A descentralização assimétrica carateriza-se pelo facto de haver diferenças nos poderes administrativos e políticos entre jurisdições, por exemplo, a municípios diferentes correspondem atribuições, recursos e competências distintas, tendo em consideração as suas especificidades demográficas, territoriais e económicas. Acontece que a assimetria existe sempre porque os territórios administrados localmente são necessariamente muito diferentes, mas nem sempre, pelo menos em Portugal, essa diversidade significa competências descentralizadas diferentes.
Este
capítulo termina com uma referência ao caso das áreas metropolitanas, pois em
Portugal, e também noutros países europeus, a fatia maior da produção
encontra-se dependente destas áreas. São territórios que apresentam, como
consequência da sua vitalidade, demografia e concentração, um conjunto de
desafios e problemas muito específicos, nalguns casos, mais agudizados.
De
seguida, no capítulo – “breve retrato do poder local em Portugal” -, o
autor faz uma abordagem diacrónica e dos principais momentos da existência do
poder local português, afirmando o município português como um dos ativos mais
importantes da nossa identidade territorial. Por exemplo, a existência em
Portugal de dois níveis autárquicos – a Câmara Municipal e a Junta de Freguesia
- é uma particularidade singular na Europa.
Um
outro aspeto fundamental para a vida dos municípios foi e é o acesso aos fundos
europeus de desenvolvimento regional, pois permitiu a mobilização dos
instrumentos, incentivos e da vontade política que geraram um ritmo admirável
de investimentos públicos nos municípios. Relacionado com esta capacidade de
captação de financiamentos, verificou-se a criação do setor empresarial público
local, isto é, o incremento de empresas municipais e intermunicipais.
Como
não poderia deixar de acontecer, dá-se destaque ao movimento criado pelo “Livro
Verde para a Reforma da Administração Local”, que previa uma série de objetivos
para alcançar de imediato, entre os quais o mais significativo seria a extinção
e fusão de municípios, mas que o Governo e as autarquias abordaram de forma
alternativa, reformando o mapa das freguesias e reforçando os mecanismos e
incentivos para a cooperação intermunicipal. Esta atitude ou escolha revela uma
cultura política nacional muito conservadora, que não convive bem com reformas
radicais do sistema administrativo e político.
Por
fim, neste capítulo, são apresentados os novos desafios do poder local:
demografia, habitação, serviços básicos, planeamento, ambiente, economia
regional, competitividade, coesão territorial e sustentabilidade. Assim como se
reconhece também aí que os municípios não têm sido capazes de dar resposta de
forma equilibrada em todo o país, devido às tremendas assimetrias existentes. A
abordagem ideal para estes novos desafios deverá ser uma abordagem integrada,
isto é, que enfatize os problemas de escala e de capacidade das autarquias.
Embora a autonomia dos municípios tenha sido reforçada, não houve atribuições
correspondentes no âmbito das receitas e das despesas, o que motiva o seguinte
comentário do autor:
O
nosso modelo de governação é aquilo que poderíamos apelidar de um incentivo à
liberdade incapaz: as autarquias locais podem decidir, mas com poucos meios
(página 87).
O
último capítulo – “Conclusão: o futuro – regionalização disfarçada ou
verdadeira?” -, inicia-se com uma questão muito pertinente: os
municípios irão perder importância nas próximas décadas ou irão reforçar o seu
papel?
O
autor responde à sua própria questão afirmando que, tendo em consideração que
os municípios continuam a trabalhar com base num sistema com mais de quatro
décadas, é perfeitamente compreensível que Portugal se empenhe, mais cedo ou
mais tarde, numa reforma profunda do seu governo local. Essa reforma deverá ser
um processo integrado e não uma soma de políticas, incentivos e estratégias
parcelares e isoladas.
Filipe
Teles aponta duas estratégias para o processo reformador:
a) a
regionalização, dando cumprimento ao previsto na constituição e que, com órgãos
regionais eleitos, estabeleceria um nível de governo intermédio, com vantagens
democráticas, de legitimidade, responsabilidade e com efeitos de escala;
b) o
reforço gradual da capacidade e autonomia dos municípios, em que as
responsabilidades com as despesas sejam acompanhadas da responsabilidade de
financiamento local, para garantir os incentivos adequados para as autarquias
locais;
Por
outro lado, este processo reformador de descentralização deverá implicar uma
abordagem integrada: território, escala de governação, competências de cada
jurisdição, autonomia, articulação multinível, lei eleitoral, fiscalidade,
funcionamento dos órgãos autárquicos, administração local e capacidade
institucional.
Mais,
segundo este ensaio, esta descentralização implicará derrotar um conjunto
idiossincrasias: incomparável centralização, autonomia limitada, deficiente
capacitação institucional e técnica, ingovernável diversidade, irracional
multi-territorialização e sobreposição de entidades políticas e
administrativas.
Este
deverá ser, enfim, um processo longo, maduro, participado, interinstitucional,
avaliado e testado, pois importa garantir a flexibilidade dos modelos de
governação, permitindo a diversidade.
O
ensaio termina com um pequeno texto denominado “os cinco dês da
descentralização”:
-
Dar poderes e competências os níveis de governação mais próximos dos
cidadãos;
-
Dotar de capacidades organizacionais, técnicas, políticas, humanas e
financeiras os níveis de governação de acordo com os poderes e competências
recebidas;
-
Diferenciar as funções e competências adequando-as às realidades
territoriais, económicas, sociais e demográficas;
-
Democratizar, responsabilizando e legitimando os órgãos de decisão;
-
Descomplexificar a relação entre os níveis de governação, clarificando
funções, competências e territórios de atuação.
A
título de curiosidade, ou como complemento de informação, importa dizer que na
mesma coleção “ensaios da fundação”, que atualmente conta já com 110 ensaios,
podemos ainda encontrar outros títulos que se relacionam com este, ou dizem
respeito ao mesmo ambiente ou contexto temático, a saber: nº 24 – Portugal:
dívida pública e défice democrático; nº 37 – os investimentos públicos
em Portugal; nº 38 - parcerias público-privadas; nº 50 – confiança
nas instituições políticas; nº 79 – qualidade da democracia em Portugal;
nº 92 – administração pública portuguesa; nº 106 – jobs for the boys?
Nomeações para a administração pública.
Luís Vale
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do ICS/UMinho)
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