P: É do senso comum que o Estádio Municipal de Leiria é pouco apreciado pelos leirienses, que consideram que os milhões de euros utilizados nas obras de remodelação foram mal gastos. A União de Leiria queixa-se, também, que é aquele recinto o principal responsável pela pouca afluência aos jogos da equipa sénior de futebol. Na sua opinião, se Leiria tivesse um Estádio emblemático, como o de Braga, ou mais bem enquadrado com a envolvente, como em Coimbra ou Guimarães, a relação da cidade com o recinto seria diferente, ou os milhões gastos seriam sempre uma barreira?
R: A questão colocada desdobra-se em várias dimensões que mereceriam cada uma delas tratamento cuidado. No quadro de uma resposta sumária, deixaria as notas seguintes:
i) No contexto de dificuldade extrema em matéria de défice público e de dívida externa que o país atravessa, é natural que os cidadãos sejam particularmente sensíveis aos encargos associados a certos investimentos públicos, encontrando-se a despesa com a construção dos estádios que acolheram o EURO 2004 na primeira linha de crítica. Sempre se poderá argumentar que haveria usos alternativos desses recursos financeiros mais essenciais e/ou reprodutivos. Discutível que seja a opção de investimento, não creio que esse deva ser o elemento central quando se discute a valia presente dos estádios ou a respectiva capacidade de captar públicos para os eventos desportivos e outros que acolhem. Também não me parece que o problema resida no afastamento relativo dos estádios dos núcleos urbanos;
ii) Na avaliação dos investimentos feitos, importará questionar que projectos de exploração lhe estão associados e se se tem tirado conveniente partido das potencialidades que encerram. A essa luz, é discutível que um estádio de futebol moderno (pensado não apenas em função do recinto desportivo que comporta) não possa ter outros usos que não seja acolher desafios de futebol de 15 em 15 dias. Por exemplo, o Estádio de Montreal, no Canadá, que foi edifício sede de uns dos jogos olímpicos da era moderna mais mal sucedidos, alberga hoje um museu e um espaço de venda de objectos culturais e de simbolismo local bastante frequentado, em permanência;
iii) Importando fazer dos estádios equipamentos com significado para as cidades que os acolhem e dinamizar o respectivo uso, não são irrelevantes as infra-estruturas e as funcionalidades que os rodeiam; quero dizer, um estádio deve ser peça de um projecto urbanístico votado a actividades de lazer (incluindo a vertente desportiva) e de cultura. Se o equipamento for localizado num lugar dissociado de outros usos quotidianos, está-se a tirar-lhe público e reconhecimento da respectiva valia, utilitária e simbólica. O êxito desportivo do clube que acolhe e a popularidade das actividades desportivas aí praticadas também não são matéria despicienda;
iv) Endereçando os exemplos dos estádios de Braga, Guimarães e Coimbra, concretamente, há alguns dados que importa reter para deixar clara a diferença que os separa da realidade do de Leiria, a saber:
1. A valia estética do estádio de Braga significou um encargo financeiro adicional que superou o dobro do custo do de Leiria. Adicionalmente, o espaço onde está sedeado é suposto vir a albergar um conjunto de outros equipamentos desportivos e de lazer, dando corpo a um parque urbano da cidade. Acresce que, como é bem sabido, o clube de futebol que tem aí a sua sede é um exemplo de sucesso desportivo nos derradeiros anos. Pese tudo isso, poder-se-á questionar se se está a aproveitar o enorme potencial que o edifício (monumento) encerra;
2. Dos 8 estádios construídos/remodelados, o estádio de Guimarães foi, por sua vez, o que menos investimento implicou, sendo sede de um dos clubes desportivos que mais adeptos mobiliza, independentemente do momento desportivo que atravessar;
3. No caso do estádio de Coimbra, aparte a sua incrustação no tecido urbano pré-existente, tal qual o de Guimarães, mais do que um estádio, é um centro comercial e acolhe com alguma regularidade espectáculos musicais destinados a grandes assistências.
Isto dito, ficam sublinhadas importantes diferenças face aos projectos invocadas mas, também, elementos de resposta se se quiser tirar melhor partido do investimento feito no estádio de Leiria.
J. Cadima Ribeiro
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