sexta-feira, abril 09, 2021

Barcelos, cidade criativa na categoria de artesanato e arte popular

A 31 de outubro de 2017, Barcelos torna-se na primeira cidade de Portugal e da Península Ibérica a integrar a Rede Mundial de Cidades Criativas da UNESCO na categoria de Artesanato e Arte Popular[1], estabelecendo-se desta forma como uma referência exclusiva no tocante às artes e ofícios portugueses.

De acordo com a publicação Barcelos é Cidade Criativa da UNESCO, a Rede de Cidades Criativas tem como intuito instituir “uma ligação e cooperação entre cidades que identificam a criatividade, a arte e a cultura enquanto fatores estratégicos para o desenvolvimento económico” da própria cidade. Assim sendo, quando aplicado na prática, a cidade responsabiliza-se por centralizar o foco da sua ação governativa nas indústrias culturais e criativas, desenvolvendo e dinamizando estas práticas.

A cidade de Barcelos, inserida no distrito de Braga, Norte de Portugal, distingue-se por consistir no concelho português que abarca o maior número de freguesias a nível nacional - um total de 61. Aqui, em Barcelos, há lendas, história, tradições, e há boa gastronomia e as mais belas paisagens retalhadas a verde. Mas acima de tudo, como referido anteriormente esta é uma região que visa distinguir-se particularmente pela sua atividade artesanal, destacada nas mais diversas áreas: olaria, figurado, cerâmica tradicional e bordados, de onde se salientam o crivo, a tecelagem, a madeira, o ferro e a latoaria. Não obstante, existem ainda outras artes relevantes, como é o caso do trabalho em couro, assim como do artesanato contemporâneo.

A inserção de Barcelos nesta Rede permite que seja possível o seu reconhecimento e projeção internacional no tocante à tradição artesanal e arte popular pelo seu exclusivo valor patrimonial, social e histórico. Esta é uma oportunidade sem precedentes que irá contribuir para a notoriedade e estima da criatividade não só da cidade mas, acima de tudo, da população de Barcelos. Ademais, a inserção na Rede vem também permitir a criação de postos de trabalho, particularmente no segmento do turismo criativo e de experiências, o qual representa correntemente um dos sectores mais afetados pela pandemia causada pela SARS-COV-2, por esse motivo necessitando de urgentes medidas de revitalização. A promoção da criação de organizações de apoios a esta área artística, bem como a valorização das oficinas criativas tradicionais e o apoio aos artesões, são fatores relevantes e de destaque neste contexto. Porém, é importante salientar que a decisão de candidatura de Barcelos à Rede de Cidades Criativas foi acima de tudo motivada pela existência de uma comunidade local singularmente criativa e de uma sabedoria que perdura ao longo de gerações.

Desta forma, os objetivos para esta candidatura eram os seguintes[2]:

×      Valorização das oficinas criativas tradicionais e apoio às novas gerações de artesãos;

×      Promoção da criação de estruturas de preparação e hubs criativos na cidade e de estruturas informais de apoio às atividades artísticas, gerando mecanismos de apoio à profissionalização da área artística e criativa;

×      Fomento de projetos compartilhados nos domínios artísticos e criativos e estimulo à cooperação com outros polos exteriores de I&D e produção artística;

×      Promoção do desenvolvimento da visibilidade externa das atividades artísticas e criativas do concelho;

×      Promoção do Turismo Criativo e de Experiências;

×      Incremento do aparecimento de novas empresas criativas;

×      Estimulo ao desenvolvimento de uma rede que fortaleça, inspire e crie novas ideias para um mundo mais próximo e cooperante;

×      Desempenho de um papel mais ativo no desenvolvimento de projetos com outras cidades da Rede;

×      Aposta na formação internacional através da ampliação territorial do projeto de mobilidade europeu, que tem trazido a Barcelos jovens de vários países da Europa, com o intuito de conhecer e aprender, no qual se privilegia formações e workshops criativos locais;

×      Criar laços com África, especialmente com países de expressão portuguesa (PALOP) no sentido de apoiar a compreensão do artesanato e da arte popular como um princípio de desenvolvimento e sustentabilidade;

×      Estruturação de um novo paradigma de desenvolvimento;

×      Aposta no networking internacional para confirmar a sustentabilidade da realidade criativa local.

Pelas ruas da cidade é possível encontrar várias referências a estes objetivos. Porém, maior referência é aquela que se manifesta na inocência e autenticidade: o grande orgulho da cidade pela sua cultura e pelo artesanato. Esta forma de expressão reflete-se essencialmente em temas como o quotidiano e na sensibilidade dos habitantes, o que se traduz num campo criativo que é transversal a diversos setores académicos, profissionais e associativos. A dedicação de Barcelos à sua cultura resulta em merecidos prémios de reconhecimento tanto nacional como internacional.

Comprova-se legítimo que Barcelos tenha tal destaque não só a nível nacional mas também a nível mundial, dados os diversos esforços que têm vindo a ser desenvolvidos para a promoção do seu artesanato e da sua arte popular. Como residente nesta cidade, e, por conseguinte, com uma visão interna e atualizada sobre o tópico em questão, posso confirmar com firmeza a importância dada ao artesanato, assim como a extensiva promoção da arte manual. Na verdade, será provavelmente a atividade onde se nota mais progresso, o que por outro lado resulta numa certa negligência para com o outro lado de Barcelos.

Barcelos apresenta uma diversidade cultural imensa e inusitada, sendo que cada freguesia tem a sua própria história, tradições e especificidades etnográficas presentes somente na região – o que, correntemente, não se encontra suficientemente considerado. Todo o restante desta vasta cultura permanece por isso à margem da Rede Mundial, a qual exclui outras manifestações populares, cultos e tradições que vão para além do artesanato e arte popular. Tangível ou intangível, a rica e diversa cultura de Barcelos não é suficientemente valorizada, tão-pouco aproveitada dado o potencial das circunstâncias em que vivemos, as quais promovem o turismo dentro de Portugal e prometem um crescente número de turistas internacionais num futuro relativamente próximo.

Considero, por isso, fundamental corrigir esta metonímia, fomentando o equilíbrio entre as diferentes práticas ancestrais de Barcelos, assim como uma homogénea valorização em termos geográficos.

 

Vanessa Sofia Fernandes Miranda

Referências Bibliográficas

Barcelos Cidade Criativa (2017). Capital das Artes Tradicionais. Obtido de https://cidadecriativa.barcelos.pt/#!capital-das-artes-tradicionais/

Cidade Criativa Barcelos (2017). Objetivos. Obtido em https://cidadecriativa.barcelos.pt/#!objetivos/

Município de Barcelos (31 outubro 2017). Barcelos é Cidade Criativa da UNESCO. Obtido em https://www.cm-barcelos.pt/2017/10/barcelos-e-cidade-criativa-da-unesco/



[1] Município de Barcelos (31 outubro 2017). Barcelos é Cidade Criativa da UNESCO. Obtido em https://www.cm-barcelos.pt/2017/10/barcelos-e-cidade-criativa-da-unesco/

[2] Cidade Criativa Barcelos (2017). Objetivos. Obtido em https://cidadecriativa.barcelos.pt/#!objetivos/ 

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do ICS/UMinho)

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