“Desenvolvimento Regional: por que algumas regiões se desenvolvem e outras não?” é o título de um livro (edição UNISC, Santa Cruz do Sul, 2010) sobre a problemática em título que o seu autor, Valdir Roque Dallabrida, me fez chegar há um par de meses. Como não basta vontade para que possamos fazer certas coisas, só nestes últimos dias tive oportunidade de fazer a sua leitura e, mesmo assim, a correr.
Trata-se de uma obra com objectivos didácticos, onde, conforme escreve no Prefácio Carlos Brandão, Valdir Dallabrida, actualmente professor da Universidade do Contestado, Santa Catarina, Brasil, “busca sintetizar as diversas abordagens teóricas que buscaram enfrentar esse enigma: por que algumas regiões se desenvolvem e outras não?” (p.9). Conclui o prefaciador que o “livro é oportuno e bem-vindo e poderá contribuir para sanar essa enorme lacuna de textos sintéticos e didácticos que busquem melhor qualificar o debate sobre o que faz o desenvolvimento de uma região e como promovê-lo” (p.12).
Neste sentido, da qualificação do debate sobre o desenvolvimento dos territórios e, até, do país, diria que contributos de natureza similar fazem falta igualmente em Portugal, se bem que a falta de qualidade do debate público a que amiúde se assiste resulte mais da desqualificação dos intervenientes que da ausência de informação técnico-científica de base. Recordando um pensamento que vi reproduzido não há muito tempo num blogue, diria a propósito, que “É impossível derrotar um ignorante em argumentação” (William G. McAdoo) e será porventura daí que relevará a qualidade do debate (político e técnico) que temos.
Encontrei no livro em causa muitas ideias em que me reconheço, nomeadamente as que insistem i) na inviabilidade de prosseguir aproximações de natureza disciplinar na interpretação das realidades complexas das regiões e na construção de respostas em matéria do seu desenvolvimento, e ii) na inviabilidade e/ou inutilidade de uma teoria geral do desenvolvimento, em razão da dita complexidade dos territórios, decorrente de determinantes endógenos (história, geografia, contexto económico e social, instituições, cultura) e exógenos (relacionamento económico, social e político com o restante território nacional e com o exterior) que são sempre singulares.
Como foi invocado, o autor do texto definiu o objectivo ambicioso de “fazer uma breve síntese das principais abordagens teóricas sobre desenvolvimento” (cf., Introdução, p.7) e, para mais, fazê-lo com recurso a uma linguagem simples, que permita ir além da “clientela académica”. Era um enorme desafio esse e será, porventura, essa uma das limitações maiores da obra. Isto é, nunca seria fácil dar notícia em poucas páginas (212) dos contributos em matéria de desenvolvimento do território de autores que vão de Quesnay, Adam Smith e Alfred Marshall a Albert Hirschman, Paul Krugman e Vázquez-Barquero, passando por Celso Furtado e S. Boisier, entre muitos outros.
Confesso, a propósito, que tive dificuldade em reconhecer no texto alguns autores, ficando-me a dúvida se foi a brevidade da referência que fez parecer reduzida a sua contribuição ou se Valdir Dallabrida fez das ideias daqueles leitura diferente daquela que eu faço. Meramente a título de exemplo, da referência que a dada altura faz a François Perroux retenho que este vê o desenvolvimento como “combinações de transformações de ordem mental e social de uma população que lhe possibilita o aumento cumulativo e duradouro do seu produto real global” (p.159), à semelhança de Hirschman e Myrdal, outros autores da corrente do crescimento desequilibrado, seus contemporâneos. Modestamente, penso que, nessa dimensão de pensar social e institucionalmente as dinâmicas económicas territoriais, Albert Hirschman e Gunnar Myrdal foram mais longe que Perroux, até por a contribuição deste último relevar de uma aproximação muito mais micro aos fenómenos económicos.
Sem descurar a importância e contributo para a compreensão das realidades brasileira e da América Latina, também me parece discutível o destaque que tem no livro Celso Furtado, que conheço muito mais como autor do crescimento e do desenvolvimento prosseguindo abordagens macroeconómicas que aproximações territorializadas. O autor da obra terá querido render a sua homenagem a Celso Furtado, o que é legitimo. O problema é o desequilíbrio que tal destaque introduz no texto.
Lendo esta obra de Valdir Dallabrida, voltei a confrontar-me com algo que se me sugeriu deste o primeiro contacto que mantive com investigadores brasileiros, mesmo que tal não seja tão presente nele quanto noutros que conheci: refiro-me ao universo distinto de leituras e referências que parece ser mantido pelos académicos europeus e da América Latina. Haverá razões para tal, sobretudo no passado. Não sei se em expressão disso, causou-me estranheza ver atribuída a “paternidade” da Teoria da Base Económica de Exportação a D.C. North (p.52) e referida a sua génese entre as décadas de 50 e 60 do século XX (p.50). Para mim, a primeira grande referência que se me sugere quando se invoca a Teoria da Base é H. Hoyt (1936-1939), sendo certo que as ideias básicas que dão corpo à teoria serão bem mais antigos.
O trabalho dado a conhecer “agora” por Vadir Dallabrida merece bem uma recensão que vá para além da brevidade destas notas. É ele próprio que o solicita, “para que, no futuro, se possa aperfeiçoar o texto” (p.21.). Não estando eu em condições da fazer nesta sede, talvez esta invocação leve quem a possa materializar a ler a obra e a produzir um contributo para esse efeito mais expressivo.
J. Cadima Ribeiro
(versão "alargada" de artigo de opinião publicado na edição de 2010/09/09 do Jornal de Leiria)
Trata-se de uma obra com objectivos didácticos, onde, conforme escreve no Prefácio Carlos Brandão, Valdir Dallabrida, actualmente professor da Universidade do Contestado, Santa Catarina, Brasil, “busca sintetizar as diversas abordagens teóricas que buscaram enfrentar esse enigma: por que algumas regiões se desenvolvem e outras não?” (p.9). Conclui o prefaciador que o “livro é oportuno e bem-vindo e poderá contribuir para sanar essa enorme lacuna de textos sintéticos e didácticos que busquem melhor qualificar o debate sobre o que faz o desenvolvimento de uma região e como promovê-lo” (p.12).
Neste sentido, da qualificação do debate sobre o desenvolvimento dos territórios e, até, do país, diria que contributos de natureza similar fazem falta igualmente em Portugal, se bem que a falta de qualidade do debate público a que amiúde se assiste resulte mais da desqualificação dos intervenientes que da ausência de informação técnico-científica de base. Recordando um pensamento que vi reproduzido não há muito tempo num blogue, diria a propósito, que “É impossível derrotar um ignorante em argumentação” (William G. McAdoo) e será porventura daí que relevará a qualidade do debate (político e técnico) que temos.
Encontrei no livro em causa muitas ideias em que me reconheço, nomeadamente as que insistem i) na inviabilidade de prosseguir aproximações de natureza disciplinar na interpretação das realidades complexas das regiões e na construção de respostas em matéria do seu desenvolvimento, e ii) na inviabilidade e/ou inutilidade de uma teoria geral do desenvolvimento, em razão da dita complexidade dos territórios, decorrente de determinantes endógenos (história, geografia, contexto económico e social, instituições, cultura) e exógenos (relacionamento económico, social e político com o restante território nacional e com o exterior) que são sempre singulares.
Como foi invocado, o autor do texto definiu o objectivo ambicioso de “fazer uma breve síntese das principais abordagens teóricas sobre desenvolvimento” (cf., Introdução, p.7) e, para mais, fazê-lo com recurso a uma linguagem simples, que permita ir além da “clientela académica”. Era um enorme desafio esse e será, porventura, essa uma das limitações maiores da obra. Isto é, nunca seria fácil dar notícia em poucas páginas (212) dos contributos em matéria de desenvolvimento do território de autores que vão de Quesnay, Adam Smith e Alfred Marshall a Albert Hirschman, Paul Krugman e Vázquez-Barquero, passando por Celso Furtado e S. Boisier, entre muitos outros.
Confesso, a propósito, que tive dificuldade em reconhecer no texto alguns autores, ficando-me a dúvida se foi a brevidade da referência que fez parecer reduzida a sua contribuição ou se Valdir Dallabrida fez das ideias daqueles leitura diferente daquela que eu faço. Meramente a título de exemplo, da referência que a dada altura faz a François Perroux retenho que este vê o desenvolvimento como “combinações de transformações de ordem mental e social de uma população que lhe possibilita o aumento cumulativo e duradouro do seu produto real global” (p.159), à semelhança de Hirschman e Myrdal, outros autores da corrente do crescimento desequilibrado, seus contemporâneos. Modestamente, penso que, nessa dimensão de pensar social e institucionalmente as dinâmicas económicas territoriais, Albert Hirschman e Gunnar Myrdal foram mais longe que Perroux, até por a contribuição deste último relevar de uma aproximação muito mais micro aos fenómenos económicos.
Sem descurar a importância e contributo para a compreensão das realidades brasileira e da América Latina, também me parece discutível o destaque que tem no livro Celso Furtado, que conheço muito mais como autor do crescimento e do desenvolvimento prosseguindo abordagens macroeconómicas que aproximações territorializadas. O autor da obra terá querido render a sua homenagem a Celso Furtado, o que é legitimo. O problema é o desequilíbrio que tal destaque introduz no texto.
Lendo esta obra de Valdir Dallabrida, voltei a confrontar-me com algo que se me sugeriu deste o primeiro contacto que mantive com investigadores brasileiros, mesmo que tal não seja tão presente nele quanto noutros que conheci: refiro-me ao universo distinto de leituras e referências que parece ser mantido pelos académicos europeus e da América Latina. Haverá razões para tal, sobretudo no passado. Não sei se em expressão disso, causou-me estranheza ver atribuída a “paternidade” da Teoria da Base Económica de Exportação a D.C. North (p.52) e referida a sua génese entre as décadas de 50 e 60 do século XX (p.50). Para mim, a primeira grande referência que se me sugere quando se invoca a Teoria da Base é H. Hoyt (1936-1939), sendo certo que as ideias básicas que dão corpo à teoria serão bem mais antigos.
O trabalho dado a conhecer “agora” por Vadir Dallabrida merece bem uma recensão que vá para além da brevidade destas notas. É ele próprio que o solicita, “para que, no futuro, se possa aperfeiçoar o texto” (p.21.). Não estando eu em condições da fazer nesta sede, talvez esta invocação leve quem a possa materializar a ler a obra e a produzir um contributo para esse efeito mais expressivo.
J. Cadima Ribeiro
(versão "alargada" de artigo de opinião publicado na edição de 2010/09/09 do Jornal de Leiria)
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