quinta-feira, maio 03, 2012

Regionalização: uma questão politica?

A regionalização surgiu no sistema político português em 1976. Fazia parte de um projeto que visava a descentralização do Estado português, interpretada como um caminho fundamental na consolidação das aspirações democráticas que teve o seu início com o fim do Estado Novo.
Apesar de consagrada na Constituição da República Portuguesa em 1976 nos artigos 238o, 256o e seguintes, com o passar dos anos e com um sistema político-partidário cada vez mais fervoroso, a regionalização começou por esbarrar em contradições e impasses que levaram a um sucessivo adiamento, que culminou com a alteração na constituição deste processo ambicioso de reforma estatal que inviabiliza praticamente a sua aplicação.
Numa altura em que muito se tem debatido e opinado sobre o Documento Verde da Reforma da Administração Local, questiono-me se num contexto em que as regiões administrativas fossem uma realidade nacional, se as disparidades e a falta de coesão económica seriam tão evidentes como são nos dias de hoje. A intervenção externa que assiste económica e financeiramente Portugal propõe diminuir o número de freguesias e com isso fazer uma redução drástica nos custos. Apesar de não ser admitido pelo ministro que tutela esta pasta, esta reforma vem no meu entender apoiar o ideal da regionalização, em que é necessária maior autonomia para os municípios, impondo ao mesmo tempo maior rigor nas contas que cada um terá que efetuar. Mas as grandes questões que se impõe são: de onde é que vêm os apoios financeiros para as regiões? E como é feita essa mesma distribuição de fundos?
A regionalização proporcionaria às regiões um desenvolvimento mais elevado e mais sustentado e com maior proximidade, algo que o sistema atual não permite devido à ausência de conhecimento da realidade local. Para se desenvolver um país, não se pode apenas devolver determinadas regiões, apresentá-las perante o exterior como sendo o seu todo nacional. É necessário olhar para todo o território que com muito sangue derramado foi conquistado há muitos séculos atrás. É necessário apoiar as regiões que estão mais afastadas dos grandes aglomerados urbanos e desenvolver estas. Como é do conhecimento geral, com o sistema administrativo em vigor estas regiões nunca serão desenvolvidas. É por isso necessário que se veja uma nação que não obstante as diferenças culturais, até de certa forma linguísticas, representa uma singular identidade nacional.
Em termos de regionalização mas não só nesta matéria, o que assistimos em Portugal é a uma diferença de planos que têm também diferentes ritmos de atuar. Existe uma grande diferença entre o discurso e a prática. Acredito que não seja só no nosso país que isto aconteça, e apesar de muitas das vezes nos darmos por habituados e a um certo conformismo por este tipo de atuação, o certo é que muito dos discursos se tivessem sidos colocados em prática, provavelmente neste momento estaríamos noutro patamar tanto a nível regional como a nível nacional. A regionalização fazendo parte das coisas da lógica, nunca fez parte da lógica das coisas, e na altura em que aconteceu em Portugal um referendo, a campanha que se assistiu baseou-se na má informação às pessoas sobre o que implicava realmente todo este processo, acabando assim por, a quando do momento de decisão por parte da população, este projeto não ser viabilizado.
Atualmente, para que este processo seja posto em prática é necessário efetuar um referendo a nível nacional, seguido de um a nível local, o que torna muito difícil a sua aprovação.
A descentralização do poder poderá ser vista como um passo para o crescimento regional, que por sua vez impulsiona o crescimento económico, passando assim o governo central a estar liberto de determinadas funções, focalizando-se assim noutras matérias que visem a sustentabilidade financeira e económica do país, e por outro lado as regiões passam a deter maior autonomia e liberdade de ação. A responsabilidade passará a ser mais elevada, mas penso que uma organização administrativa por regiões levará a um crescimento mais sustentado e equilibrado.
Em suma, o avanço neste sentido passa acima de tudo e primeiramente por uma mudança de mentalidade, não só a nível político mas também de toda a sociedade. É necessária uma maior interação entre governos e população, dando assim uma maior ação participativa à sociedade e a oportunidade desta contribuir para o desenvolvimento regional e nacional. Uma reforma administrativa através de regiões seria uma oportunidade muito interessante para o desenvolvimento nacional.

Sérgio Soares

(artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular "Economia e Política Regional" do Mestrado em Geografia, do ICS/UMinho)

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