segunda-feira, março 22, 2021

Teoria dos lugares centrais e hierarquia dos serviços: as cidades de 15 minutos

A origem de muitas teorias no âmbito da atração de mercado em relação a centros de comércio origina-se na estruturação ideológica do livro The Law of Retail Gravitation, de William Reilly. Em analogia com a lei da gravitação universal, a teoria defende que o consumidor é mais ou menos atraído a um centro de comércio através de uma relação de proporcionalidade inversa entre a população desse mesmo centro e o quadrado da distância entre ambos.

Este modelo surge em 1931 e foi alvo de várias críticas, ainda que tenha suscitado um desenvolvimento da teoria com avaliações mais complexas para ter em conta maior variabilidade e aplicabilidade em contexto real. O modelo probabilístico de Huff estuda de forma mais aproximada e tem em conta maior número de variáveis na definição do resultado final.

Em quase todas as expressões dentro do caso em questão, a distância ou o tempo de deslocação até ao local de prática económica são fatores de protagonismo hierárquico. Isto evidencia-se na procura de resolução urbanística de problemas deste âmbito. A utopia da resolução em “cidades de 15 minutos” é uma estratégia que se desenvolve baseando-se neste mesmo fator crítico no desenho urbano: a distância do consumidor aos serviços, equipamentos públicos e zonas laborais. A sustentabilidade energética e a emissão de CO₂ são também elementos abrangidos pelo planeamento associado à criação destas cidades. Esta preocupação provou-se realista quando a diminuição em 17% na emissão de poluentes para a atmosfera aconteceu, comparando dados de 2019 e 2020, com a pandemia mundial de COVID-19.

A aparente simplicidade da solução não se verifica nas odes da edificabilidade da mesma. No entanto, esta opção permite uma dinamização económica no que toca a micro e pequenas empresas e comércio local. A facilidade na acessibilidade e a sustentabilidade energética e ambiental são vistas como o futuro do urbanismo, com particular importância no desenvolvimento económico pós-COVID, tornando assim as cidades de 15 minutos nos “motores” da retoma do equilíbrio e mitigação do impacto económico. 

Esta simplicidade presente na solução é o principal alvo de crítica da mesma devido às condicionantes reais, como a existência de pessoas com trabalhos geograficamente colocados de forma distante da habitação das mesmas. Apesar disto, a implementação de desenho urbano baseado na ideia de cidade
 “policêntrica”, pode ser tentada desde que existam cuidados de aferição do preço de habitação em corelação com a diversidade de centros e as suas especificidades. A dispersão destes polos permite um equilíbrio nos valores de custo de habitabilidade e rendas, ainda que esta hiper proximidade exija superação de séculos de planeamento urbano antecedente.

No caso das cidades no velho continente, este obstáculo, num quadro “SWOT”, seria facilmente observável como uma oportunidade, visto que em várias urbes já se aplica o desenho urbano em torno da deslocação pedonal em detrimento do uso automóvel. Isto acontece no contexto europeu devido à “idade” das cidades, em que o planeamento nem sempre foi feito como na contemporaneidade, privilegiando as ruas largas e de ordenamento ortogonal, favorecendo os automóveis. Isto evidencia-se em cidades como Braga ou Guimarães, tendo um contexto patrimonial milenar, ao qual se torna intrínseco o sistema viário em proximidade ao considerado centro histórico.

Isto torna Portugal num país privilegiado na futura aplicabilidade desta teoria, sendo que a chegada da mesma já transpareceu em grandes áreas metropolitanas europeias, como a de Paris, à mão da presidência de câmara de Anne Hidalgo. A simplicidade da tese em questão torna a aplicação da mesma, tendo em conta os contextos complexos da realidade socioeconómica das cidades em 2021, num processo não consensual. No entanto, são inegáveis algumas das vulnerabilidades que a mesma procura resolver, e a teoria é uma tentativa de aproximação à solução ideal. Tal como se sucedeu com William Reilly, pode estar à vista uma das bases para o alcance das resoluções urbanísticas de futuro.

 

Tiago Madureira

Bibliografia:

https://www.jornaldenegocios.pt/sustentabilidade/smart-cities/detalhe/a-cidade-dos-15-minutos-e-o-desafio-do-bem-estar

https://www.bloomberg.com/news/articles/2020-07-15/mayors-tout-the-15-minute-city-as-covid-recovery

file:///C:/Users/Utilizador/Downloads/smartcities-04-00006.pdf

https://www.bloomberg.com/news/articles/2021-03-02/the-downsides-of-a-15-minute-city

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Urbana”, lecionada ao Mestrado Integrado em Arquitetura, da Escola de Arquitetura/UMinho) 

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