Meus senhores,
Minhas senhoras,
Caros(as) amigos(as),
1.
O antecedente mais remoto do livro agora
apresentado, com o título “Regionalização e Descentralização em Portugal”, foi a
participação que tive num Debate sobre a temática “Descentralizar ou
Transferir? Defender o Poder Local Democrático”, organizado em Lisboa, a 17 de
novembro de 2018.
A organização do evento prendeu-se, proximamente, com a
implementação da Lei nº 50/2018, de 16 de agosto, que estabeleceu a
transferência, gradual, de um conjunto alargado de competências para as
“autarquias locais” e as “entidades intermunicipais”, e as respetivas
sequelas.
Na intervenção que então
realizei no Hotel Roma sublinhei que a escolha das entidades sobre as quais
incidia o essencial do processo de descentralização que se pretendeu
concretizar ao abrigo da Lei nº 50/2018, os Municípios, e, complementarmente, as
Comunidades Intermunicipais, apresentava uma dificuldade inultrapassável, que
era a ausência de estrutura intermédia, isto é, regional. No contexto da Lei nº 50/2018, percebe-se que
tenha sido atribuída às comunidades intermunicipais o papel de coordenação,
planeamento e gestão de recursos necessário.
Em todo o caso, em muitas
situações, essa escala oferece-se inadequada (subdimensionada), para além da
entidade em causa ser desprovida de legitimidade política direta, e, daí, estar
dependente da capacidade de concertação interna dos municípios participantes, o
que nem sempre é garantido, também.
2.
Um segundo momento no processo que antecede a
produção deste livro é subsequente à morte, prematura, de um colega e amigo,
professor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto (Professor José
Costa).
Na sequência da sua morte, e como forma do homenagear,
alguns colegas da faculdade convidaram-me para produzir um texto para um livro em
sua memória, que foi publicado em maio pp. O livro intitula-se “Estudos de
Homenagem a José da Silva Costa” [Teixeira, A., Delgado, A. P., Carvalho, L.,
Mota, M. I. e Castro e Silva, M. M. (Eds.), Edição Faculdade de Economia da
Universidade do Porto e U.Porto Press, Porto, 2023] e o meu contributo foi
intitulado “Regionalização em Portugal: o Retorno do Debate”.
Nesse texto faz-se referência
à proposta de alteração das NUTS II apresentada pelo Governo Português a
Bruxelas no início de 2022, de que eu tive notícia pouco depois no quadro da minha
qualidade de membro do Conselho Superior de Estatística (Secção Permanente de
Estatísticas de Base Territorial), e que eu entendia que ia mais ao encontro
das comunidades socioculturais existentes, e podia, portanto, ser um elemento
informação importante da organização
territorial das regiões político-administrativas a instituir no Continente.
Isto, na medida em que essa
nova divisão territorial, para já para fins estatísticos, podia dar corpo à
recusa de uma regionalização remetendo para um fundamento orgânico de partição
do poder, a reboque de inércias que se foram instalando, e, daí, constituir um
esboço de resposta de política para atacar com eficácia os múltiplos problemas
e desafios com que diferentes parcelas do território nacional se confrontam e,
genericamente, potenciar o desenvolvimento do país.
Acrescente-se que a nova
divisão NUTS II foi aprovada por Bruxelas, entrando em vigor em 2024 (NUTS II
2024). Daí resulta que o Continente Português passará a estar organizado em 7
NUTS II; a saber:
Norte; Centro; Oeste e Vale
do Tejo; Grande Lisboa; Península de Setúbal; Alentejo; e Algarve.
Como disse, parece-me ser
esta uma divisão do território bastante mais consistente em matéria de coerência
interna das unidades definidas e de equilíbrio potencial na gestão dos recursos
provenientes de Bruxelas e não só e, logo, também, um melhor ponto de partida
para a necessária reorganização administrativa do território.
Lamento que, por coerência e,
também, por respeito das regras de Bruxelas em matéria de limiares máximos populacionais
que estão definidos, não tenha sido feita a redefinição da NUTS II norte.
Note-se que as regras Comunitárias definem como limiar máximo de população das
NUTS II os 3 milhões de habitantes, nomeadamente quando as NUTS II não
correspondem a entidades administrativas existentes. Acrescente-se que não é
apenas a dimensão população que releva aqui mas, sobretudo e particularmente, a
identidade socioeconómica e cultural dos territórios, que importa prosseguir.
3.
Um terceiro aspeto que levou à génese deste
livro foi o retomar do debate da regionalização do país que se esboçou
entretanto, no quadro do passar dos 25 da realização do referendo sobre a
regionalização do Continente, de 8 de novembro de 1998. Como é sabido, os
resultados do referendo significaram a criação de um bloqueio substantivo à
institucionalização da instância regional de governo.
Por detrás desse retomar do debate está, igualmente, a
inclusão dessa temática no Programa do XXIII Governo, definindo-se aí o
objetivo de realizar um novo referendo em 2024.
4.
Tendo presente o contexto que enunciei, entendi
que importava refletir aprofundadamente sobre a oportunidade e os fundamentos
para se avançar no processo de regionalização em Portugal, e sobre aquilo que
pode estar em causa quando se encetam iniciativas de descentralização do poder
suportados apenas nas instâncias locais.
São essas problemáticas e
este debate que este livro coletivo se propôs retomar, reclamando para tanto o
contributo de um conjunto de académicos de várias formações científicas e
sensibilidades político-sociais. Os destinatários da publicação são, também, os
académicos mas, igualmente, os decisores públicos e todos aqueles que,
comprometidos com o desenvolvimento do país, olham para a reforma da sua
organização político-administrativo como a grande reforma estrutural de que
Portugal realmente carece.
Notem que o livro tem por
título completo “Regionalização e Descentralização em Portugal: Reforma doEstado, Aprofundamento da Democracia e Desenvolvimento”, pretendendo-se com
isso sublinhar as dimensões Reforma do Estado, Aprofundamento da Democracia e
Desenvolvimento que estão na génese dos processos de Regionalização e Descentralização
dos países, e podem por essa via ser potenciados.
5.
Deixo-vos o desafio de que leiam este livro e
se assumam como agentes de cidadania. O livro não fecha nem pretendeu esgotar o
debate da temática. É, antes, como é explicitado na Introdução que escrevi, um
fórum de discussão envolvendo múltiplos autores, e um potenciador de um debate
mais alargado e melhor informado. Em nome dos autores do livro, quero deixar-vos
desde já a indicação de disponibilidade de todos nós para ajudarem a dinamizar
outros fóruns sobre a temática que queiram organizar.
Renovo agradecimento pela
vossa presença e pelo interesse expresso no livro que aqui se apresenta. Muito obrigado!
J. Cadima Ribeiro
(Pousada de S. Teotónio, Valença, 26 de setembro de 2023)
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