terça-feira, março 07, 2017

“Viajar é a coisa que você compra que te deixa mais rico”

Na atualidade, o turismo não é somente uma atividade de lazer ligada ao ócio e à recreação. É uma atividade económica importante, que gera muitos empregos e tem o poder de transformar lugares inteiros para que se possa desenvolver, alterando o quotidiano das comunidades onde se insere, e de certa forma, suas tradições, costumes e modos de agir. Assim, podemos dizer que o turismo se impõe como um fenómeno económico, social, cultural e comunicacional, que envolve tanto as relações concretas quanto as imaginárias.                                    
No presente texto irá ser abordado o turismo como fenómeno económico e social.
Como um segmento económico, o turismo é um dos ramos que mais vem crescendo nos últimos anos, principalmente em sociedades urbanas, pela sua grande capacidade de gerar empregos (diretos e indiretos) em diversos setores da economia, pela sua dinâmica e flexibilidade de expansão e pelos vultuosos lucros que propicia.
CRUZ (2000) destaca que o turismo surgiu como uma atividade económica organizada em meados do século XIX, utilizando-se integralmente a infraestrutura criada para os outros usos do território. “De lá para cá, a atividade deixou de ser uma usuária passiva dos territórios para tornar-se um agente condicionador de seu (re) ordenamento” CRUZ (2000: ?). Essa capacidade de (re) organizar sociedades inteiras para que o fazer turístico possa acontecer demonstra a força de ação, muitas vezes avassaladora, dessa atividade. Mas isso não deve ser confundido como um vetor de crescimento. O desenvolvimento turístico não é sinónimo de desenvolvimento económico, na medida em que “nenhuma atividade económica setorial pode assegurar um desenvolvimento global que contemple todas as dimensões da vida social” (CRUZ, 2000: 25).
Essa contradição é chamada por LEMOS (1998) de o “mito do desenvolvimento”. Na verdade, o que se verifica é uma confusão a respeito dos conceitos de crescimento económico e de desenvolvimento económico. KOTLER (1994) considera como desenvolvimento económico o aumento da produção vinculado a uma diversidade maior de produtos, ou seja, novas indústrias, maior utilização produtiva de recursos e mais inovações. Segundo LEMOS (1998), o que o turismo pode representar é uma alternativa concreta de crescimento económico, e não de desenvolvimento económico.
Segundo CRUZ (2000), o turismo é antes de tudo, uma prática social que envolve o deslocamento de pessoas pelo território, e que tem no espaço geográfico seu principal objeto de consumo. Essa prática social envolve um número significativo de atividades produtivas e disso decorre, em parte, a capacidade do turismo de ordenar e reordenar territórios para o seu uso. Para ALMEIDA (2003: 1) o turismo contemporâneo “tornou-se responsável pela maior circulação temporária de homens e mulheres nas diversas partes do planeta”. O aumento desses fluxos de deslocamento e de circulação de pessoas, mercadorias, ideias e informações decorre, principalmente, da difusão de novas tecnologias de transporte e comunicação, que promovem uma maior articulação entre o mundo e o lugar.
Dessa maneira, as especificidades dos lugares são transformadas em mercadorias turísticas, pela lógica mercantil, que por meio da publicidade transforma as particularidades locais em objetos de consumo. Assim, as áreas rurais, as matas, as praias, os rios, as cidades, o património, bem como a própria cultura, enfim, tudo tem um potencial turístico e pode se transformar num atrativo porque “o turismo é capaz de reorganizar sociedades inteiras para que ele possa acontecer” (CRUZ, 2000: ?) ao colocar sua lógica de organização dos espaços (a do lazer), sobre as lógicas pré-existentes.
            Segundo Marujo (n/d), além do evidente fenómeno económico que está indissociável do turismo, podemos destacar que o fenómeno turismo desperta interesse por vários motivos: causa um forte impacto nos indivíduos e grupos familiares que se deslocam, provoca mudanças no comportamento das pessoas e agrega conhecimento àqueles que o praticam. Este fenómeno permite ainda o cruzamento de diversas culturas, e é um meio de difusão de novas práticas sociais e aumenta as perspetivas de obtenção da paz e da compreensão e aceitação de diferentes culturas.
Concluindo: o turismo é um agente de mudança social, afeta todos os todos os fatores que estão vinculados a uma cultura, valores, crenças, normas e ideologias, tem portanto um papel socializador, o que permite não só crescimento económico como desenvolvimento social.

Soraia Oliveira

Bibliografia
- ALMEIDA, Maria. Lugares turísticos e a falácia do intercâmbio cultural. 2003. (mimeo).
- CRUZ, Rita. Turismo, território e o mito do desenvolvimento. Espaço e Geografia, vol. 3, no 1, 2000: 19-26.
- KOTLER, Philip. Marketing público: como atrair investimentos, empresas e turismo para cidades, regiões, estados e países. Trad. Eliane Kanner. São Paulo: Makron books, 1994.
- LEMOS, Leandro. Os sete mitos do turismo: a busca de alguns conceitos fundamentais. In: GASTAL, S. (org). Turismo: 9 propostas para um saber fazer. Edição dos autores, 1998: 65-78.
-MARUJO, Maria (n/d). A Sociologia e o Turismo. Centro de Investigação em Sociologia e Antropologia “Augusto da Silva”.

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia do Turismo”, de opção, lecionada a alunos de vários cursos de mestrado da EEG, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2016/17)

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