segunda-feira, março 20, 2017

Traje à Vianesa: a reivindicação de uma identidade

O processo de produção de determinado produto numa região encontra-se muito ligado a uma determinada caraterística geográfica. Desta forma, é necessário que o produto possua um registo histórico significativo e que disponha de um valor cultural acrescentado para que possa facilmente ser associado a algo específico. É neste panorama que decidi inserir o caso do traje à vianesa, um produto composto por múltiplas peças e que se encontra intrinsecamente relacionado com o quotidiano de antigamente das populações, com as danças folclóricas do Alto Minho e com o evento que é considerado a maior romaria de Portugal, a festa da Senhora da Agonia, realizada todos os anos em Agosto, em Viana do Castelo.
Tal como acontece com tantos outros produtos já possuidores de certificado, o traje à vianesa precisava de dar este este passo para salvaguardar a identidade do produto e os interesses dos seus produtores. Sem dúvida que o Traje Vianense tornou-se num símbolo de Portugal, dentro e fora de fronteiras, representando uma espécie de ‘ex- líbris’ do conhecimento artesanal português devido à sua imagem tão caraterística e, ao mesmo tempo, diferenciadora, que tantas vezes foi retratada em publicidade e produtos.
Considero que o facto de o produto ser tão reconhecido a nível nacional e até mesmo ser usado como um “traje nacional” terá facilitado, ao longo das décadas, a transposição dos limites fronteiriços da região que lhe dá o nome, quer a nível de produção, quer a nível de uso.
Somente em 2015 é que a Câmara Municipal de Viana do Castelo procedeu à candidatura do seu traje a um lugar no Registo Nacional de Produções Artesanais Tradicionais Certificadas. Com o processo de certificação concluído em 28 de Dezembro de 2016, ficam não só delimitados os núcleos geográficos de produção bem como os parâmetros, que englobam medidas, cores, texturas, técnicas e moldes.
No caso dos produtores, este certificado deve representar uma forma de combate à apropriação do produto por parte de outras regiões, incentivo a nível económico e de motivação pessoal para que cresça o número de artesãos, de forma a assegurar a produção artesanal do produto no futuro.
A análise do despacho da Assembleia da República emitido sobre este processo de certificação permite concluir que os pontos que constituem o certificado podem servir também como uma espécie de regulamento do bem trajar, o que certamente agradará aos folcloristas mais conservadores. Ao assumir-se como um regulamento do bem trajar, poderia ser usado para impor regras de rigor etnográfico aos elementos femininos que participam no desfile que ocorre na festa da senhora da Agonia e, por outro lado, aos grupos folclóricos existentes fora da região, e até mesmo fora de Portugal, que envergam este traje nas suas performances, de forma a valorizar e a dignificar a essência do traje à vianesa.

Bebiana Raquel Freitas Pereira

Despacho (extrato) n.º 15606/2016. Diário da República n.º 248/2016, Série II de 2016-12-28. Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e Economia - Instituto do Emprego e da Formação Profissional, I. P. Lisboa.  Disponível em: https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/105606672/details/normal?q=traje%20a%20vianesa%20
BALEIRAS, Rui Nuno (Coord.) [2011], Casos de Desenvolvimento Regional, Princípia Editora, Cascais.

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional” do curso de Mestrado em Mestrado em Património Cultural, da ICS/UMinho]

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