O vinho constitui por si só uma importante parte do conceito de “cultura mediterrânea”. Apesar de não ser possível identificar o período ou local no qual este produto terá sido criado, é inegável que na história da Europa a vitivinicultura é uma caraterística não só agrícola e económica mas também cultural.
No panorama ibérico, povos como os romanos, os celtas e os gregos foram alguns dos que tiraram partido das potencialidades da videira. Ao longo dos séculos dá-se o desenvolvimento gradual de novas técnicas de cultivo e de produção resultando, deste modo, na mutação das próprias espécies e na entrada do vinho no mercado económico, que passa também a constituir um novo método de transações internacionais.
A oferta de vinhos em Portugal é, atualmente, muito diversificada e apreciada por muitos. A atividade vitivinícola estabelece-se por todo o país sendo que esta se encontra muitas vezes associada a determinadas regiões de modo a manifestar um papel significativo como promotor turístico.
No que diz respeito à região do Alentejo, que constitui cerca de um terço do território nacional, observam-se condições singulares para a vitivinicultura comparativamente com o resto do país. Antes de mais, as condições climáticas proporcionam longos e quentes verões mas também fatores geográficos, como as suas planícies. Estes fatores conciliados com outros tantos no âmbito enoturístico podem potencializar um maior e sucessivo desenvolvimento regional nesta zona, em que os recursos não são valorizados ou convenientemente explorados. A questão por mim levantada pretende gerar a reflexão em torno do motivo que impede o Alentejo de manifestar-se enquanto um destino de excelência no turismo associado ao vinho, e, dessa forma, dinamizar a região que tanto carece de postos de trabalho e que é vitima de crescente despovoamento.
Previamente a essa discussão, parece conveniente expor a definição de enoturismo e das demais áreas abrangentes de modo a promover uma análise diligente e adequada aquando da abordagem da conjuntura alentejana nos termos objetivados: a conciliação do turismo e das competências vitivinícolas com a finalidade de promover um crescente desenvolvimento regional.
O conceito de enoturismo, atualmente, pode ser considerado bastante ambíguo devido à diversidade de componentes associadas ao mesmo. Não obstante, existe consenso no facto deste necessitar de conjugar diferentes requisitos, que englobem atividades turísticas associadas à região vinícola em causa e, simultaneamente, que promovam o vinho como parte da identidade local.
A Carta Europeia do Enoturismo (2006) defende que neste conceito se enquadram todas “as atividades e recursos turísticos, de lazer e de tempos livres, relacionados com as culturas, materiais e imateriais, do vinho e da gastronomia autótone dos seus territórios.”
Apesar dos estudos científicos existentes relativos ao enoturismo serem relativamente recentes, surgem nas últimas décadas cada vez mais respostas a questões imperativas neste assunto, sendo que uma das primárias será a definição do perfil do enoturista.
Antes de mais, para uma melhor perceção das potencialidades do enoturismo, é necessário compreender os incentivos que contribuem para a sua procura. Os principais baseiam-se em princípios intelectuais e na competência associada a atividades no âmbito do turismo de vinhos, nomeadamente visitas a adegas e provas de degustação. Além do mais, a aprendizagem e a vertente social são outras questões bastante relevantes para quem se revê nesta tendência turística.1
Perante as especificidades e estímulos do turismo afiliado ao vinho, é essencial compreender que o perfil de enoturista nunca poderá ser unitário: este possui subdivisões que, consoante o autor, serão contabilizadas e identificadas de modo díspar. A classificação mais popularizada será a de Hall (1996), que é segmenta nos três seguintes grupos: wine lovers, wine interested e curious tourists. As primeiras duas classes referidas partilham o facto de terem o vinho como motivação principal para a sua deslocação, embora os “interessados” revelem uma maior abrangência no que toca aos estímulos da sua viagem, nomeadamente a conjugação com o fator gastronómico. Quanto aos “turistas curiosos” denota-se que as atividades associadas ao vinho são somente uma experiência complementar.2 Sem embargo, é possível indicar inúmeros perfis relativos ao enoturista, sendo que estes muitas vezes possuem subdivisões com faixas etárias que iniciam a partir dos 25 anos de idade.
No caso de Portugal, Costa (2009) define que os turistas de vinhos portugueses são predominantemente do sexo masculino, entre os 35 e 40 anos de idade, com preferência pelo vinho tinto e com o consumo associado às refeições. Já no sexo feminino, o vinho branco é o destacado e apreciado mais em contextos festivos.
Após estas considerações em torno da caraterização do enoturismo, do enoturista e da relação com as demais atividades, recursos ou preferências, a questão anteriormente aqui por mim proposta é salientada: por que motivo é que o Alentejo não adquiriu ainda um estatuto enquanto destino de referência no turismo associado ao vinho? E porque não procurar promovê-lo como tal de modo a dinamizar a região tanto a nível económico, turístico e sociodemográfico?
Antes de mais, convenhamos que o vinho enquanto produto é inerente às demais culturas e, como já foi referido aqui previamente, é alvo de procura pelas mais diferentes faixas etárias sendo, desta forma, de uma procura intemporal, em que a única problemática que se pode intrometer diz respeito a viabilidade vinícola (questões agrícolas e de sustentabilidade) e não necessariamente à vertente vitícola. Trata-se portanto de um mercado rendível e assente nos recursos providenciados pela região alentejana: a agricultura ou, melhor, a vinha. Mais importante ainda é a sua expansão, visto que o Ministério da Agricultura autorizou para o corrente ano de 2017 mais 800 hectares, visando o crescimento da produção vitivinícola alentejana 3.
Além do mais, a nível de património arquitetónico e paisagístico, o Alentejo encontra-se provido de inúmeras edificações e zonas naturais de grande apreciação e que justificam, no meu ver, a aposta turística não só pela vertente enófila mas também no que respeita o turismo cultural.
Catarina Dórdio Pedras
1 Lameiras, Edgar Teles Marques Salgado. O Perfil do Enoturista – Caso Português. 2015. 292f. Tese (Doutoramento em Turismo) - Universidade do Algarve, 2015.
2 Lameiras, Edgar Teles Marques Salgado. O Perfil do Enoturista – Caso Português. 2015. 292f. Tese (Doutoramento em Turismo) - Universidade do Algarve, 2015.
3 GARCIAS, Pedro. Mais 1932 hectares de vinha para Portugal. 11 março 2017, Público. Disponível em «http://fugas.publico.pt/Vinhos/370887_mais-1932-hectares-de-vinha-para-portugal»
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional” do curso de Mestrado em Mestrado em Património Cultural, da ICS/UMinho]