APROTURM
- Associação dos Profissionais de Turismo do Minho
Fórum
O
Turismo no Minho no Pós-Coronavírus
Tema
"O Impacto do
Emprego e Profissões do Turismo"
(30 de abril de 2020)
0.
Agradeço
à Associação dos Profissionais de Turismo do Minho o convite que foi endereçado
à UMinho para indicar um seu representante para o debate.
Congratulo-me pelo
seu sentido de oportunidade, por trazerem para o debate o tema que foi
escolhido.
Saúdo os demais
oradores e participantes no Fórum, formulando votos de que se encontrem de boa
saúde.
1.
A
minha intervenção será centrada em 5 tópicos, para destacar aquelas que me
parecem ser as questões/preocupações centrais do momento, e fazer a gestão
adequada do tempo me foi atribuído.
Esta intervenção é
suportada em reflexão própria e nalguma literatura académica do âmbito do
turismo (sobre o impacte da COVID-19), que começa a surgir.
2.
Tópicos
selecionados:
i)
Incerteza;
ii)
Insegurança;
iii)
Assimetria;
iv)
Reconfiguração;
v)
Retorno
ao caminho.
3.
Desenvolvimento
dos tópicos selecionados
i)
Incerteza
A crise sanitária,
na sua expressão no mundo e implicações de saúde, sociais e económicas, foi um
evento absolutamente inesperado e esmagador, comparado nas suas repercussões a
tragédias como as da 2ª guerra mundial. Ninguém, indivíduos/famílias, empresas
e outras organizações, estado, estava preparado para lidar com tal fenómeno e
ninguém sabe muito bem o que se vai passar a seguir, como e quando.
Daí resulta que
estamos perante um cenário de gestão de um fenómeno num contexto de
aprendizagem e adaptação/resposta. O planeamento, a decisão, o investimento
devem acontecer mas guiados por esse ambiente de incerteza, o que recomenda
muita prudência, e apostas “seguras”, quer dizer, estruturais.
Dado o contexto e
implicações mundiais em que a doença decorre, muitas das respostas necessárias
só são possíveis de ser dadas e ter alguma efetividade no contexto
internacional global, da saúde, à economia e, obviamente, ao turismo, como é
sublinhado por Hall, Scott e Gössling (2020).
ii)
Insegurança;
A insegurança que se vive começa por ser
sanitária, sentida por cada um e pelo coletivo, e conduz a insegurança geral,
económica social e turística. Em razão disso, adia-se a retoma da vida
económica e social e adiam-se decisões, como a aquisição de certos bens (bens
duradouros), o planeamento de viagens e o agendamento de férias. Quando não se
adiam, avança-se precariamente, ao sabor dos sentimentos e acontecimentos do
dia-a-dia, isto é, por exemplo, fazem-se reservas de alojamento para o verão,
mas também se cancelam, a seguir, ao menor sinal de incerteza.
Conforme noticiado nos jornais neste final
do mês, depois de no dia 14 de abril António Costa ter dito que espera que, no
verão, os portugueses tenham possibilidade de gozar férias, as reservas de
casas e hotéis no Algarve têm aumentado. O jornal Observador, por exemplo, avançava que os hotéis algarvios estavam a
receber cada vez mais reservas, para julho e agosto, de portugueses e turistas
estrangeiros, nomeadamente britânicos (cf. ZAP aeiou, de 27 de abril).
Entretanto, o diretor da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do
Algarve adiantava que “É verdade que também tivemos e ainda temos muitos
cancelamentos” (ZAP aeiou, de 27 de abril).
Nesse contexto, o mesmo ator associativo
acrescentava nas declarações que fez à comunicação social que “O facto de o
Algarve ser considerado um destino turístico Covid-Free pode potenciar o aumento da procura externa” (ZAP aeiou,
de 27 de abril).
iii)
Assimetria
O que se refere antes sobre reservas e
cancelamentos de férias no Algarve, percebe-se que se passa com outros
territórios. Ponte de Lima, por exemplo, é uma das manifestações da assimetria
como o fenómeno sanitário, nas suas implicações económicas, se exprime.
O Algarve, ao ser considerado um destino
turístico Covid-Free, pode potenciar
a procura externa, na medida em que os seus principais concorrentes se debatem
com problemas sérios, a começar pelo sul de Espanha, que é um dos seus maiores
concorrentes, segundo o diretor da AHETA (ZAP aeiou, de 27 de abril).
Outra manifestação de assimetria neste
fenómeno é a do potencial reforço da procura turística interna, em detrimento
da externa, não apenas por razões de confiança mas, igualmente, por
determinações administrativas que possam existir (barreiras à circulação de
pessoas no contexto internacional) e condicionamentos de transporte (operação
das companhias áreas, entre outras, que tem sido um dos setores económicos mais
atingidos pela crise económico/sanitária).
Conforme enunciado por Gössling, Scott e
Hall (2020), a evidência inicial dos impactes nas viagens aéreas, cruzeiros e
alojamento foram devastadores. Embora altamente incertas, as projeções iniciais
da Organização Mundial do Turismo para 2020 sugerem que as chegadas
internacionais podem diminuir de 20 a 30% face a 2019.
iv)
Reconfiguração
Conforme já assinalado, as mudanças no
turismo serão desiguais no espaço e no tempo. Nalguns destinos, este quadro
económico/sanitário ditará que reconsiderem a natureza da sua indústria do
turismo e se concentrem mais em formas locais e mais sustentáveis de turismo
(Hall, Scott e Gössling, 2020). Porventura, num primeiro momento, mais atentos
ao turismo interno mas com espaço para a continuação da aposta no turismo
internacional.
Em todo o caso, este parece ser o momento
para questionar a sustentabilidade do percurso mantido, isto é, para equacionar
pôr no terreno apostas turísticas menos massificados e que vão ao encontro de
públicos mais exigentes em matéria de experiência turística. Trata-se de
apostar em transformações menos centradas no crescimento do número de
visitantes e, porventura, mais sustentáveis, nas diversas leituras do conceito,
e mais ricas e diversas em matéria de fruição turística e de contributo para o
desenvolvimento local. O desenvolvimento de nichos como o ecoturismo, o
enoturismo, e o turismo criativo, entre outras, são apostas que fazem
particular sentido serem feitas em Portugal.
v)
Retorno
ao caminho.
Contrariamente ao que acontecia noutros
destinos turísticos nacionais, por exemplo, Lisboa, Porto, Algarve e Madeira, o
Minho pré-COVID-19 não se tinha ainda tornado num destino massificado. Aparte
isso, muita da sua oferta potencial encaixa bem na estratégia que se reclama
ser necessário implementar em Portugal no futuro mais próximo e mais longínquo.
As expressões culturais diversas,
materiais e imateriais, a natureza, as manifestações particulares do rural, a
gastronomia e vinhos, as rotas de peregrinação e de fruição da natureza, etc.,
são um pano de fundo suficientemente rico e diverso para sustentar um desenvolvimento
turístico rico em experiência proporcionada aos visitantes e promotor de
desenvolvimento local/regional. A reconfiguração da oferta não parece ser muito
difícil de fazer, e as oportunidades económicas avultam.
Não se pense, no entanto, que mesmo no
Minho não há custos. Na verdade, do que conheço no terreno, particularmente da
vivência de Ponte de Lima, que tinha uma aposta bastante consistente em matéria
de atuação no turismo (e era/é, um dos lugares atravessados pelo Caminho
[Central)] de Santiago e de outras “peregrinações”, nomeadamente de natureza
gastronómica e ambiental), Ponte de Lima, digo, é o exemplo de um local onde
foram feitos investimentos que não vão ser rendibilizados e onde há empregos
que não serão recuperados no curto e médio prazos.
Note-se a propósito que já antes da crise
sanitária e pese o afluxo crescente de visitantes, era para mim óbvio que a
oferta de unidades de alojamento local estava a crescer muito acima das
necessidades. Criou-se a ilusão de que havia espaço para todos e a
rendibilidade gerada era elevada, o que estava longe da realidade. Muitas
dessas unidades não vão voltar a abrir, e outro tanto se passa com uma série de
pequenos negócios que giravam em torno do turismo.
Esta é uma realidade que estou convencido
que extravasa muito o caso de Ponte de Lima, mesmo no contexto do Minho. No
caso de outros territórios que viveram mais intensamente o fenómeno da explosão
do turismo em Portugal, a situação será muito mais grave.
Seja como for, acredito que há futuro para
o turismo em Portugal, e também no Minho, em particular.
J. Cadima Ribeiro
(Professor do Departamento de Economia da
EEG/UMinho; investigador do NIPE e do Lab2.PT)
Referências
Gössling, S., Scott, D. e Hall, M. (2020). “Pandemics, tourism and
global change: a rapid assessment of COVID-19”. Journal of Sustainable Tourism,
Hall, M., Scott, D. e Gössling, S. (2020). “Pandemics, transformations
and tourism: be careful what you wish for”. Tourism
Geographies,
DOI: 10.1080/14616688.2020.1759131.
ZAP
aeiou (2020). “Covid-19 não trava férias de verão. Reservas de casas e hotéis
no Algarve aumentam”. ZAP aeiou, edição
de 27 de abril de 2020, http://www.aeiou.pt/.
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