quinta-feira, março 06, 2008

Produtos regionais e desenvolvimento

Desde os anos 80 do século XX que é relativamente consensual entre os estudiosos do desenvolvimento que as grandes empresas não constituem o único motor do crescimento económico. Este resultado decorre da constatação de que há um número crescente de pequenas empresas de iniciativa local, algumas vezes localizadas em regiões rurais, que laboram produtos regionais de elevada qualidade, que colocam nos mercados nacionais e externos. O sucesso dessas empresas tira proveito, amiúde, da preservação de certas tradições em matéria de produtos típicos desses territórios (produtos regionais).
Quer isso dizer que as especificidades das regiões, associadas às suas histórias, geografias e culturas, podem ser mobilizadas para qualificar os bens e serviços que oferecem. Assim sendo, é expectável que as empresas locais usem as referências territoriais para incrementar o valor dos seus produtos e sustentar a diferenciação face a competidores. Para que essa estratégia obtenha sucesso é necessário que os consumidores valorizem a qualidade desses produtos e que, a nível de oferta, haja quem perceba a oportunidade de negócio que esses bens encerram.
Tal também significa que não basta ter ideias. É preciso que as ideias sejam secundadas por capacidade de realização e de estabelecimento de uma estratégia de mercado conveniente. A este nível, note-se que estão longe de ser despiciendas aspectos aparentemente tão elementares quanto o são a embalagem, a etiqueta e a marca que se usam.
Peça basilar neste processo é a possibilidade de tirar partido de Designações de Origem Protegida ou figuras legais similares, que protegem certos produtos típicos regionais. Essa protecção, aparte impedir a apropriação por operadores externos ao território do produto em causa, garante-lhes a reputação junto dos consumidores, ao obrigar os respectivos produtores ao uso dos ingredientes e dos procedimentos de fabrico e de conservação configurados pela tradição.
Um exemplo de aproveitamento comercial de um produto típico de uma das regiões portuguesas é o da Queijos Matias. Este caso também ilustra a relevância da estratégia de negócio e do funcionamento em rede.
A empresa de cariz familiar Queijos Matias, Lda., localizada em Seia, é um pequeno produtor de queijo da Denominação de Origem Protegida (DOP) Serra da Estrela, que comercializa os seus produtos sob a marca Casa Matias, sobretudo. Esta actividade faz parte de uma tradição de família, que há mais de dois séculos se dedica à produção de queijo da Serra.
Este tipo de queijo é produzido a partir de leite de ovelha, por processos tradicionais. Além da preservação dos métodos tradicionais de fabrico do queijo, os rebanhos da empresa são constituídos exclusivamente por ovinos da raça Bordaleira, que é conhecida por ser “a raça nacional de melhor aptidão leiteira”. Todos os dias efectuam a ordenha, da qual é feita uma selecção criteriosa do leite.
O crescimento da empresa tem sido prosseguido através da conquista de pequenos nichos de mercado, baseado na aquisição, em 1992, do certificado de produto oriundo de região com Denominação de Origem Protegida. Hoje em dia, no mercado nacional, a Queijos Matias, coloca a sua produção sobretudo em super e hipermercados (Continente, Makro e El Corte Inglês, entre outros), sob as suas próprias marcas ou as das cadeias de distribuição com que opera. A relação mantida com o Grupo Carrefour, que até há pouco tempo comercializava 40% da produção total, viabilizou que a firma pudesse vender o seu queijo também nos mercados externos, nomeadamente em Espanha, França e Brasil. Comercializa o seu produto, ainda, nos Estados Unidos, em Itália, no Luxemburgo, na Suiça e no Japão.
Em 2001, na sequência do crescimento do negócio, a Queijos Matias decidiu estabelecer uma parceria com 25 outros produtores da região DOP, por forma a ter acesso à respectiva produção leiteira, o que lhe permitiu alcançar, no ano de 2004, uma produção de 50 toneladas.
Um impulso importante para a expansão da empresa e a divulgação dos seus produtos no mercado internacional foi a participação em várias feiras e concursos internacionais. Além disso, “a Casa Matias foi a primeira empresa portuguesa a aderir ao movimento Caseus Montanus, entidade com sede em Itália e que se dedica a preservar, manter e divulgar os queijos de montanha europeus”.
J. Cadima Ribeiro
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(artigo publicado na edição de hoje do Jornal de Leiria)

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