segunda-feira, março 09, 2020

O Rio de Janeiro e o legado olímpico

O estado do Rio de Janeiro possui uma importância estratégica para o turismo nacional e foi responsável pela geração de 10% do PIB do setor em 2017. Mundialmente conhecida por suas belezas naturais e clima tropical, a cidade do Rio de Janeiro, capital do estado de mesmo nome, sempre se destacou como destino turístico, tanto entre os estrangeiros como entre os próprios brasileiros. Entretanto, a crise econômica enfrentada pelo estado nos últimos anos tem deixado a cidade cada vez mais distante dos ideais de viagem dos turistas. Ironicamente, grande parte dos problemas enfrentados pelo governo fluminense, atualmente, tiveram origem nos grandes eventos que toda cidade sonha em sedear.
Em 2009, ao ser anunciada como sede dos jogos Olímpicos de 2016, os governos federal e estadual deram grande enfoque ao “legado olímpico”: um conjunto de obras de infraestrutura; urbanização e revitalização de espaços públicos, que seriam a herança do evento para o estado. Mas, na prática, o que se viu foi, além da repetição do padrão já conhecido pelos brasileiros após a Copa do Mundo de 2014, com obras inacabadas e dinheiro público desperdiçado, diversos casos de corrupção, um problema endêmico no país.
Os desvios milionários, somados à má administração, foram responsáveis pelo esvaziamento das contas públicas do estado, desencadeando um efeito dominó no setor privado regional, levando o estado, nos anos seguintes, à ruína econômica. Com um défice de 26 bilhões de reais em 2017 e sem recursos financeiros para promover serviços básicos para a população, as belas praias passaram a contrastar com a crescente miséria e com o aumento da sensação de insegurança. No setor turístico, somente na capital, 14 hotéis encerraram suas atividades desde 2017 e, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a retração na atividade acumulada nos anos de 2017 e 2018 foi de 11,5%, cinco vezes maior que a média nacional.
Atualmente, o governo estadual tenta reverter esta situação através de investimento nas atividades turísticas e chegou a chamar o turismo de o “novo petróleo”, fazendo alusão à importância do óleo para a economia fluminense.
Em junho de 2019, o Secretário de Turismo Otávio Leite e o Governador Wilson Witzel divulgaram um conjunto de medidas para alavancar o setor. Uma delas, a “Rumo ao Rio”, tem como objetivo atrair eventos como congressos, shows, conferências e seminários, uma vez que, de acordo com a fundação Rio Convention & Visitors Bureau, no ano de 2018, somente a cidade do Rio atraiu 1,2 milhão de pessoas através de tais atividades.
Em dezembro de 2019, foi a vez do seminário “Rio + Turismo – Avanços para Transformar o Estado”, onde o governador reuniu líderes do setor e agentes governamentais para discutirem políticas para esta área e estimou dobrar o investimento, que passaria dos R$ 20 milhões em 2019 para os R$ 40 milhões em 2020.
A estratégia, porém, é questionável, uma vez que ao invés de se focar nos problemas sociais e de infraestrutura do estado, o governo parece ter no turismo sua única aposta econômica, esquecendo que é preciso coordenar o incentivo à atividade turística com medidas de investimento em infraestrutura, serviços públicos de qualidade e segurança, sendo esta última de extrema importância para o setor. Sendo assim, a recuperação do prestígio do Rio de Janeiro como destino turístico passará, obrigatoriamente, pelo reconhecimento dos equívocos da atual política de fomento focada somente na atividade em si, não a vinculando a melhoria das condições de vida da população. Afinal, o bem-estar do povo é o melhor cartão de visitas para qualquer turista. Enquanto isso, a única parte do legado olímpico do qual se poderá desfrutar é a recessão.

Luciana Vitoriano Rodrigues

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia do Turismo”, de opção, lecionada a alunos de vários cursos de mestrado da EEG, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2019/2020)

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