domingo, abril 22, 2018

O Processo de desmetropolização e desconcentração industrial brasileiro e o crescimento das cidades médias

Após as primeiras Revoluções Industriais ocorreu, paralelamente, o processo de urbanização que contribuiu para densificar as cidades, principalmente as europeias que, entre outros atributos (inclusive simbólicos e culturais), ganharam também notoriedade econômica, produtiva e administrativa. Isso aconteceu, marcadamente, com as que concentraram o fenômeno da industrialização que irradiou para as áreas contíguas, transformando invariavelmente o Espaço geográfico. Os países que sediaram o desenvolvimento da indústria foram, consequentemente, os que primeiro testemunharam o surgimento das metrópoles.
No segundo quartel do século XX, verificou-se um relativo e contínuo esvaziamento ou desconcentração industrial e, consequentemente, populacional das grandes cidades mundiais, tais como Londres e Paris, entre outras. Visto que o solo urbano passou a ter um valor econômico e simbólico de uso e de troca, essa tendência nomeou-se “desmetropolização”, já que as cidades pequenas e médias do entorno imediato passaram a sediar algumas dessas atividades industriais, e o preço mais acessível da terra atraía uma significativa parcela da população menos solvável.
No Brasil, esse processo passou a ser mais perceptível a partir da década de 1980, visto que vários fatores econômicos, políticos e culturais atuaram juntos, sendo claramente tutoriados pelo Estado, por meio de políticas públicas de incentivos fiscais, doações de terras, entre outras estratégias para que as grandes corporações e conglomerados industriais ocupassem os terrenos das cidades menores, ainda que estas mantivessem uma forte relação de dependência com as suas metrópoles.
A região Sudeste do Brasil foi o lócus geográfico e histórico privilegiado para a implantação efetiva dos parques industriais, que datam do início do século XX, sobretudo após a crise global de 1929. Sem alternativa, coube ao Estado utilizar as infraestruturas já existentes, que atendiam a economia cafeeira, sobretudo incrementar e ampliar as suas redes de comunicações, tornando-as mais eficazes para atender às necessidades produtivas da indústria. Dessa forma, o embrião experimental do parque industrial brasileiro consubstanciou-se nos centros urbanos das duas maiores cidades do país: Rio de Janeiro e São Paulo.
A primeira sediava o poder governamental republicano e com isso tinha a capacidade de ser um pólo de atração migratório, constituindo um largo bolsão de mão-de-obra disponível e barata. Também por ser uma cidade portuária, havia uma constante necessidade de trabalhadores braçais sem qualificações técnicas a não ser a força muscular.
Já a segunda cresceu economicamente à custa da cultura do café e, portanto, detinha as melhores redes de infraestrutura do país. Consonante à queda da economia agrária no mercado interno e global, a cidade transformou-se no mais bem sucedido polo industrial do Brasil e, algumas décadas após a sedimentação dos parques produtivos nesse perímetro urbano, deu origem a uma clássica aglomeração industrial, consolidando um vetor contínuo de captação migratório.
Esse fator remodelou multifacetadamente não só o Espaço Geográfico mas também impôs ao Planeamento Urbano uma constante reorganização e avaliações periódicas das intervenções espaciais; estas, realizadas em favor da ampliação horizontal e vertical do processo de urbanização, que atendia fundamentalmente as indústrias. Nesse sentido, as cidades deveriam ser funcionais, porém o ônus foi o Inchaço Urbano, que, dentre outras consequências, ampliou as desigualdades sociais e incrementou a favelização e a degradação ambiental (SANTOS, 2003).
Após a década de 1980, o processo de conurbação integrou, mesmo que parcialmente, as áreas mais distantes, futuramente nomeadas de Regiões Metropolitanas ao CDB (Central Business District), pois a dialética do Espaço brasileiro não se furtou em seguir, com algumas restrições, a lógica global, sobretudo o modo de produção do Capitalismo Ocidental, cuja desmetropolização dotou as cidades médias de infraestruturas viárias, de parques industriais e, consequentemente, ampliou a densidade demográfica e o tecido urbano.
Esse processo, que desterritorializou as grandes indústrias das áreas centrais do Sudeste brasileiro, criou novas perspectivas espaciais junto ao Planeamento Urbano, cujo conceito geográfico de Regionalização passou a ser discutido em âmbito acadêmico e técnico quanto à sua eficácia, eficiência e abrangência (VILLAÇA, 1998). Após a dispersão das grandes corporações para as áreas metropolitanas, a mancha urbana conurbada ainda concentra atualmente no Sudeste brasileiro 41% do total da população, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Entretanto, Santos (2003) ilumina a Geografia com o conceito de MTCI (Meio Técnico Científico e Informacional), criado a partir do casamento da técnica com a ciência. Não obstante as transformações espaciais vividas pelo Brasil no período, as grandes cidades foram especializando-se em serviços que atendiam ao setor terciário da economia, em detrimento das novas áreas industriais mais distantes dos centros urbanos.
Com o advento da aplicação das novas tecnologias robóticas e da automação no setor produtivo, a inovação no sistema de transporte de massa e de carga, a difusão técnica de comunicação material e imaterial e a implantação de novas áreas portuárias especializadas, entre outros, reconfigou-se a ideia clássica da localização industrial. Tais mecanismos foram decisivos para que as outras macrorregiões do Brasil também fossem beneficiadas por esses transbordos.
Atualmente, a noção de arquipélago econômico, que acompanhou o país desde a colonização até aproximadamente a década de 1970, foi em certa medida descaracterizado pelas iniciativas públicas nas mais diferentes instâncias, promovendo inclusive a guerra fiscal entre as cidades e os estados federativos, cujo êxito foi a mobilidade industrial no território nacional em busca de vantagens comparativas, mas que ainda faz permanecer, mesmo que em menor escala, uma marca da desigualdade de acesso aos bens e consumos dependendo da localização geográfica.

Hércules Paes Lima

Bibliografia

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WWW.ibge.org.br

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “economia e Política Regional”, do curso de Mestrado em Geografia do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)

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