Este festival é de facto peculiar, pois a sua essência não é representar
apenas aspetos de uma cultura local, como a maior parte das festas populares
(não que isso seja algo negativo), mas sim mostrar duas culturas que sempre
andaram de mão dada, a portuguesa e a brasileira. Daí provem o seu nome, “Do Bira”, mencionando a cultura
portuguesa, e “ao Samba”, consequentemente
mencionando a brasileira, e daí o título deste artigo ser “Bragasil”,
aglomerando as palavras “Braga” e “Brasil”, em jeito de brincadeira. Pois temos
que considerar que esta cidade, como epicentro de atividades económicas,
sociais e culturais do Minho, e esta região também o epicentro da emigração
para o Brasil ao longo dos tempos, é a cidade ideal para um festival com este
tema.
A sua organização é
feita pelo grupo de percussão da Universidade do Minho, os Bomboémia, também conhecidos como os “laranjinhas”, pelo seu vestuário
laranja, membros da Associação Recreativa e Cultural Universitária do Minho.
Gostaria de destacar que, como membro deste grupo e da organização deste
festival, tentarei obviamente ser o mais imparcial possível visto este artigo
ser uma abordagem pessoal ao tema e correr riscos de ter demasiada parcialidade
no seu tratamento.
Este festival
decorre desde 2015 na cidade de Braga e é na sua essência um festival de artes
performativas, contando com 3 edições, atualmente decorrendo no final do mês de
Julho, sendo que em 2017 decorreu nos dias 28 e 29.
Poder-se-ia dizer
que é uma espécie de carnaval fora de época, pois conta com um desfile pelo
centro da cidade em que sambistas, com os seus arrojados e reveladores trajes,
acompanhados com os emblemáticos ritmos de batucada e samba, se misturam com as
vestimentas femininas ricamente ornamentadas típicas do Minho e batidas
tradicionais, como a Chula[1],
numa visão que tanto espanta e intriga os espetadores pelo seu conceito de
misturar duas culturas que à partida se mostram visualmente tão diferentes.
A existência do DBAS na cidade de Braga
provém de várias razões, mas a sua ideia inicial veio do grupo Bomboémia, pois o conceito era mostrar à
cidade de Braga o trabalho elaborado por este grupo durante os seus anos de
existência. Sendo que este grupo de percussão foi originado de um anterior
grupo de Zés Pereira[2],
e as suas músicas inicialmente apenas continham ritmos tradicionais
portugueses, mas recentemente foram adotados os ritmos de batucada, típicos do
samba brasileiro. Esta nova componente fazia sentido pois grupos de Zés Pereira no século XIX tiveram uma
forte influência no surgimento do carnaval carioca.
Durante os dois dias, sendo
o primeiro deles dedicado à cultura portuguesa e o segundo à cultura
brasileira, contando este último com o Monumental
Cortejo de Carnaval Fora d’Época
pelo centro de Braga juntando as duas culturas. A cidade enche-se de milhares
de visitantes que aproveitam para ver grupos artísticos típicos da região e do
outro lado do atlântico, que vão desde grupos de espectro português, como os Pauliteiros de Miranda do Orfeão
Universitário do Porto ou os Galandum Galundaina, até grupos de espectro brasileiro, como Samba
Sem Fronteiras e a
batucada Batalá Barcelona.
Em termos de
contributo e desenvolvimento para a cidade, a meu ver, há três grandes aspetos
positivos. O primeiro sendo obviamente a grande quantidade de visitantes que
este festival atrai hoje em dia, estimulando o comércio e as atividades
económicas locais. O segundo sendo a aproximação da Universidade do Minho ao
centro da cidade, que, pela sua ausência, muitas vezes é um aspeto criticado
por habitantes locais, que dizem que movimento e atividades muitas vezes são
desviados do centro para Gualtar e que o centro por vezes é negligenciado pela
Universidade. E por fim é a aproximação da comunidade brasileira com os
habitantes locais, podendo sentir-se parte de uma mesma família, que de facto
talvez até o sejam visto que estes imigrantes brasileiros muitas vezes são
descendentes de emigrantes do Minho que foram para o Brasil.
A
verdade é que a cultura não é algo que sempre existiu da mesma maneira. A
cultura é mutável. A história ensina-nos que em poucos séculos ela molda-se
consideravelmente, e se uma cultura se fecha não absorve novos aspetos, facetas
e novos desafios, e portanto é muito provável que venha a ser negligenciada. Por
isso, na minha opinião, um festival com esta natureza é um bom incremento para
a preservação e propagação do património cultural.
Sérgio Gonzaga Videira
[1] Dança popular e género musical
português de ritmo bastante marcado por tambor, triângulo e chocalhos;
[2] Grupo de
percussão típico das romarias do Norte de Portugal, que atuam nas ruas com
bombos, caixas de rufo e timbalões e por vezes concertinas e os típicos
cabeçudos e gigantones.
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, do curso de Mestrado em Património Cultural do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, do curso de Mestrado em Património Cultural do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)
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