Quando se fala do Algarve, facilmente se pensa em palavras
como “férias”, “sol” e “praia”. Outro conceito invariavelmente associado a esta
região do nosso país é o de “ingleses”. A relação entre os britânicos e o
Algarve é inegável, com inúmeros viajantes provenientes do Reino Unido todos os
anos a seleccionarem a área como o seu destino de férias. De facto, nos últimos
anos, face aos conflitos no Norte de África, esse fenómeno tem-se vindo a
intensificar. Contudo, à luz dos recentes acontecimentos em terras de sua
majestade, tal poderá inverter-se, com o futuro do turismo britânico na região a
avizinhar-se incerto.
O boletim n.º 15 “Algarve – Conjuntura Turística” indica que
no período de Janeiro a Setembro de 2016 a hotelaria do Algarve registou um
valor global de 3.373.019 hóspedes, com o Reino Unido como origem de 28,5% do
total de hóspedes. Esta percentagem faz do Reino Unido a principal proveniência
estrangeira, com larga vantagem sobre os mais próximos colocados, Alemanha e
Espanha, que representaram 8 e 7,3% dos hóspedes, respetivamente. Mais
interessante é que este valor consegue ser inclusivamente superior ao de
hóspedes de origem nacional, ainda que por uma curta margem, que constituíram
28,4% do total. Segundo a mesma publicação, também no aeroporto de Faro se faz
sentir o domínio britânico: mais de metade dos passageiros que desembarcaram no
aeroporto nesse mesmo período eram provenientes do Reino Unido.
Por sua vez, a Publituris afirma num artigo próprio que os
turistas britânicos geram 1.500 milhões de euros em receitas na região.
Torna-se assim evidente a importância do Reino Unido para o setor turístico no
Algarve, com um impacto que acaba por se estender a toda a economia da região, já
que muitos britânicos, pelo prazer que vão ganhando em sucessivas férias no
Algarve ao longos dos anos, acabam por adquirir casa aí, constituir ou expandir
os seus negócios para a região e até mesmo mudar-se permanente, contribuindo
para uma crescente comunidade britânica residente na região.
Ora, com a saída do Reino Unido da União Europeia,
vulgarmente apelidada de Brexit, a marcar a atualidade, é natural colocarem-se
questões a respeito dos potenciais efeitos que a mesma pode ter sobre o setor
turístico do Algarve. O pedido de saída foi formalizado junto de Bruxelas no
dia 29 do mês passado, na sequência do resultado do referendo popular realizado
em Junho de 2016, o que significa que em menos de dois anos o processo terá de
estar terminado. Embora ainda seja incerto se, após o término do processo de
abandono, a União Europeia manterá uma posição de cooperação com o Reino Unido,
estabelecendo acordos que permitam manter algumas das condições atuais, ou se
adotará uma postura de indiferença ou de hostilidade, as relações entre o bloco
económico e o país em questão nunca poderão ser tão profundas como o são no
presente. Desde logo, tal afetará por
certo a circulação de pessoas, que aliás é um dos motivos que levou ao “sim” dos
britânicos no referendo.
Para os economistas, é quase um facto que a libra esterlina
sofrerá uma desvalorização face ao euro, o que aliás já se tem vindo a notar
desde o dia seguinte ao resultado do referendo. Se, por um lado, é vantajoso
para os europeus que queiram visitar o Reino Unido, por outro lado, para os
turistas britânicos ficará mais caro passar férias no Continente Europeu. Adicionalmente,
é esperado que os salários diminuam e se assista a um aumento geral do nível de
preços, degradando a situação financeira das famílias britânicas. Um relatório
feito pelo Tesouro prevê, inclusive, que o PIB em 2030 seja 6,2% inferior ao
que seria se o Reino Unido continuasse na União Europeia, o que corresponderia
a uma perda anual de 4.300 libras por ano a cada família britânica.
Em situações de constrangimento, é comum as férias serem uma
das principais componentes afetadas no orçamento familiar da classe média.
Assim, é expectável que os britânicos passem a optar por destinos mais baratos,
como as zonas em conflito no Norte de África, ou a viajar dentro do próprio
Reino Unido, em alternativa ao Algarve.
Considerando toda esta situação, a atividade turística algarvia
sairá por certo substancialmente afetada pelo Brexit, não imediatamente este
ano, mas num horizonte próximo, se o setor continuar a operar nos moldes atuais.
Sendo o turismo um dos pilares da economia da região, torna-se por isso imperioso
estabelecer e implementar desde já estratégias que apostem em mercados-alvo
alternativos, como os alemães e os franceses, por forma a colmatar a menor
afluência britânica. Tal leva tempo e provavelmente não será possível evitar de
todo consequências do Brexit, mas apenas minorá-las. Certo é que o domínio
britânico do Algarve terá os dias contados…
João Silva Santos
Pelaez Carones
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia do Turismo”, de opção, lecionada a alunos de vários cursos de mestrado da EEG, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2016/2017)
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia do Turismo”, de opção, lecionada a alunos de vários cursos de mestrado da EEG, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2016/2017)
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