“Nas últimas duas décadas as transformações
económicas, produtivas, tecnologias e institucionais alteraram os equilíbrios
territoriais, modificando as posições competitivas dos diferentes espaços
regionais e urbanos” (Carbalho-Cruz, 2011, Casos de Desenvolvimento
Regional)
Está enraizado na sociedade portuguesa o gosto e o
respeito pelo mar, um recurso natural com uma importância inqualificável num
país com cerca de 1230km de costa.
Em
tempos o mar era o principal responsável pelo sector primário em Portugal, uma
fonte de alimentos e de rendimentos, quer para os pescadores quer para os
agricultores, que aproveitavam alguns dos seus recursos para adubar os campos. Era
visto como algo que lhes dava ‘pequenas riquezas’ e emprego. Há no entanto uma
alteração evidente na maneira como a sociedade passa a ver o mar e como o
utiliza. Este deixa de ser um factor de produção para passar a ser um produto
de consumo.
A
partir dos anos 50 do século XX, gozar de um período de férias/lazer na praia
passa a ser habitual. Os banhos no mar deixam de ser exclusivamente para fins
terapêuticos, tornam-se mais vulgares e abrangem todas as classes sociais,
expandindo-se desta forma a designação turismo de “sol e praia”. Além disso, o
desenvolvimento dos transportes individuais veio ajudar na expansão deste
género de turismo, numa determinada estação do ano, deslocam-se todo o tipo de
consumidores para as zonas costeiras em Portugal, e em consequência disso
surgem variadas infra-estruturas que pretendem responder às necessidades destes
consumidores. No contexto desta grande procura pelas cidades costeiras, começam
a surgir as casas secundárias, as designadas “casas de praia”, assim como uma série
de desportos ligados ao mar.
Todas
estas alterações, talvez demasiado rápidas, são fundamentadas pela procura
incontrolável do litoral. O processo de urbanização que se seguiu em Portugal é
causado pela saída das pessoas do espaço rural para o espaço urbano. É essa imensa
procura que está na origem da formação de cidades, ligada ao processo de
industrialização que aconteceu depois da Segunda Guerra Mundial. Há factores
como o desenvolvimento dos transportes, a diversificada mão-de-obra, o capital
e os variados serviços de apoio, que fazem com que a indústria se instale nas
zonas mais urbanas, especificamente no litoral português: “(…) a pressão da urbanização altera profundamente as paisagens, o uso
do solo e as actividades da população, bem como os tipos de alojamento e de
povoamento(…) (Barata Salgueiro, A
cidade em Portugal, uma geografia urbana).
O
crescimento demográfico e económico das cidades, afectou especialmente Lisboa e
Porto. Com um papel fulcral na economia nacional, contribuíram para o processo
da litoralização,:“Litoralização é o
processo de progressiva concentração de actividades e de pessoas ao longo da
faixa litorial, sem que o interior acompanhe esse ritmo ou mesmo com o recuo da
importância deste em termos absolutos (…)” (Gaspar, Portugal os próximo 20
anos, I Vol.). Todo o tipo de actividades económicas geradores de emprego
concentram-se no litoral, aumentando a desigualdade territorial, visível nos
dias de hoje entre o interior e litoral português.
A
expansão ultramarina e a importância que desde sempre o mar teve para Portugal,
são uma das causas para a forte litoralização do território, ainda que
actualmente haja medidas que queiram contrariar esse fenómeno. A forte
saturação foi acontecendo em
cadeia. Com a população a viver no litoral, foi sendo necessário
criar infra-estruturas . Sem um planeamento ordenado, sem cuidado com os
recursos naturais, o factor económico prevalece como sendo o mais importante.
A
criação de alguns planos por parte do governo, com medidas que devem controlar
os casos de mau planeamento, são perfeitamente contornáveis. No fundo, não há
uma entidade moderadora e verdadeiramente arbitral que se responsabilize pelo
que acontece com o litoral português. As consequências das atitudes humanas
podem ter impactos ambientais, mas também podem pôr em risco o próprio homem.
O
crescimento/interesse económico é o principal “culpado” da transformação no
litoral português. A forte concentração da população, a perda dos solos
agrícolas e dos habitats costeiros, a poluição, a erosão costeira e a
assustadora degradação ambiental, são “apenas” alguns impactes de forte
intensidade causados pelos argumentos económicos dos governos.
O
turismo é também um dos factores, senão o principal factor, promotor da
competitividade territorial, que potencializa estas transformações, “A globalização fez da competitividade
territorial um instrumento de enorme significado na afirmação de países na cena
internacional. Num contexto de economia aberta, dinâmico, é preciso ser-se
capaz de tirar partido de vantagens competitivas existentes ou a construir, o
que, em muitos casos, passa pelo melhor aproveitamento dos recursos e
capacidades dos territórios.” (Pinto Bastos, Cadima Ribeiro, 2011, Casos de
Desenvolvimento Regional).
A forte
aposta em casas secundárias junto à costa, é uma das causas da alteração da
paisagem no litoral, é “a cereja em cima do bolo” das agências imobiliárias que
aliam o conforto de uma casa sofisticada com o sol e praia, juntando a isso,
todos os espaços de lazer que vão sendo construídos, desde cafés, espaços
nocturnos, entre outros. Os hotéis por exemplo, funcionam como alternativa às
casas secundárias. Por norma, o melhor hotel ou mais requisitado será aquele
que estará mais próximo da praia. E o facto é que isso na publicidade do hotel
ganha vantagem sobre qualquer outro. É uma moda que percorre os 1230km da costa
portuguesa. Uns casos mais vergonhosos que outros, mas que denotam a
irrelevância que certos recursos naturais têm neste país.
Trata-se
por isso de uma questão de marketing territorial, da imagem que se pretende
passar, aliando as condições geográficas ao crescimento económico, ainda que em
muitos casos se contornem barreiras naturais.
Rita Freitas
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