terça-feira, março 23, 2021

Barragem no TUA

Há alguns dias, a EDP fechou a venda de um conjunto de barragens a uma companhia francesa, a Engie. Entre as barragens vendidas está a barragem do Tua, barragem essa que esteve sempre envolta em enorme polémica desde a sua construção devido à sua localização, que exigiria para a sua construção a destruição de parte de um troço com cerca de 16km bem como de um conjunto de infraestruturas com elevado valor patrimonial, cuja construção remonta ao século XIX. Estando inserida numa zona já por si com elevado valor, a construção desta barragem foi feita em plena zona protegida do Alto Douro Vinhateiro, zona esta considerado pela UNESCO como património mundial.

Em contexto de uma aula de património industrial com o professor Lopes Cordeiro, foram levantados alguns pontos que eu depois fui analisar a fundo, nomeadamente no que concerne às contrapartidas devidas pela construção neste local de enorme valor patrimonial, contrapartidas estas realizadas a conta-gotas e entregues a um operador turístico que ficaria responsável pela construção e manutenção do traçado remanescente. Estas contrapartidas deveriam beneficiar a população afetada pela construção da barragem.

Ora, seria de esperar que a construção desta barragem numa zona protegida pela UNESCO seria uma clara mais-valia para a produção elétrica, no entanto e após alguns estudos é possível constatar que a barragem apenas contribui com cerca de 0,1% da energia nacional, com um custo entre 5 e 10 vezes superior às restantes alternativas disponíveis (dados recolhidos pela GEOTA em 2015). Será então importante analisar se o impacte da construção desta barragem na produção de energia a nível nacional justificaria os sacrifícios sociais, ambientais, culturais e económicos a ela associados e os 370 milhões lá investidos.

Concluindo: agora, o que pretendo com este breve comentário será questionar se Portugal benefíciou assim tanto da construção desta barragem que justificasse o alagamento daquela zona e a sua posterior venda? Será a valorização do nosso património industrial e ambiental assim de tão pouco valor que justificasse a construção de uma barragem de valor produtivo residual? Convém recordar a propósito desta temática que havia planos iniciais para a construção de uma barragem na região do Vale do Côa, que como bem sabemos também é uma zona com elevado valor patrimonial e arqueológico e que só com muito trabalho de campo foi impedida a sua construção.

É importante então que estas questões sejam mais bem trabalhadas, que o nosso património seja mais bem tratado e que só com uma necessidade imperiosa e com uma clara mais-valia obras deste género sejam permitidas. Espero sinceramente que a concessão da exploração das linhas remanescentes bem como a exploração do rio por parte da empresa dona da Douro Azul e responsável pela recém criada “Tua - Emoções fortes” constitua uma mais-valia para zona de inquestionável beleza e que a mesma possa extrair todo o seu potencial do ponto de vista turístico num claro respeito pelo meio envolvente e pelo seu passado.

 

Carlos Queirós

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do ICS/UMinho)

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