domingo, março 12, 2017

Não destruam a essência e alma de um lugar!

Barcelona. Passei por lá na semana passada. Regressava de um intercâmbio na Polónia quando dei por mim a fazer escala no país vizinho. Assim que desembarco, a primeira coisa que me vem à cabeça são os inúmeros artigos que li, quer nos jornais nacionais, quer nos jornais internacionais, que anunciavam que Barcelona iria limitar o número de turistas. Isto porque, segundo os vários meios noticiosos, os moradores dessa cidade já estavam fartos de tantos turistas, que por sua vez provocam o aumento dos custos das casas dos habitantes locais, cujos salários, que já são baixos, não conseguem suportar esse aumento. Dei por mim a pensar como é que essa limitação turística iria funcionar na realidade, e se já estaria em curso. 
Posto isto, lembrei-me de Portugal. Apesar de não recebermos tantos turistas em Portugal como provavelmente Espanha recebe, dei por mim a questionar-me se algum dia também nós nos fartaremos dos turistas. Tenho noção de que para isso acontecer as nossas taxas de ocupação turística teriam que crescer muito mais. Mas, a verdade é que Portugal está na moda. Esta é uma afirmação e de uma certa forma slogan que creio que tem vindo a atrair e vai atrair ainda muitos mais turistas.
Com os vários meios de comunicação a promoverem Portugal como o destino do ano, com o Porto a ganhar o prémio de melhor destino europeu, cujo jornal The Irish Times intitula de Califórnia portuguesa, e com o crescimento dos investimentos nos vários setores ligados ao turismo, creio que o bichinho da curiosidade já atingiu muitos estrangeiros.
Com tudo isto vem um sentimento agridoce da minha parte. Por um lado, fico extremamente feliz por saber que o meu país está nas bocas do mundo. Isso irá desmitificar certos mitos (tais como o de Espanhol ser a língua oficial de Portugal), irá trazer várias vantagens à nossa economia e comerciantes locais e, visto eu mesma ser uma espécie de embaixadora de Portugal de cada vez que viajo ou resido num país estrangeiro, fico feliz por ver que provavelmente muitos dos turistas que por aqui passam vieram pois também eles estiveram em contacto com alguns dos milhões de embaixadores portugueses que emigram todos os anos.
No entanto, e por outro lado, crescem os receios. Vêm-me mais uma vez à memória as reportagens e os artigos que denunciam as crescentes pressões para os habitantes da Ribeira abandonarem as suas casas. Recordo-me ainda dos famosos bares discoteca Tokyo, Jamaica e Europa na zona de Lisboa que fecharam devido à reabilitação que vai ocorrer no edifício em que se encontram (que irá ser transformado num hotel), e que provavelmente não irão reabrir devido ao preço absurdo da renda que lhes é pedido.
Todos os artigos elaborados no âmbito dos assuntos referidos anteriormente realçam o facto de o turismo ser benéfico para a nossa economia e para se proceder à reabilitação de áreas e edifícios públicos e históricos de maneira a melhorar as cidades em si, mas saberemos nós quando temos que parar?
Devem os investidores continuar a despejar as pessoas locais de uma cidade, que no fundo acabam por ser a alma e a essência desse lugar, cuja amabilidade e sorrisos serão recordados por muitos turistas de maneira a construir cada vez mais hotéis, hostels, ou qualquer outro tipo de equipamento turisto? O que é que acontece quando a população local começar a ficar revoltada pois o turista que acabou de passar à nossa frente é a razão pela qual muitas pessoas tiveram que encontrar um novo sítio ao qual chamar casa? Devemos nós continuar a construir desenfreadamente e continuar a viver esta euforia do turismo ou está na altura de parar, sentar e pensar um bocado mais no povo português?
Posto isto, penso que muitos portugueses concordam comigo quando digo: criem, invistam, continuem a apostar e a “vender” Portugal não só aos estrangeiros mas também aos portugueses, mas encontrem um equilíbrio. Não percam a consideração pelas culturas locais que, num mundo tão uniforme, padronizado e com gostos globais, começam a ficar extintas. Não destruam a essência e alma de um lugar que não é nada mais nada menos do que as pessoas que lá habitam.


 Mª Irene Ribeiro

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia do Turismo”, de opção, leccionada a alunos de vários cursos de mestrado da EEG, a funcionar no 2º semestre do ano lectivo 2016/2017)

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