O município de Braga foi recentemente eleito o melhor destino da Europa 2021. Braga tem colecionado títulos. Somam-se a esse louvável, outro recentemente atribuído pela UNESCO, em 2017, Braga Cidade Criativa (domínio Medias Arts); e mais um: em 2020, Braga foi escolhida Capital da Cultura do Eixo Atlântico. Atualmente, Braga se prepara para mais uma concorrência: quer ser a nova Capital Europeia da Cultura.
Os investimentos dos municípios em políticas públicas culturais são
relativamente recentes. Tem-se hoje que o setor cultural é um setor de suma importância;
observam-se constantes e rápidas mudanças no tratamento desse setor, que
adquire cada vez mais um caráter de cooperação pública transversal. A gestão
local é comumente e cada vez mais apontada como solução para inúmeros
desajustes ou sucessos de políticas pública de qualidade (ao contrário de uma
política centralizada pelo Estado). O Património Cultural é um dos setores mais
beneficiados por uma gestão de proximidade.
No artigo “Políticas
culturais locais: contributos para um modelo de análise”, os autores, Augusto Santos Silva, Elisa Pérez Babo e Paula Guerra, buscam
analisar qual o papel das autarquias portuguesas na política pública cultural.
Segundo os autores, a partir dos anos 80 – com o novo cenário político-
económico e a entrada na Comunidade Europeia nos 90, “as condições de
intervenção autárquica na esfera cultural mudaram qualitativamente”. As
autarquias foram imbuídas de maior poder decisório e económico em seu
território, dotadas de “um padrão de intervenção municipal estruturado em três eixos principais:
a defesa e valorização do património, o desenvolvimento de uma oferta local e a
formação de públicos culturais”.
No tocante à esfera cultural, a cidade de Braga explicita através do seu
plano estratégico 2014-2026, o “Plano
Estratégico para o Desenvolvimento Económico de Braga”, a importância político- económica da história e da cultura para a
cidade Braga, bem como dedica páginas específicas de seu conteúdo e estudos ao
eixo turístico e à categoria mais especulada no momento: a “economia criativa”.
Figura 1 e 2 -
Dados Plano Estratégico Municipal 2014 -2026
Através do site da Câmara Municipal, o município comunica que mantém algumas redes de cooperações
institucionais, no que afirma que “a cooperação institucional com outras
entidades é essencial para o desenvolvimento económico, social e cultural do
município e dos seus cidadãos.”
Embora o próprio site da autarquia seja um tanto ou quanto desatualizado (o site menciona a candidatura da cidade à Unesco, título já conferido
em 2017), estariam ainda as ambições de planeamento estratégico turístico-
cultural em vigor?
Numa
proposta visualmente mais moderna e num contexto particular, o documento Estratégia
Cultural de Braga 2020–2030, usado como suporte à candidatura de Braga a Capital
da Cultura Europeia de 2027, contempla diversas estratégias e ações no campo
global da cultura, sendo um valioso documento e uma plataforma que promete
acompanhar e nortear o setor cultural de Braga durante os próximos 10 anos; por
exemplo, esse documento nos informa que “em 2018 a despesa municipal em
atividades culturais e criativas cifrou-se nos 4,8 milhões de euros”. Ainda, a
análise feita no conteúdo nos deixa reais constatações: mesmo se Braga é palco
de polos de inovações, o setor cultural ainda “encontra-se, de um modo geral,
subdesenvolvido e fragmentado.”
Terminada
a fase de “mapeamento, identificação e auscultação do tecido cultural”, Braga é
oficialmente candidata e a equipe multidisciplinar do Braga Cultura 2030 avança para a próxima fase,
esperando a possível nomeação, em 2022.
Se
analisássemos a linha de comunicação desses dois documentos, é percetível uma tentativa
de tecer uma narrativa, uma estratégia de um marketing territorial em torno da
cidade de Braga, talvez com finalidade de trazer à tona sua reconstrução
permanente. Seus vestígios de 2000 anos e seu presente de “Medias Arts” a
obriga a uma espécie de psicanálise bracarense cotidiana, como dito no vídeo de
apresentação: Braga anda à procura de sua identidade, tem múltipla
personalidade. Como criar uma realidade que possa abarcar ambos, os moradores
(também os estrangeiros) e visitantes, quer sejam eles turistas, quer sejam os
28 mil itinerantes que se deslocam a Braga diariamente? Como adaptar as
políticas culturais a constantes movimentos migratórios e tecnológicos? Como
combinar tradição e inovação?
Todas
essas iniciativas públicas municipais, tais como elas são descritas, necessitam
da profunda cooperação entre poder público, atores privados e associativos; testemunham
uma ação coordenada entre os agentes, carecem de uma organização global e de
uma imensa vontade de avanço e/ou mudança. O plano estratégico Municipal tem
sua validade até 2026; resta saber se em 2022, por ocasião do anúncio da cidade
ganhadora do selo Capital Europeia da Cultura, se Braga poderá levar adiante
esses inúmeros trabalhos já iniciados, ou se a contrario, perante um
anúncio negativo, se abandonarão tamanho esforços já tão desenvolvidos. Vê-se
que nem só de subjetivação (sobre)vive a cultura.
Marisol Cordeiro
Referencia
Bibliográfica:
Augusto Santos Silva, Elisa Pérez Babo et Paula Guerra, « Políticas culturais locais:
contributos para um modelo de análise », Sociologia, Problemas e Práticas [En ligne],
78 | 2015, mis en ligne le 21 mai 2015, consulté le 20 mars
2021.
URL : http://journals.openedition.org/spp/1997
(Artigo de opinião produzido no
âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de
Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do
ICS/UMinho)
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