domingo, março 21, 2021

Os trilhos como elementos de desenvolvimento regional. O caso do Trilho do Castelo - Vila Pouca de Aguiar

          O território nacional, apesar da sua relativa pequena área quando comparado com os seus congéneres, dispõe de uma enorme variedade e heterogeneidade do seu património natural. Na verdade, dados do Eurostat indicam que Portugal, entre os 27 países da União Europeia (N.A. dados pré-Brexit) só é ultrapassado por Malta, liderando assim, no campo da diversidade paisagística[1]. Acresce ainda que, na sua caraterização biofísica, os elementos e as diferenças geológicas, climatológicas, hidrográficas, geomorfológicas, dos solos e dos próprios recursos minerais, tornam-no, sem dúvida, um amplo e abundante espaço físico nesta componente ambiental. Tais qualidades têm permitido uma oferta turística igualmente diversa e que abarca muitos públicos com interesses também estes distintos.

          Se desde os anos 50, o turismo de “sol e mar” tem sido o mais explorado e procurado, esta tendência tem sido não invertida mas complementada com o aproveitamento total do território nacional, em particular desde a implementação e execução do Plano Estratégico Nacional de Turismo 2006-2015 (PENT), oferecendo novos mercados e captando novos turistas, tanto nacionais, como estrangeiros.

          Não se estranha assim, como ferramenta de desenvolvimento regional, a criação e consequente desenvolvimento do turismo da natureza, em particular dos trilhos e percursos pedestres, que neste momento se espraiam de Norte a Sul. Assim, as inúmeras e cada vez mais procuradas incursões pelas Fisgas de Ermelo (Mondim de Basto), Passadiços do Paiva (Arouca), a Rota da Garganta de Loriga (Serra da Estrela) ou o Caminho do Xisto da Lousã (Lousã), nomeando somente alguns, tornam estes locais ex-libris do pedestrianismo.

          É certo que o património natural que se visita neste turismo da natureza, “faz parte dos bens inestimáveis e insubstituíveis de toda a humanidade” (Unesco, Convenção do Património Mundial, 2014) e para nós, enquanto profissionais ligados ao património ou leitores mais atentos e preocupados com a sua preservação e conservação, acarretará sempre enorme valor.

Por me interessarem as sinergias e relações colaborativas entre instituições e organismos como forma potenciadora de atividade e crescimento (económico, social, demográfico), parecem-me pertinentes algumas reflexões.

Para os amantes da natureza, caminheiros, viajantes ou turistas ocasionais, para além do bem-estar, do exercício físico, da contemplação da paisagem e de todo a imersão sensorial, que outras experiências e vivências podem obter na sua passagem? E que relações de afetividade criam com o local visitado? E, paralelamente, que aproveitamento, no âmbito do desenvolvimento regional, podem entidades ou municípios encetar, com o seu património físico, em particular com os diferentes percursos pedestres que calcorreiam as suas fronteiras internas?

De que forma se pode estimular a visita a um novo território, e como se podem motivar regressos? E, ainda, de que forma as terras, as comunidades e os seus serviços e comércios podem ganhar com estas movimentações turísticas?

          Tais questões podem-se colocar para o novo relocalizado e requalificado Trilho do Castelo, um investimento do município de Vila Pouca de Aguiar, em plena Serra do Alvão, no âmbito da construção da Central Hidroelétrica de Gouvães, incluída no  Sistema Electroprodutor do Tâmega, localizada no Rio Torno, sendo este um afluente do Rio Tâmega. Este novo traçado mantém-se protegido e valorizado pelas diretrizes da Rede Natura 2000, no qual se insere.

Neste território em particular, e ancorado neste trilho, na perspetiva dos visitantes, estes podem observar diferentes pontos de interesse biológico como habitats (vidoal, charnecas, lagoas e afloramentos rochosos), bem como a flora e fauna autótone (borboletas, libelinhas, libélulas, anfíbios). Permitem-se ainda as visitas a elementos de interesse histórico e arqueológico como os núcleos rurais de algumas povoações, sítios arqueológicos de período megalítico, como o Mamoa do Alto do Cotorino ou as Sepulturas Medievais escavadas na Rocha.

Por sua vez, o município poderá aproveitar o fluxo de visitantes encaminhando-o aos diferentes equipamentos e atividades culturais de que dispõe, estimulando igualmente a visita aos seus produtos e comércios ligados à gastronomia, hotelaria, artesanato, indústria local. Utopicamente, pode levar até à radicação de novos habitantes que se interessem pelo estilo e qualidade de vida, certamente distinto dos aglomerados de regiões metropolitanas. Justificam-se as visitas, não só pelo ato de caminhar, mas por todas as experiências associadas.

Indubitavelmente, Portugal apresenta inúmeros recursos naturais que podem e devem ser explorados, em particular no interior e interior norte, onde os vales e montes que rasgam a paisagem permitem pensar o território, o seu ordenamento e o seu usufruto (igualmente turístico) de uma maneira muito própria.


Marco Alexandre Rodrigues e Matos


[1] http://ec.europa.eu/eurostat/statistics-explained/index.php/Land_cover,_land_use_and_landscape 

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, lecionada ao Mestrado em Património Cultural, do ICS/UMinho)

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