domingo, março 25, 2018

O AGUDIZAR DAS ASSIMETRIAS REGIONAIS E O PROPALADO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: O CASO DE LUTCHAZES

Lutchazes, com cerca de 43 mil quilómetros quadrados de extensão, é um dos 9 municípios da província do Moxico, por sinal a mais extensa de Angola, com 1 habitante por quilómetro quadrado. É um dos municípios de Angola mais afectado pelas assimetrias regionais, cujos propalados projetos/planos de desenvolvimento sustentável são imensuráveis quanto à sua materialização.
Com cerca de 337 km de distância de Luena (capital da província do Moxico) a Lutchazes, foi um dos principais palcos de luta para a independência nacional e da guerra civil em Angola (SERRA, 2000). Atualmente, é notório observar a passividade da pessoa coletiva pública responsável pela satisfação das necessidades básicas e essenciais da população, num contexto marcado pela ausência de equipamentos (escolas, centros médicos, centros comerciais, etc.) e infra-estruturas (estradas, redes de transportação de eletricidade e água potável, etc.), uma população privada de direitos e garantias fundamentais (CRA, 2010). Importa lembrar que o município em tempo de conflito armado, que durou quase 3 décadas, era considerado território estratégico da força que venceu a batalha que opunha a UNITA e o MPLA, e que conduziu ao alcance da paz efectiva a 4 de Abril de 2002 (PINTO, 2012).
Localizada numa zona geográfica de clima tropical húmido, a região tem potencialidades de desenvolver diversas atividades, como a agricultura, a indústria transformadora e madeira e, com isto, propiciar rendimento local e gerar um entramado de serviços e a consequente distribuição da renda local.
Entretanto, ao estabelecer uma comparação superficial entre Lutchazes e os 8 municípios, notam-se claramente assimetrias abismais no que concerne as questões de bem-estar e, de forma geral, a aspetos socioeconómicos pois os indicadores inerentes às realizações a nível de investimentos. A província, em si, já apenas recebe uma fasquia do Produto Interno Bruto (PIB) bastante residual, mas ainda assim as verbas consignadas ao município dos Lutchazes são bastante insipientes tendo em conta a grandiosidade da província como tal. O modelo de redistribuição da mesma riqueza no contexto do território é bastante desequilibrado, facto que resulta na degradante situação da população de Lutchazes, com o declinar substancial dos índices de desenvolvimento humano.
De entre as principais causas destaca-se a má formulação de políticas públicas, que não respondem as necessidades e prioridades reais. Aliás, a construção de aeroportos internacionais nos municípios do Luau e Moxico, que nunca receberam voos internacionais, a construção do aviário de Sacassaji e a vala de irrigação no casco urbano são alguns dos investimentos mal direcionados e concomitantemente sem retornos e reflexos percetíveis na população. O complexo da paz edificado na capital da província, equipamento que melhor seria se fosse erguido no município de Lutchazes por ser o território anfitrião da independência e da paz, onde efetivamente tombou o líder de uma das forças que se opunham ao longo do conflito armado, para que deste modo se alcançasse a paz, serviria de atrcção turística para a região.
Um outro aspecto que faz espécie é o facto de o município de Lutchazes possuir parte significativa dos recursos florestais, e não só, a nível da província, cuja exploração, nomeadamente a madeira, é feita de forma discriminada fundamentalmente pelos chineses, país com o qual Angola tem enormes acordos de cooperação bilateral pouco conhecidos pela população em geral, devido ao imperativo da legislação n.º 10/02, de 16 de Agosto, sobre Segredo de Estado, exploração esta que em contrapartida pouco ou nada injeta nos cofres do estado e, em particular, do respetivo município.
Ora, a subjugação social que se assiste naquela região, para além de agudizar as assimetrias regionais e fragmentar os discursos/objetivos de desenvolvimento sustentável, que de forma geral são desígnios que os países que fazem parte da Organização das Nações Unidas (ONU) ratificaram, acarretam enormes consequências que num futuro breve podem descambar em conflitos étnico e político.
Em síntese, a elaboração de estudos profícuos e a mobilização dos povos na tomada de uma postura mais consciente e ativa na escolha de projetos governativos melhor preparados constituem vias tendentes à inversão do paradigma de desenvolvimento do município em referência, e é, sem sombra de dúvidas, uma das saídas do marasmo que assola a localidade, rumo a uma agricultura mecanizada e uma indústria transformadora moderna, por serem por excelência factores decisivos e objetos da diversificação da economia local. O setor turístico também pode desempenhar um papel dado o que o município representa na história de Angola.

Capalo Gabriel Katumbi

Bibliografia
Constituição da República de Angola (2010)
Lei do Segredo de Estado (Lei nº 10/02 de 16 de Agosto), da República de Angola
PINTO, Tatiana Pereira Leite (2012), Dissertação de mestrado Niterói.
SERRA. Carlos (Org). Racismo, etnicidade e poder – Um estudo em cinco cidades de Moçambique. Maputo: Ed. Livraria Universitária, 2000.

Webgrafia
http://www.un.org/
http://www.who.int/en/
http://jornaldeangola.sapo.ao/

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia e Política Regional”, do curso de Mestrado em Geografia do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)

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