quarta-feira, abril 15, 2020

A Fortaleza de Valença do Minho: de sistema defensivo a Património Mundial pela UNESCO

Foi no reinado de D. Sancho I que foi atribuída a primeira Carta Foral a Contrasta – Valença do Minho –, tendo, aquele, decidido erguer no local uma construção defensiva de caráter permanente, reforçando uma linha de fronteira natural, estabelecida pelo rio Minho, entre esta póvoa e o país vizinho – Espanha. Mais tarde, no ano de 1962, o rei D. Afonso III procedeu à alteração do nome da póvoa para Valença e ordenou uma profunda reforma do sistema militar da vila, passando as muralhas a abarcar toda a povoação.
Sendo esta fortaleza uma das mais expostas a ataques espanhóis, têm lugar, nos finais da década de 50 do século XVII, as primeiras tentativas no sentido de reforçar a muralha de Valença, tendo esta obra ficado a cargo do francês Miguel Lescole, que procurou robustecer esta enfraquecida estrutura defensiva, nunca obtendo, contudo, a aprovação do Conselho de Guerra. Em 1691, Manuel Pinto Vilalobos, um discípulo do engenheiro militar francês, levou a cabo a tarefa de reforço da fortaleza através do aproveitamento de grande parte das plantas do mestre francês, ficando, assim, concluída a obra, em grande medida, no ano de 1700.
Atualmente, a Fortaleza de Valença representa um exemplar do bom aproveitamento dos recursos e competências do território, bem como da dinamização do espaço, que tem por base um conjunto de ações que visam promover o município, quer do ponto de vista do património, quer do ponto de vista da paisagem, impulsionando e potenciando, assim, a economia local e incentivando ao turismo. Com um perímetro amuralhado correspondente a 5 quilómetros, trata-se do monumento mais visitado de Valença, constituindo uma fortaleza viva e multicultural, um espaço de convivência galaico-minhoto, comercial e turístico por excelência, aberto ao mundo e às relações entre Portugal e Espanha.


Figura 1 - Fortaleza de Valença

Além de se tratar de um local que privilegia o contacto com a história, o património e a fruição paisagística, a Fortaleza de Valença apresenta-se como ponto de confluência dos Caminhos de Santiago Central e da Costa, Portugueses. Este centro histórico tem-se afirmado como um importante espaço de peregrinação comercial de dimensão transfronteiriça, possuindo pequenas lojas de comércio tradicional e integrando, assim, a Rota do Artesanato dos Caminhos de Santiago. Esta atividade comercial, que a caracteriza, assume elevada importância a nível económico, uma vez que tem um importante peso no emprego dos residentes do concelho.
As regiões do Norte de Portugal e da Galiza trabalham, desde o ano de 2015, no sentido de reforçar a partilha de conhecimentos, com vista a aumentar, anualmente, o número de turistas portugueses e galegos entre ambas as regiões. Esta iniciativa surge a partir de uma ação de promoção e intercâmbio entre a Agência de Turismo da Galiza e o Turismo do Porto e Norte de Portugal. Apontam-se como principais motivações, por um lado, a proximidade entre estas regiões e as consequentes parecenças culturais, no que respeita às tradições e ao folclore, à gastronomia e aos vinhos, e, por outro lado, uma partilha de sinergias transfronteiriças com o objetivo de aumentar a quota de mercado, o número de turistas e, assim, potenciar o aumento da estadia média, gerando um maior retorno dos investimentos realizados no âmbito dos Produtos Turismo de Natureza e Gastronomia e Vinhos.
A Fortaleza de Valença integra, ainda, um conjunto de iniciativas direcionadas para a dinamização do património e respetiva divulgação, bem como para a promoção do turismo, potenciando a curiosidade e o interesse dos visitantes. Neste sentido, destacamos, assim, o programa Rota dos Castelos e Fortalezas, realizado no âmbito do projeto Alto Minho 4D – Viagem no Tempo, que pretende atrair e reforçar os visitantes através de uma rede de 10 rotas/itinerários cronológicos culturais baseados na história e no património do Alto Minho, dinamizando uma atividade por mês na sede de concelho de cada um dos dez municípios do distrito de Viana do Castelo. Este projeto, cuja organização esteve a cargo da CIM-Alto Minho[1], insere-se na Estratégia e Plano Global de Ação: Alto Minho 2020, que visa a valorização dos elementos identitários da região, nomeadamente a natureza, a gastronomia e o património material e imaterial, tendo sido aprovado pelo Programa Operacional Regional do Norte – Norte 2020, no domínio do Património Cultural.
A Fortaleza de Valença é, ainda, uma das fortalezas contempladas pelo programa Dinamizar Fortalezas[2], da autoria do Governo Português, apresentado em Julho de 2019, pelo Ministro-adjunto e da Economia, Pedro Siza Vieira, que pretende promover 62 fortalezas situadas na raia entre Portugal e Espanha, desde o Minho até ao Algarve, tendo em vista, não só a requalificação das mesmas, como também a sua promoção conjunta enquanto produto turístico. A razão deste investimento prende-se com o facto de o Governo considerar que estes monumentos são âncoras de desenvolvimento regional que podem criar emprego e gerar riqueza, afirmando-se como novos destinos turísticos.[3] Pretende-se, assim, que o setor turístico possa continuar a crescer, de forma sustentável, atraindo mais visitantes a territórios de baixa densidade, criando condições de visitação e de conteúdos e promoção internacional e tirando partido da proximidade ao mercado espanhol.
Por fim, além das iniciativas que integra, o município de Valença iniciou o processo de candidatura da sua fortaleza a Património Mundial pela UNESCO, a par com os municípios de Almeida, Marvão e Elvas, apresentando a mesma em Dezembro de 2019. Trata-se de uma candidatura conjunta das Fortalezas Abaluartadas da Raia a Património Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO), aberta a outros municípios de Portugal e Espanha e à qual se poderão agregar após a aprovação pela UNESCO. Este projeto, financiado pelo programa Valorizar[4], implica a criação de uma rota temática – A Rota das Fortalezas Abaluartadas[5] – que agrupa os diferentes polos do projeto. O investimento abrange, ainda, um conjunto de ferramentas de experimentação turística e branding associado, contemplando, também, o desdobramento da marca em vários suportes comunicacionais (site, folhetos, vídeo, merchandising) e ferramenta de monitorização do projeto.
Todas estas iniciativas promovem não apenas a história e o património de Valença do Minho bem como das regiões circundantes e envolvidas, mas também a sua identidade, ao mesmo tempo que preservam, divulgam e valorizam os recursos e competências do território, assentes quer na educação e crescimento regional quer no desenvolvimento e cooperação transfronteiriça.

Ângela Maria Rodrigues Calisto



[1] Rede de trabalho, de partilha e de cooperação que assume impacto aos níveis da hotelaria, da restauração, das atividades económicas, da captação de investimento e da fixação de pessoas.
[3] (RTP & Lusa, 2019)
[4] Linha de apoio à valorização turística do interior, do Turismo de Portugal.
[5] Esta rota pretende ser um produto turístico patrimonial de interpretação e valorização de um legado histórico único, da raia portuguesa, permitindo uma melhor interpretação, valorização e projeção do legado patrimonial em questão.


(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do ICS/UMinho)

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