Vivemos um
momento de incertezas e dificuldades. O que vem a ser esta epidemia que nos assola
desde o início do ano? O que é a COVID-19 ou, mais popularmente, o chamado coronavírus?
Um vírus que só “ganha vida” quando entra em contato conosco. Um verdadeiro
predador parasita que se não se alimentar da vida só sobrevive por poucas horas
ou poucos dias em algumas superfícies, como plásticos, metais, entre outras.
Acredita-se
que o vírus tenha-se manifestado através do morcego, aparentemente porque sua
cadeia biológica foi atingida, talvez devido aos desmatamentos exacerbados e o
descaso com as questões ambientais, fruto dos interesses de retroalimentação
que somente um sistema predatório como o capitalista suscita. Com seus
primeiros casos conhecidos na China, em Wuhan, na província de Hubei, se propagou rapidamente por todo o mundo, fazendo
com que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarasse, em 30
de janeiro de 2020, o estado de Emergência de Saúde Pública de Importância
Internacional (ESPI).
Espalhou-se
rapidamente por conta das facilidades do tráfego internacional, facilitado por
conta das necessidades do sistema económico e do deslocamento de capital proporcionado
pelas necessidades de viagens.
Wuhan: primeiro foco da doença.
Fonte: https://i.insider.com/5e29d1b324306a61fb0cc3e7?width=1100&format=jpeg&auto=webp
Diante da
atual situação, arrisco-me a uma polémica indagação: até que ponto o turismo pode
contribuir para o aumento dos riscos pandémicos e até que ponto estaríamos preparados
para enfrentá-los?
A pandemia provoca repercussões econômicas, tanto de
natureza transescalar quanto de natureza intertemporal, gerando assim efeitos
de transmissão que ressoam no espaço e no tempo de modo distinto, conforme o
grau de sensibilidade e vulnerabilidade macroeconômica dos países e
microeconômica das cadeias globais de produção e consumo.
As repercussões assimétricas de natureza transescalar
acontecem à medida que todas as regiões do mundo são afetadas humanamente pelo
surto. Isso provoca tensões nos mercados financeiros, com queda de ativos, e,
em um segundo momento, impactes negativos na produção e no consumo ao longo das
semanas, em função do desabastecimento das cadeias de distribuição de produtos
vindos da China.
Outro aspeto
que devemos considerar e que nos atingiu de uma maneira abrupta são as
consequências psicológicas devido às mudanças repentinas de rotinas e privações
necessárias, como, por exemplo, o impedimento de ter contatos sociais: trabalho
e estudo, por exemplo. Profissionais da saúde, limpeza e os que trabalham
diretamente no abastecimento alimentício acabam por assumir riscos em prol das
populações, desempenhando papel fundamental, merecendo todo o nosso apoio e
reconhecimento.
O governo
Português tem-se mostrado comprometido, angariando fundos junto da União
Europeia para impedir que as empresas iniciem um ciclo de demissões, o que só
agravaria o cenário, além de regulamentar a residência dos estrangeiros que aguardam
pelo seu visto junto do SEF, garantindo o direito ao sistema de saúde, caso
necessário.
Portugal
regulamenta a residência de estrangeiros no país devido ao COVID-19.
https://www.publico.pt/2018/11/03/sociedade/noticia/portugal-precisa-desesperadamente-imigrantes-combater-falta-mao-obra-1849788
Muitos
países subestimaram o poder de letalidade do COVID-19, seja por interpretações
ortodoxas e anacrónicas ou, por mero descuido, demoraram a aderir à quarentena.
Infelizmente, muitos desses atrasos se relacionam com a importância do turismo
para essas economias. Esse foi o caso da Itália, que se tornou rapidamente o
epicentro do vírus na Europa.
Portugal foi
um dos primeiros países a seguir os protocolos internacionais, mesmo com a
importância da atividade turística e sua queda se dando a cada dia, corroborando
as políticas de isolamento recomendadas. Acreditamos colher benefícios no
futuro, pois mesmo com o grande número de casos, somos um dos países com os
dados mais otimistas do continente na eficácia de controle da pandemia.
Hoje, os Estados
Unidos se tornaram o maior epicentro da pandemia, podendo superar a Itália em
número de mortes. Infelizmente, é mais um exemplo de país em que o governo
insistiu em negligenciar os dados da OMS, ou seja, o isolamento social como
principal medida de controle.
Devido à
proximidade entre nossos povos, o Brasil é outro país que merece preocupação. A
clara inabilidade do presidente de extrema-direita, Jair Bolsonaro, assim como
problemas estruturais graves, como a nebulosidade dos dados sobre a pandemia
devido à defasagem do número de testes, faz-nos acreditar que o número de pessoas
infetadas seja superior aos números divulgados. Os governadores dos estados entraram
em rota de colisão com o presidente e vêm tentando ao máximo combater a
pandemia de acordo com os protocolos da OMS.
Para piorar
a situação brasileira, o isolamento social é dificultado porque, desde 2016,
houve uma reforma na legislação trabalhista de caráter neoliberal que resultou
na precarização do trabalho, aumentando a informalidade e diminuindo
benefícios. Isso faz com que muitos trabalhadores se neguem a parar suas
atividades, pois não possuem nenhum tipo de segurança social. Hoje, por pressão,
o governo brasileiro diz que vai liberar um fundo de ajuda às famílias mais
necessitadas. Esperamos que isso se torne realidade em breve.
Com uma taxa
estratosférica de mais de 12% da população brasileira desempregada, setores
como o turismo são diretamente atingidos. Em Portugal, o turismo também sofreu
a queda com o fechamento dos aeroportos e fronteiras, modificando o planejamento
das viagens e solapando as agências turísticas de forma inesperada, aumentando a
crise económica.
A
imprevisibilidade parece ser o conceito mais importante que aprendemos, com duras
penas, como nesses últimos dias. Mutações e reações adversas, de indivíduo para
indivíduo, remetem-nos para a importante reflexão a respeito das vidas que se
foram e das que estão em risco, remetendo-nos para uma frase de Milton Santos (1926-2001),
importante geógrafo brasileiro:
“Cabe a nós fazer dessas condições materiais a
condição material da produção de uma outra política.”
Karen Cristina Galletto
Referências:
LAI, K.
K. R.; WU, J.; HARRIS, R.; McCANN, A.; WATKINS, D.; PATEL, J. K. “Coronavirus
Map: Tracking the Spread of the Outbreak”. New York
Times [27/02/2020].
Site de Organização Mundial da Saúde - https://www.who.int/eportuguese/publications/pt/
(Artigo de opinião
produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de
Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do
ICS/UMinho)
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