segunda-feira, março 19, 2018

Caldas das Taipas, o epicentro da Cutelarias Nacional - Capital das Cutelarias?

Geograficamente localizada no norte de Portugal, a vila de Caldas das Taipas (também designada de Caldelas) encontra-se situada no meio de duas das cidades mais importantes do norte do país, Braga (a 15km de distância) e Guimarães (a cerca de 8km), e em 2011 contava com cerca de 6 000 habitantes.
Sendo uma realidade relativamente desconhecida da maioria da população da região, as Caldas das Taipas têm uma importância na economia da região, consequentemente ao nível nacional, através do seu panorama industrial: a indústria da Cutelaria. A atual indústria da Cutelaria está representada por várias empresas situadas naquela vila e nas zonas envolventes, sendo que algumas dessas empresas, como a Hedmar, a Cutipol e a Dalper, são lideres europeus na produção de cutelarias de mesa. Concentram nesta área (Caldas das Taipas e as freguesia adjacentes como vila de Brito, São Clemente de Sande e S. João de Ponte) algumas das empresas de maior relevo nacional deste ramo, tornando-se assim um dos principais polos produtores desta indústria.
Segundo Lopes Cordeiro, é nos inícios do século XX que aparecem as primeiras fábricas industriais de cutelarias nas Caldas das Taipas, muito à custa do desenvolvimento e aperfeiçoamento técnico: em 1908, António da Silva Fertuzinhos e J.F Carvalho & Cª Lda. fundam as primeiras fábricas nas Caldas das Taipas e, em 1911, funda-se nas Caldas das Taipas a Marca 11, de Manuel Marques (futura e atual Herdmar) e, em 1925, a Marca 2, de António Faria da Silva.
Paralelamente ao crescimento das cutelarias, desenvolve-se a preocupação em utilizar a energia hidráulica, que se verifica fundamental para o funcionamento das próprias fábricas, tendo-se muitas delas posicionado junto a caudais do Rio Ave, aproveitando a força da água. Em 1943, António da Silva Fertuzinhos, “solicita a instalação de um dínamo de moinho”, com o intuito de produzir energia elétrica quer para a sua habitação, quer para a sua oficina.
No período do Estado Novo, o panorama cuteleiro muda não só na zona das Caldas das Taipas mas no centro da cidade de Guimarães e em Creixomil devido ao panorama político mas, também, à falta de consciencialização sindical. É neste contexto que se cria, em 1934, o “Sindicato Nacional dos Operários Garfeiros do Distrito de Braga”, com sede em Sande S. Martinho, e no ano seguinte cria-se o “Sindicato Nacional dos Operários da Indústria de Cutelarias do Distrito de Braga, com sede em Guimarães”, levando à sua fusão em 1944.
Na década de 60, o panorama tende a mudar muito à custa da adesão de Portugal à EFTA, que faz com que se abram novas perspetivas para a indústria, já que o mercado era essencialmente para Portugal Continental e para as colónias. Durante este período chega-se a ponderar, face à grande dispersão de unidades fabris e à crise que muitas delas estavam a passar, a criação de um grande complexo industrial entre os dois pólos principais do conselho de Guimarães, Caldas das Taipas e Creixomil, revelando-se, porém, um fracasso.
A progressão do sector cutileiro leva a que a CUTAL - Cutelarias Artísticas, Lda. (1965), a A. Fertuzinhos  Cª Lda. (1966), a Chromolit Portugal (1967) e as empresas que até então existiam (Augusto Mendes & Sobrinho, Lda., a BELO INOX Lda., a CUTIPOL – Cutelarias Portuguesas, Lda, a João Baptista Sampaio Lda., a Manuel Machado & Cª Lda,  a Herdmar- Manuel Marques & Herdeiros, a MARCAL – Martins Caldas & Marques e a Serafim da Silva Fertuzinhos) experimentem uma expansão da sua produção, o que lhes permite um maior investimento e melhoramento do equipamento de trabalho. É então a partir daqui que as Caldas das Taipas se começam a destacar “como o núcleo mais importante, com 20 unidades”.
Com a queda do antigo regime, muitos dos seus órgãos corporativos caíram ou foram substituídos, situação que se verifica com o Grémio Nacional de Indústrias de Cutelarias (composto à época por empresas da zona de Caldas das Taipas), que mais tarde resultará, em outubro de 1974, na criação da “ANIC-Associação Nacional dos Industriais das Cutelarias”, onde são integrantes as empresas da zona das Caldas das Taipas.
Desde a entrada de Portugal para a UE que as empresas têm apostado num grande investimento não só a nível técnico como também apostando nas novas tendências comunicativas através do marketing e design, consolidando assim o seu lugar no mundo. Não obstante a extinção em 2011 da ANIC, as cutelarias vimaranenses, e em particular as da zona das Caldas das Taipas, são nos dias de hoje o “principal produtor de cutelarias de mesa da Europa, chegando a 10% dos europeus, e, em 2009, o seu volume de encomendas ultrapassou os 26 milhões de Euros”.
No entanto, apesar deste panorama industrial situado nas Caldas das Taipas não existe um aproveitamento do território, neste caso, a vila de Caldas das Taipas, para se promover internacional e nacionalmente e usar como “bandeira” a Capital da Cutelaria. Apesar, dos esforços feitos pela autarquia, as associações de cutelaria não conseguiram unir as diversas empresas em prol do setor e da região. Assim, o desconhecimento da população desta região sobre este panorama industrial e o peso na economia das cutelarias das Caldas das Taipas deve-se sobretudo aquilo já referido. Os produtos são feitos na região, mas, no entanto, não têm uma identidade.
Na minha opinião, através de uma marca registada que identificava o produto feito naquela região, uma maior propaganda dessa mesma marca e criação, por exemplo, do museu das Cutelarias poder-se-ia desenvolver um efeito catalisador de outros sectores da economia, como o Turismo, ainda sobretudo devido a sua ótima localização Braga-Guimarães.

Marcelo Silva

Bibliografia:
CORDEIRO, José Manuel Lopes. Guimarães: A Tradição das Cutelarias. In MARTINS, Manuel. Guimarães: a tradição das Cutelarias”, Guimarães: Associação Comercial e Industria de Guimarães, 2014; p.25-102.
FERREIRA, João António Carvalho. A memória e futuro do património industrial de Caldas das Taipas: Projecto para o Centro Interpretativo da Cutelaria. Dissertação de Mestrado em Arquitetura. Guimarães, Universidade do Minho, 2017.
MARQUES, Carlos & MARQUES, Maria José (cord.), Herdmar 1911-2011: 100 anos de paixão de uma família; Caldas das Taipas; Junho 2011.
http://caldasdastaipas.com/

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia e Política Regional”, do curso de Mestrado em Geografia do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)

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