O memorando de entendimento
sobre os condicionamentos de política económica, no âmbito da ajuda externa,
estabelecia, em 17 de Maio de 2011,
a necessidade de “reorganizar a estrutura da
administração local”. Perante a existência de 308 municípios e 4 259
freguesias, o Governo comprometia-se a desenvolver, até Julho de 2012, “um
plano de consolidação para reorganizar e reduzir significativamente o número
destas entidades”.
Já em Setembro de 2011, o
Governo apresentou o Documento Verde da Reforma da Administração Local, para “lançar o debate político, estabelecer os
princípios orientadores e os critérios-base, promovendo o estudo e a análise do
suporte legislativo em vigor”. Definia-se como objectivo a realização de “uma análise do actual mapa
administrativo, promovendo a redução do actual número de Freguesias”.
Se, por um lado, o Governo
realçava a importância de esta reforma ser feita com e não contra as
autarquias, a 3 de Janeiro de 2012 já se podia ler no Jornal de Negócios que a
"proposta de lei para a reforma das freguesias está a ser ultimada.” – ou
as autarquias aceitam a proposta do Governo e definem a sua nova organização de
acordo com critérios muito estreitos, ou o Governo o faz em seu lugar.
Rapidamente se multiplicaram
os protestos e rejeições deste documento. Uns argumentam que a reforma é feita
sem conhecimento da realidade social, à revelia das populações e sem garantia
de ganhos de eficiência ou eficácia. Ao contrário do
propósito anunciado de “promover maior proximidade entre os
níveis de decisão e os cidadãos, fomentando a descentralização administrativa e
reforçando o papel do Poder Local como vector estratégico de desenvolvimento”, outros argumentam que esta
reforma configura um ataque à democracia e afasta os órgãos de decisão da
população, uma vez que diminuirá fortemente a representação dos partidos
pequenos no poder local. Também utilizado é o argumento de que a redução de
custos decorrente, a existir, será muito escassa. Segundo notícia no Jornal de
Notícias de 3 de Janeiro, a Associação Nacional de Freguesias, afirmou que só
aceita a reforma caso a decisão das freguesias quando confrontadas com a
possibilidade de agregação seja vinculativa.
Na verdade, as críticas feitas
à reforma da administração local, e, essencialmente, à forma como está a ser
imposta, são tudo menos descabidas.
De facto, o Fundo de
Financiamento das Freguesias é relativamente pequeno. No total, para as 4 259
freguesias, o fundo tinha, no ano de 2008, € 198 218 007. Note-se que a maior
parte das despesas continuará a ser feita pelas novas freguesias, o que torna a
redução de custos praticamente irrelevante. Em alguns casos pontuais,
poder-se-ia usufruir de economias de escala, mas, para isso, não seria
necessário unir freguesias, bastando um maior controlo da sua actividade por
parte dos municípios que poderiam arbitrar coligações pontuais.
Segundo dados do “Documento Verde”,
das 4 259 freguesias, 2 198 são consideradas Áreas Predominantemente Rurais, e,
destas, 1 799 têm menos de 100 habitantes por Km2. Num contexto em
que, nestas zonas, têm vindo a ser retirados serviços públicos, desde hospitais
e centros de saúde, escolas e repartições de finanças, as juntas de freguesia
são, muitas vezes, a única presença do Estado que resta. A sua extinção
provocará um indesejável sentimento de abandono.
É ainda de referir o valor
histórico e tradicional de muitas freguesias, como é o caso do Vimeiro, na
Lourinhã, que mantém há 400 anos as mesmas fronteiras e até dá nome à batalha
que marca a primeira derrota das tropas Napoleónicas em Portugal.
Perante uma reforma que corre
o risco de não reduzir significativamente os custos, não aumentar a eficiência
nem a eficácia dos serviços públicos, contribuir para o afastamento entre
decisores políticos e cidadãos e comprometer a identidade cultural de muitas
freguesias, pergunto-me: será esta uma medida estrutural para a economia ou uma
farsa estrutural para a democracia?
Luís Nuno Barbosa
[Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Regional” do 3ºano do curso de Economia da EEG/UMinho]
[Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Regional” do 3ºano do curso de Economia da EEG/UMinho]
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