segunda-feira, abril 19, 2021

Reações ao património

Nos últimos anos, temos assistido a uma crescente reação ao património, tanto por parte das massas como de entidades oficiais, como o governo.  A criação destas reações é algo importante e deve ser desde sempre um dos principais objetivos do património. Mais do que preservar o nosso passado, o património deve ser um elemento desencadeador de reflexão e fazer as pessoas pensar no que foi e o que é e as razões para tal.

Estas reações consistem, por vezes, na reivindicação de alguns países de que o património que lhes foi retirado por meio da força através de invasões ou guerras lhes seja devolvido. Podem também consistir no protesto contra e até mesmo a destruição de património que não consideram refletir a sua cultura e os seus ideais.

Ao longo dos séculos, foram muitos os objetos e o património que foi retirado do seu local de origem pela força, algum deles estando ainda hoje por devolver. Isto não ocorreu apenas devido à colonização por parte das colónias europeia. Desde que o mundo é mundo, povos invadem e conquistam outros e levam o que querem.

O processo de colonização e de escravatura fez com que muito património mudasse de mãos, causando uma perda de identidade das comunidades oprimidas. A colonização apagou muito da história dos países colonizados e estas nações viram-se agora para as marcas de colonização como parte do seu património identitário. É neste sentido que estão cada vez mais a reivindicar não apenas o património que lhe foi retirado, muitas vezes para os gabinetes de curiosidades europeus, mas também os símbolos do colonialismo.

O processo que pode ser visto atualmente é a reivindicação por parte de ex-  colónias e a valorização de património deixado pelos ex-colonizadores que tinha sido anteriormente retirado e desvalorizado pela população local, mas pode também ser aplicado a património que mudou de mãos sob outras circunstâncias, como invasões e guerras anteriores.

Também recentemente temos assistido à destruição de estátuas e outros monumentos que lembram e celebram pessoas que, à luz do que sabemos atualmente, apoiaram e beneficiaram de atrocidades, como a escravatura.

Não é possível mudar o passado e as consequências do mesmo. O que podemos fazer é tentar entender as decisões que levaram à criação do património ou mesmo o seu “roubo”. Importa explicá-las o melhor possível tendo em vista tudo o que sabemos e conhecemos agora.

É importante termos em mente que não somos possuidores do conhecimento universal e que a nossa opinião é, como a de muitos outros antes de nós, um resultado do nosso tempo. Nesse sentido, pode ser algo bom o reclamar aquilo que faz parte da nossa identidade, mas também modificar certas coisas de modo a criar um ambiente em que o património faça pensar sem, no entanto, deixar de reconhecer o sofrimento passado ou aceitar práticas que ofendam os direitos humanos.

 

Mariana Antunes

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do ICS/UMinho) 

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