sexta-feira, maio 04, 2012

Investimento direto estrangeiro: será que vale sempre a pena? O caso do investimento da Pescanova, no concelho de Mira, Distrito de Coimbra, em 2007

Este artigo versa uma chamada de atenção para o investimento estrangeiro, com comparticipações elevadas do estado diretas e indiretas e a preservação da natureza.
Foi criada a maior unidade mundial de aquicultura de produção de rodovalho, na zona Sul da Praia de Mira, a 500 metros da costa, em plena Rede Natura 2000, no concelho de Mira, Distrito de Coimbra. A Acuinova filial do grupo Espanhol Pescanova investiu 140 milhões de euros nesta unidade de produção, foi reconhecida como PIN – Potencial Interesse Nacional. O contributo do estado português acordado é de sensivelmente 45 milhões de euros e 42 hectares de terreno, existindo o compromisso de criação de 200 postos de trabalho por parte da Pescanova. A fábrica foi inaugurada em 21 de Junho de 2009. Mais de dois anos após o início de laboração ainda só tinham empregado 106 pessoas, o que não correspondia à perspetiva inicial.
Situações como esta, com elevado investimento financeiro por parte do estado tendo como contrapartida 200 postos de trabalho, na melhor das hipóteses e fazendo as contas por alto, os 45 milhões de euros, multiplicando 200 postos de trabalho por 14 meses e posteriormente multiplicar por 10, o equivalente a 10 anos de atividade equivalia a 28.000 salários. Dividindo por 45 milhões de euros por 28.000 salários o resultado é de 1607 euros por mês para cada funcionário, por isso eles vieram para Portugal, que bom negócio para eles, dez anos de ordenados pagos e 42 hectares de terreno.
No decreto-Lei n.º 174/2008 de 26 de Agosto, no artigo 1, terceiro ponto é reconhecido como sendo PIN – Potencial Interesse Nacional, projetos que representem um investimento global superior a 25 milhões de euros, assim como é referido no mesmo artigo, ponto dois, alínea VI) Balanço económico externo, nomeadamente no aumento de exportações ou na redução de importações. Estes dois argumentos convergem para que o investimento da Pescanova seja um PIN por ter um investimento muito superior a 25 milhões de euros e a empresa espera produzir 7000 toneladas de rodovalho por ano sendo 99% para exportação. Em relação à exportação, é muito interessante porque toda a produção para exportação é vendida à mesma empresa, que pertence ao grupo Pescanova, e está instalada em Espanha. Só depois vende para o resto da Europa e mundo. Possivelmente o que acontece é venderem a um preço pouco superior ao de custo, à empresa do grupo e as mais-valias para a Acuinova serem muito baixas. No mesmo decreto-Lei no ponto “8 – Sustentabilidade ambiental, alinea a) Compatibilidade com os valores naturais presentes, designadamente com as áreas protegidas e com a Rede Natura 2000…”.  
O Sitio de Interesse Comunitário da Rede Natura 2000 das Dunas de Mira, Gândara e Gafanhas têm a área de 20 511 ha distribuídos pelo Concelhos de Cantanhede 13%, Figueira da Foz 18%, Mira 51% e Vagos 12%. O Concelho de Mira com 6340 ha. No respetivo Plano Setorial estão referenciadas como fatores de ameaça, a ‘pressão turística, construção de campos de golfe, eutrofização do sistema lagunar, invasão por espécies infestantes, drenagens agrícolas e captações de água, incêndios, extração de inertes, efeitos das obras de proteção costeira (esporões), prática de desportos motorizados e pisoteio das dunas. As orientações de gestão referidas no mesmo documento são a salvaguarda da faixa litoral, destacando-se os habitats dunares e a flora associada, área dunar esta que foi ocupada por 42 hectares da Empresa Acuinova.
A Pescanova antes tinha tentado instalar este projeto na Costa da Muerte, na Galiza, mas foi chumbado pelas autoridades regionais, que invocaram questões ambientais.
Existe uma opinião cada vez mais unanime de que o Decreto-Lei n.º 76/2011 de 20 de Junho, que vêm substituir o Decreto-Lei n.º 174/2008 de 26 de Agosto, vem facilitar a subversão dos valores naturais em relação aos interesses económicos e baixa nitidamente o patamar de exigência para ser considerado PIN – baixando por exemplo o investimento de 25 milhões de euros para 10 milhões.
O investimento direto estrangeiro é de grande importância para a economia portuguesa, mas não pode ser visto como a única solução para o desenvolvimento económico de Portugal e para resolver os problemas estruturais da economia. Na minha opinião quando o investimento tem apoios do estado diretos ou indiretos através de exceção de impostos devem ser tomadas precauções, para quando deixar de interessar à empresa manter-se em Portugal, se deslocalizar sem pagar indeminizações correspondentes ao investimento inicial do estado. Não devemos esquecer o caso de muitas empresas ligadas por exemplo ao calçado e ao vestuário que se deslocalizaram para outros países com mão-de-obra mais barata, criando elevados índices de desemprego nas áreas onde estavam instaladas, criando uma forte retração no desenvolvimento desses locais.

Paulo Azevedo

Bibliografia
Sites:
Legislação:
Decreto-Lei n.º 174/2008 de 26 de Agosto
Decreto-Lei n.º 76/2011 de 20 de Junho                    

(artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular "Economia e Política Regional" do Mestrado em Geografia, do ICS/UMinho)

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