Após as primeiras Revoluções
Industriais ocorreu, paralelamente, o processo de urbanização que contribuiu
para densificar as cidades, principalmente as europeias que, entre outros
atributos (inclusive simbólicos e culturais), ganharam também notoriedade econômica,
produtiva e administrativa. Isso aconteceu, marcadamente, com as que
concentraram o fenômeno da industrialização que irradiou para as áreas
contíguas, transformando invariavelmente o Espaço geográfico. Os países que
sediaram o desenvolvimento da indústria foram, consequentemente, os que
primeiro testemunharam o surgimento das metrópoles.
No segundo quartel
do século XX, verificou-se um relativo e contínuo esvaziamento ou
desconcentração industrial e, consequentemente, populacional das grandes cidades
mundiais, tais como Londres e Paris, entre outras. Visto que o solo urbano
passou a ter um valor econômico e simbólico de uso e de troca, essa tendência
nomeou-se “desmetropolização”, já que as cidades pequenas e médias do entorno
imediato passaram a sediar algumas dessas atividades industriais, e o preço
mais acessível da terra atraía uma significativa parcela da população menos
solvável.
No Brasil, esse
processo passou a ser mais perceptível a partir da década de 1980, visto que
vários fatores econômicos, políticos e culturais atuaram juntos, sendo
claramente tutoriados pelo Estado, por meio de políticas públicas de incentivos
fiscais, doações de terras, entre outras estratégias para que as grandes
corporações e conglomerados industriais ocupassem os terrenos das cidades menores,
ainda que estas mantivessem uma forte relação de dependência com as suas
metrópoles.
A região Sudeste
do Brasil foi o lócus geográfico e histórico privilegiado para a implantação
efetiva dos parques industriais, que datam do início do século XX, sobretudo
após a crise global de 1929. Sem alternativa, coube ao Estado utilizar as
infraestruturas já existentes, que atendiam a economia cafeeira, sobretudo
incrementar e ampliar as suas redes de comunicações, tornando-as mais eficazes
para atender às necessidades produtivas da indústria. Dessa forma, o embrião
experimental do parque industrial brasileiro consubstanciou-se nos centros
urbanos das duas maiores cidades do país: Rio de Janeiro e São Paulo.
A primeira sediava
o poder governamental republicano e com isso tinha a capacidade de ser um pólo
de atração migratório, constituindo um largo bolsão de mão-de-obra disponível e
barata. Também por ser uma cidade portuária, havia uma constante necessidade de
trabalhadores braçais sem qualificações técnicas a não ser a força muscular.
Já a segunda cresceu
economicamente à custa da cultura do café e, portanto, detinha as melhores
redes de infraestrutura do país. Consonante à queda da economia agrária no
mercado interno e global, a cidade transformou-se no mais bem sucedido polo
industrial do Brasil e, algumas décadas após a sedimentação dos parques
produtivos nesse perímetro urbano, deu origem a uma clássica aglomeração
industrial, consolidando um vetor contínuo de captação migratório.
Esse fator
remodelou multifacetadamente não só o Espaço Geográfico mas também impôs ao Planeamento
Urbano uma constante reorganização e avaliações periódicas das intervenções
espaciais; estas, realizadas em favor da ampliação horizontal e vertical do
processo de urbanização, que atendia fundamentalmente as indústrias. Nesse
sentido, as cidades deveriam ser funcionais, porém o ônus foi o Inchaço Urbano,
que, dentre outras consequências, ampliou as desigualdades sociais e incrementou
a favelização e a degradação ambiental (SANTOS, 2003).
Após a década de
1980, o processo de conurbação integrou, mesmo que parcialmente, as áreas mais
distantes, futuramente nomeadas de Regiões Metropolitanas ao CDB (Central Business District), pois a
dialética do Espaço brasileiro não se furtou em seguir, com algumas restrições,
a lógica global, sobretudo o modo de produção do Capitalismo Ocidental, cuja
desmetropolização dotou as cidades médias de infraestruturas viárias, de
parques industriais e, consequentemente, ampliou a densidade demográfica e o
tecido urbano.
Esse processo, que
desterritorializou as grandes indústrias das áreas centrais do Sudeste
brasileiro, criou novas perspectivas espaciais junto ao Planeamento Urbano,
cujo conceito geográfico de Regionalização passou a ser discutido em âmbito
acadêmico e técnico quanto à sua eficácia, eficiência e abrangência (VILLAÇA,
1998). Após a dispersão das grandes corporações para as áreas metropolitanas, a
mancha urbana conurbada ainda concentra atualmente no Sudeste brasileiro 41% do
total da população, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística).
Entretanto, Santos
(2003) ilumina a Geografia com o conceito de MTCI (Meio Técnico Científico e
Informacional), criado a partir do casamento da técnica com a ciência. Não
obstante as transformações espaciais vividas pelo Brasil no período, as grandes
cidades foram especializando-se em serviços que atendiam ao setor terciário da
economia, em detrimento das novas áreas industriais mais distantes dos centros
urbanos.
Com o advento da
aplicação das novas tecnologias robóticas e da automação no setor produtivo, a inovação
no sistema de transporte de massa e de carga, a difusão técnica de comunicação
material e imaterial e a implantação de novas áreas portuárias especializadas,
entre outros, reconfigou-se a ideia clássica da localização industrial. Tais
mecanismos foram decisivos para que as outras macrorregiões do Brasil também
fossem beneficiadas por esses transbordos.
Atualmente, a
noção de arquipélago econômico, que acompanhou o país desde a colonização até
aproximadamente a década de 1970, foi em certa medida descaracterizado pelas
iniciativas públicas nas mais diferentes instâncias, promovendo inclusive a
guerra fiscal entre as cidades e os estados federativos, cujo êxito foi a
mobilidade industrial no território nacional em busca de vantagens
comparativas, mas que ainda faz permanecer, mesmo que em menor escala, uma
marca da desigualdade de acesso aos bens e consumos dependendo da localização
geográfica.
Hércules Paes Lima
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WWW.ibge.org.br
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “economia e Política Regional”, do curso de Mestrado em Geografia do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “economia e Política Regional”, do curso de Mestrado em Geografia do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)
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