É quase consenso de que o turismo vivencia uma
metamorfose diária. Os turistas esperam cada vez mais alternativas diferenciadas
para poder apreciar e novas possibilidades de mercados apareceram exponencialmente
nos últimos anos.
Esse crescimento perpassa por uma palavra que, apesar
de tornar-se demasiado clichê, é essencial para que o fenômeno aconteça:
inovação. A inovação e o turismo caminham de mãos dadas com a tecnologia, e nesse
sentido o ato
de inovar significa a necessidade de criar caminhos ou estratégias diferentes para
atingir determinados objetivos. Inventar, ou reinventar, sejam ideias,
processos, ferramentas ou serviços, são fundamentais para os negócios, lembrando
que todos os dias o mercado turístico se modifica para enfrentar uma verdadeira
“batalha” por resultados, ora adaptando-se, ora reinventando-se, conforme as
necessidades aparecem.
Segundo
a Organização Mundial do Turismo, a inovação é a chave para criar setores cada
vez mais competitivos e sustentáveis, e está diretamente associada a como os
indivíduos podem acessar diferentes recursos em seus contextos de viagem. Os consumidores tendem a não buscarem mais países
meramente para conhecer suas capitais, ou apenas o que há de famoso ou popular,
mas percebem que, de modo geral, existem muitos outros atrativos tão, ou mais
interessantes, que os considerados convencionais, despertando curiosidades até
então negligenciadas.
As motivações turísticas se modificam com o passar dos
anos e criam perceções a respeito de potenciais destinos e atrações, assim como
exercem grande influência sobre as propagandas para atrair consumidores, que,
nesse sentido, influenciarão uma viagem. Poucas experiencias são memoráveis,
intensas, promovem entretenimento, educação, evasão ou estética que surpreendam
o turista. Uma viagem diferenciada exige pessoas e condições especiais. Isso
não implica apenas no poder económico, mas fundamentalmente em atitudes e
posturas sociais, culturais, estéticas e políticas.
A oportunidade de desfrutar dos aspetos sociais do enoturismo,
entre outras modalidades ligadas a fatores diferenciados, pode ser uma
importante motivação para viajar, ao passo que os aspetos do vinho também se relacionam
com a saúde e o bem-estar, e não mais apenas como a busca por sensações de
prazer ou hedonismo, podendo consolidar-se
como um fator significativo para o seu consumo.
Imagem de propaganda de enoturismo no distrito de Braga, Portugal. Fonte:
TripAdvisor.
A viticultura em Portugal e em vários países da Europa,
como, por exemplo, Itália, França e Espanha, já possuem um setor dinâmico e consolidado,
apesar dos inúmeros concorrentes que cada vez mais conseguem adaptar-se aos
negócios.
Fonte: https://www.clubevinhosportugueses.pt/vinhos/o-estado-da-viticultura-mundial-2/
Além do enoturismo, outra forma de entretenimento que chamou-nos a atenção atualmente é o de exploração
da cerveja, principalmente com a intensa profusão de micro cervejarias de
produção artesanal, também conhecidas como modelos “craft beer”, que
hoje podemos encontrar com facilidade, prova de que é um mercado cada vez mais
em ascensão.
Alguns países europeus possuem tradição e apresso pelo
consumo habitual da cerveja, como por exemplo Holanda, Alemanha, Inglaterra, Irlanda
e Bélgica, mas Portugal parece-nos também atualmente adentrar esse seleto rol.
O vinho e a cerveja são de certa forma companheiros, sendo
as duas bebidas fermentadas mais importantes do mundo, uma derivada das uvas e
a outra de grãos, respetivamente. A cor
e o sabor do vinho são influenciados pelo tempo de contato com as cascas das
uvas e a cerveja ganha muito de sua cor e sabor do malte usado na produção.
As comparações entre os dois setores são possíveis,
pois, além de serem duas bebidas milenarmente populares, podemos associá-las a
práticas turísticas semelhantes em plena expansão, como exemplo: as visitações guiadas às empresas e zonas de
produção, museus ligados à enocultura e cervejeiros, entre outros
estabelecimentos, sem contar com as inúmeras possibilidades de contratos com historiadores
como prestadores de assessoria cultural.
O vinho sempre foi um instrumento poderoso de
diferenciação social, coisa que nem sempre a cerveja preocupou-se. Mas notamos
que esse conceito já tem mudado notoriamente e está por cair, pois mudanças comportamentais
entre os consumidores são claras, e temos um crescente e exigente público dentro
do mercado cervejeiro que está rompendo paradigmas, fazendo com que os preços e
qualidade das cervejas aumentem com as novas opções e segmentações do barato e do
caro. Vale a pena lembrar que existem cervejas que percentualmente são tão ou
mais caras do que um bom vinho.
Ainda assim, apesar da cultura das vinhas marcar profundamente
as atividades rurais, as da cerveja, principalmente as artesanais, parece que vieram
para ficar. Em Portugal, essa cultura cervejeira parece ter chegado mais tarde,
mas verificando em números, entre
os anos de 2017 e de 2019, as vendas na categoria de cervejas especiais cresceram
88% em valor e 112% em quantidade. Em comparação ao mercado global, o qual
evoluiu 8% em valor e 5% em quantidade no mesmo período, é um dado considerável.
Olhando apenas os últimos 12 meses, o acréscimo foi de 10% em valor e 15% em
quantidade, de três a cinco vezes mais, do que os 3% do mercado total global de
cervejas.
Para os protagonistas
do setor, esta é uma revolução bem recebida. O movimento das cervejas
artesanais contribuiu para um aumento da dinâmica do mercado cervejeiro e para
alargar as ofertas disponíveis ao consumidor.
Cervejas artesanais
portuguesas: um mercado em expansão.
Em
Portugal, cada vez mais as cervejas artesanais relacionam-se com o turismo. Como
aconteceu em quase todos os outros países europeus, pode-se dizer que Portugal
entrou finalmente nesse nicho do mercado, possuindo atualmente mais de 30
marcas nacionais. Essas cervejas atingiram um patamar de excelência de
qualidade e atratividade. Já existem sítios a visitar de Norte a Sul do país, como
por exemplo, as fábricas de cerveja “Post Scriptum” (Trofa) e a “Burguesa”
(Vila Nova de Gaia) e, também, cervejarias especializadas, como por exemplo a “Catraio
Beer Shop” (Rua da Cedofeita, Porto), entre outras.
A expansão das cervejas não parou por aí: Portugal soma sucessos e prémios internacionais
importantes. A Maldita — bem-dita seja — foi eleita a
melhor “Barley Wine” do continente europeu (o que em português quer dizer
qualquer coisa como “vinho de cevada”) no World Beer Awards 2014.
Trata-se de uma bebida artesanal produzida na cidade de Aveiro, criada em
2013 por Artur e Gonçalo Faustino, pai e filho, ambos engenheiros, que possuem
uma micro cervejaria.
Concluímos que existe turismo para todos os tipos de aficionados, sejam
eles cervejeiros ou fãs de um bom vinho, pois o mercado os acompanha, cresce e
oferece diferenciações cada dia mais. Contudo, e de maneira bastante otimista,
podemos esperar que esse “turismo alcóolico” contribua para a manutenção económica
de diversas localidades, seja através do clássico enoturismo, ou do novo modelo
cervejeiro artesanal.
Acreditamos que uma das melhores formas de aumentar a
competitividade de uma determinada atração turística passa pela produção e
divulgação dos conhecimentos adquiridos pelas experiências bem sucedidas, como
forma de serem aproveitados pelos agentes económicos e pelos organismos
institucionais de criação de estratégias competitivas. Neste aspeto, e no que
concerne à produção tanto da cerveja como de vinho, é fundamental valorizar a
história das regiões, suas culturas e especificidades, para coadunarmos crescimento
sustentável e viabilidade de mercados.
Desta forma,
conclui-se que o mercado turístico não é mais o mesmo. Está sempre em constante
evolução e transformação, assim como os tradicionalismos, pois, como vimos, mesmo
com mercados aparentemente distintos, vinho e cerveja têm em comum a capacidade
de atrair diversos tipos de público, até porque o valor agregado aos produtos
tem sido constantemente reavaliado.
Karen Cristina Galletto
Referências:
(Artigo de opinião
produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de
Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do
ICS/UMinho)
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