A 31 de outubro de 2017, Barcelos torna-se
na primeira cidade de Portugal e da Península Ibérica a integrar a Rede Mundial
de Cidades Criativas da UNESCO na categoria de Artesanato e Arte Popular[1],
estabelecendo-se desta forma como uma referência exclusiva no tocante às artes
e ofícios portugueses.
De acordo com a publicação Barcelos é Cidade Criativa da UNESCO, a
Rede de Cidades Criativas tem como intuito instituir “uma ligação e cooperação
entre cidades que identificam a criatividade, a arte e a cultura enquanto
fatores estratégicos para o desenvolvimento económico” da própria cidade. Assim
sendo, quando aplicado na prática, a cidade responsabiliza-se por centralizar o
foco da sua ação governativa nas indústrias culturais e criativas,
desenvolvendo e dinamizando estas práticas.
A cidade de Barcelos, inserida no distrito
de Braga, Norte de Portugal, distingue-se por consistir no concelho português
que abarca o maior número de freguesias a nível nacional - um total de 61. Aqui,
em Barcelos, há lendas, história, tradições, e há boa gastronomia e as mais
belas paisagens retalhadas a verde. Mas acima de tudo, como referido
anteriormente esta é uma região que visa distinguir-se particularmente pela sua
atividade artesanal, destacada nas mais diversas áreas: olaria, figurado,
cerâmica tradicional e bordados, de onde se salientam o crivo, a tecelagem, a madeira,
o ferro e a latoaria. Não obstante, existem ainda outras artes relevantes, como
é o caso do trabalho em couro, assim como do artesanato contemporâneo.
A inserção de Barcelos nesta Rede permite
que seja possível o seu reconhecimento e projeção internacional no tocante à
tradição artesanal e arte popular pelo seu exclusivo valor patrimonial, social
e histórico. Esta é uma oportunidade sem
precedentes que irá contribuir para a notoriedade e estima da criatividade não
só da cidade mas, acima de tudo, da população de Barcelos. Ademais, a inserção
na Rede vem também permitir a criação de postos de trabalho, particularmente no
segmento do turismo criativo e de experiências, o qual representa correntemente
um dos sectores mais afetados pela pandemia causada pela SARS-COV-2, por esse motivo
necessitando de urgentes medidas de revitalização. A promoção da criação de
organizações de apoios a esta área artística, bem como a valorização das
oficinas criativas tradicionais e o apoio aos artesões, são fatores relevantes
e de destaque neste contexto. Porém, é importante salientar que a decisão de
candidatura de Barcelos à Rede de Cidades Criativas foi acima de tudo motivada
pela existência de uma comunidade local singularmente criativa e de uma sabedoria
que perdura ao longo de gerações.
Desta forma, os objetivos para esta
candidatura eram os seguintes[2]:
×
Valorização das oficinas criativas
tradicionais e apoio às novas gerações de artesãos;
×
Promoção da criação de estruturas de
preparação e hubs criativos na cidade e de estruturas informais de apoio
às atividades artísticas, gerando mecanismos de apoio à profissionalização da
área artística e criativa;
×
Fomento de projetos compartilhados nos
domínios artísticos e criativos e estimulo à cooperação com outros polos
exteriores de I&D e produção artística;
×
Promoção do desenvolvimento da
visibilidade externa das atividades artísticas e criativas do concelho;
×
Promoção do Turismo Criativo e de
Experiências;
×
Incremento do aparecimento de novas
empresas criativas;
×
Estimulo ao desenvolvimento de uma rede
que fortaleça, inspire e crie novas ideias para um mundo mais próximo e
cooperante;
×
Desempenho de um papel mais ativo no
desenvolvimento de projetos com outras cidades da Rede;
×
Aposta na formação internacional através
da ampliação territorial do projeto de mobilidade europeu, que tem trazido a
Barcelos jovens de vários países da Europa, com o intuito de conhecer e
aprender, no qual se privilegia formações e workshops
criativos locais;
×
Criar laços com África, especialmente com
países de expressão portuguesa (PALOP) no sentido de apoiar a compreensão do
artesanato e da arte popular como um princípio de desenvolvimento e
sustentabilidade;
×
Estruturação de um novo paradigma de
desenvolvimento;
×
Aposta no networking internacional para confirmar a sustentabilidade da
realidade criativa local.
Pelas ruas da cidade é possível encontrar
várias referências a estes objetivos. Porém, maior referência é aquela que se manifesta na inocência e
autenticidade: o grande orgulho da cidade pela sua cultura e pelo artesanato.
Esta forma de expressão reflete-se essencialmente em temas como o quotidiano e
na sensibilidade dos habitantes, o que se traduz num campo criativo que é
transversal a diversos setores académicos, profissionais e associativos. A
dedicação de Barcelos à sua cultura resulta em merecidos prémios de
reconhecimento tanto nacional como internacional.
Comprova-se legítimo que Barcelos
tenha tal destaque não só a nível nacional
mas também a nível mundial, dados os diversos esforços que têm vindo a ser
desenvolvidos para a promoção do seu artesanato e da sua arte popular. Como
residente nesta cidade, e, por conseguinte, com uma visão interna e atualizada
sobre o tópico em questão, posso confirmar com firmeza a importância dada ao
artesanato, assim como a extensiva promoção da arte manual. Na verdade, será
provavelmente a atividade onde se nota mais progresso, o que por outro lado
resulta numa certa negligência para com o outro lado de Barcelos.
Barcelos apresenta uma diversidade
cultural imensa e inusitada, sendo que cada freguesia tem a sua própria história,
tradições e especificidades etnográficas presentes somente na região – o que,
correntemente, não se encontra suficientemente considerado. Todo o restante
desta vasta cultura permanece por isso à margem da Rede Mundial, a qual exclui
outras manifestações populares, cultos e tradições que vão para além do
artesanato e arte popular. Tangível ou intangível, a rica e diversa cultura de
Barcelos não é suficientemente valorizada, tão-pouco aproveitada dado o
potencial das circunstâncias em que vivemos, as quais promovem o turismo dentro
de Portugal e prometem um crescente número de turistas internacionais num
futuro relativamente próximo.
Considero, por isso, fundamental corrigir
esta metonímia, fomentando o equilíbrio entre as diferentes práticas ancestrais
de Barcelos, assim como uma homogénea valorização em termos geográficos.
Vanessa Sofia Fernandes Miranda
Referências Bibliográficas
Barcelos Cidade Criativa (2017). Capital das Artes
Tradicionais. Obtido de https://cidadecriativa.barcelos.pt/#!capital-das-artes-tradicionais/
Cidade
Criativa Barcelos (2017). Objetivos. Obtido em https://cidadecriativa.barcelos.pt/#!objetivos/
Município
de Barcelos (31 outubro 2017). Barcelos é Cidade Criativa da UNESCO.
Obtido em https://www.cm-barcelos.pt/2017/10/barcelos-e-cidade-criativa-da-unesco/
[1] Município de Barcelos (31
outubro 2017). Barcelos é Cidade Criativa da UNESCO. Obtido em https://www.cm-barcelos.pt/2017/10/barcelos-e-cidade-criativa-da-unesco/
[2] Cidade Criativa Barcelos (2017). Objetivos. Obtido em https://cidadecriativa.barcelos.pt/#!objetivos/
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do ICS/UMinho)
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