e social registado. Aparte a componente de dotação do país em infra-estruturas e equipamentos básicos, a expressão mais notória dessa evolução talvez seja dada por indicadores do foro sanitário, como são as taxas de mortalidade infantil e a esperança média de vida à nascença. Infelizmente, os últimos 8 a 10 anos, os que temos mais presentes, foram de impasse e frustração no rumo que vinha sendo trilhado. Esse é o resultado de um cúmulo de erros, onde se juntam incapacidade de perspectivação estratégica, erros de política económica, ausência de liderança e incapacidade de comunicação entre agentes políticos e actores económicos e sociais, e com os cidadãos, de um modo geral.
2. Nesse caminho de progresso percorrido, entre as dimensões menos conseguidas encontram-se a coesão social e o desenvolvimento equilibrado do território nacional. Por isso, e muito bem, essas vertentes têm enunciado específico no quadro financeiro comunitário de apoio ao desenvolvimento (QREN, na designação específica) que está em fase de implementação: o objectivo 3º do QREN fala em “garantir a coesão social”;e o 4º em “assegurar a qualificação do território e das cidades”. Discutível é se não deveriam aparecer mais acima na ordem dos objectivos retidos. Tenha-se presente que, num documento destes, a ordem das prioridades não é arbitrária. A retenção destes objectivos resulta, numa parte, da análise de situação que foi feita e, noutra parte, da tomada de consciência por parte do decisor político que o território conta, quer dizer, que é muitas vezes efémero o crescimento aportado por agentes externos, sejam empresas ou o agente público central. Curiosamente, esta noção de que o território (recursos, capacidades) conta chegou a custo às instâncias do poder público central.
3. Se é patente a falta de centralidade da coesão do território nas orientações de política pública prosseguidas em Portugal desde há muitos anos, antecedendo mesmo a integração de Portugal na CEE/UE, não deixa de ser chocante que os períodos em que mais se alargou o fosso entre quem era mais e menos desenvolvido tivessem sido aqueles em que o país, globalmente considerado, viveu melhores momentos. Quem disso duvide, consulte o recente relatório produzido pela OCDE, por encomenda do governo português, de avaliação da política regional [OCDE, “Estudos territoriais da OCDE: Portugal”, OCDE (IFDR), 2008]. É curioso como a reclamação de solidariedade que se faz(fazia) de dentro (o país) para fora (UE) não tem(tivesse) qualquer eco intra-muros. Ainda por cima, alguns territórios (a NUT III Pinhal Litoral; Leiria; entre outros) têm o azar de ficar nas fronteiras do retalho feito do país, a régua e esquadro, pelo centralismo lisboeta.
4. Com tamanho desinteresse por parte da administração central, custa até perceber como é que o agrupamento territorial Pinhal Litoral conseguiu ser um dos mais bem sucedidos na presente década e revelar a capacidade de retenção e captação de população que mostrou na última quinzena de anos (1995-2006). Os desempenhos que se invocam estiveram claramente acima da média nacional e mesmo acima do de muitas regiões com características mais urbanas. Se a resposta não esteve no investimento público central e não esteve na capacidade de concertação e liderança do poder local, que permaneceu divido e frágil, então só se poderá atribuir essa boa prestação ao território, ele próprio, quer dizer, às suas empresas e gentes. Daqui se prova, também, que o território conta.
5. Com um desempenho meritório, olhado à luz do registado a nível nacional, o que falhou? Segundo a OCDE (OCDE, 2008, p.47), o que falhou, aparte a fragilidade político/institucional que acaba de se invocar, foi a componente produtividade. Isto é, terá sido a escassez de eficiência no uso dos recursos disponíveis que terá obstado à obtenção de melhores resultados por parte da unidade territorial centrada em Leiria. Acrescentaria eu: nalguma medida, falhou também aqui a organização, a liderança e o sentido estratégico da aposta, neste caso a nível empresarial, se é que podemos separar esta dimensão das demais. Há, todavia, uma atenuante, pelo menos, que se pode imediatamente invocar: em tempo de reposicionamento competitivo das empresas, as regiões intermédias (por referência à taxa de urbanização), onde se inclui o Pinhal Litoral, puderem beneficiar de partes menores do investimento em I&D feito no país nos últimos anos, enquanto outros ficaram com a parte de leão [os dados referentes a 2002 (OCDE, 2008) dizem-nos que, nesse ano, Lisboa reteve para si 49% desse investimento e ao Porto couberam 15%, tanto quanto aquilo que sobrou para as regiões intermédias no seu todo]. Sublinhe-se que estamos a falar de investimento público, na sua larga maioria.
J. Cadima Ribeiro
(artigo de opinião publicado na edição de hoje do
Jornal de Leiria)