segunda-feira, abril 13, 2020

O turismo cinematográfico como proposta de valor dos destinos: “The Outlander Effect”

O vasto desenvolvimento que o turismo cinematográfico adquiriu nas últimas décadas relaciona-se com motivações das diversas comunidades em redor do mundo em adquirir novas experiências sociais, gastronómicas e geográficas, baseando-se em filmes e séries.
O diverso leque de visitantes que anualmente partem para locais alvo de gravações cinematográficas tem vindo a aumentar. O estímulo passa por “viver uma experiência” completamente distinta do que estão acostumados na rotina do seu dia-a-dia. Por diversos dias entram numa realidade dissemelhante, transportados para uma história fictícia, que os marcou significativamente ao ponto de procurarem revisitar espaços em pessoa, outrora vistos através de um ecrã.
É assim que o turismo cinematográfico se desenvolve no mundo, transformando locais em espaços de louvor turístico. É ambicionado pela “sociedade das experiências”, e fornecido pelo destinatário, que procura desenvolver a sua imagem enquanto destino turístico com valor distinto dos demais.
É estimulado pela curiosidade do visitante, pela indústria do entretenimento, pelo aumento das viagens internacionais, pelas páginas oficiais nas redes sociais que exercem não só um papel de proximidade com o público, com pequenos trechos de gravação, ou interação do elenco com os fãs, mas também como a forma mais rápida e económica de fornecer informação ao público.
Escolhi como exemplo de turismo cinematográfico a série televisiva “Outlander” e o seu efeito na Escócia. Quando a escritora Diana Gabaldon redigiu o que viria a ser o seu best-seller, não imaginava o impacte que os livros e posterior série teriam para o turismo e desenvolvimento das áreas rurais escocesas. Segundo o website oficial “Visit Scotland”, a série aumentou em 67% o seu turismo nas áreas filmadas.
A série relata a história de Claire Randall, enfermeira durante a 2º Guerra Mundial, que decidiu viajar com o seu marido, historiador, Fran Randall, para a Escócia, no final da guerra. Após tocar numa pedra mágica, Claire recua 200 anos no tempo, sozinha no ano de 1743, durante as rebeliões jacobinas. É nesta realidade que conhece o jovem guerreiro escocês Jamie Fraser e Jonathan Randall, um antepassado do seu marido e capitão inglês.
A série foi gravada em vários espaços escoceses situados entre as cidades de Culloden, Inverness e Stirling, com oportunidade de conhecer o espaço da famosa Batalha de Culloden, em 1746, onde as tropas jacobinas escocesas enfrentaram o exército inglês, o Castelo de Doune, o Castelo de Urquhart, os longos prados escoceses, e até mesmo as Pedras Callanish.

Figura 1 - Elenco no Castelo de Midhope, Escócia

A presença do turismo cinematográfico nesta região da Escócia desenvolveu gradualmente os diversos espaços, deu a conhecer a cultura, as músicas, tradições e a gastronomia presentes nas gravações da série. O Castelo de Doune viu os seus números de visitantes passarem de 38 mil para 142 mil visitantes anuais, já o Hotel Covenanter, cenário de rodagem dos primeiros episódios, viu as suas reservas aumentarem. De forma a estimular o interesse e maximizar o tempo dos turistas, foram criadas rotas de viagem pelos lugares de gravações da série, divididas pelas quatro temporadas.
Os impactes positivos de Outlander para a Escócia a nível socioeconómico e ambiental foram variados. Em concreto, a série gerou o desenvolvimento de infraestruturas existentes e a criação de outras que geraram oportunidades de emprego locais, melhorando a qualidade de vida dos locais, e aumentou a preservação do património material e imaterial escocês e respetivas tradições relacionadas com a linguagem, os costumes e os saberes, justificando a sua proteção.
A nível económico a série atraiu turistas de várias partes do mundo, realidades económicas distintas, que usufruíram de serviços locais (acomodação, comida local, presentes). Estes serviços beneficiam a economia local e o governo escocês, graças às taxas em cada ofício.

Figura 2 - Elenco nos prados escoceses

O cine-turismo acarreta desvantagens, como a enchente de pessoas em diversos espaços ambientais e históricos, que prejudicam inconscientemente ou conscientemente os espaços. Para além disso, trata-se de um turismo maioritariamente sazonal, podendo resultar num desenvolvimento económico desequilibrado e não equitativo, anualmente.
O turista cinematográfico advém de diferentes contextos socioeconómicos, de faixas etárias distintas e diferentes graus de fanatismo.
Tem reflexos do desenvolvimento local e, simultaneamente, podem ser uma ameaça ao mesmo. Contudo, têm todos uma ligação: o desejo de conectarem-se com um mundo distinto do real, vivenciarem uma experiência distinta, visitando lugares físicos, tentando voltar a um mundo ficcional.

Diana Inês de Castro Mendes

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do ICS/UMinho)

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