sábado, março 16, 2019

O turismo cemiterial em Portugal: um tabu a ser desmistificado

Não é novidade que a indústria do turismo movimenta intensamente a economia em todos os cantos do planeta e que está sempre a ser reinventada, fazendo com que novos segmentos, fruto de uma criatividade ligada quase sempre ao âmbito econômico, sejam criados constantemente. No entanto, um ramo considerado um tanto peculiar e ainda visto como “tabu” por grande parte da população vem adquirindo notoriedade entre turistas e viajantes mais curiosos ou amantes da história: o turismo cemiterial, nicho considerado integrante do que pode ser chamado de “turismo macabro”[1]. Entre os atrativos deste último, encontram-se sítios ligados à morte, ao obscuro, ao medo e a experiências que podem ser bastante traumáticas quando vivenciadas na realidade e não no âmbito do turismo.
Cemitérios como o da Recoleta, em Buenos Aires (Argentina), Père Lachaise, em Paris (França), e o Antigo cemitério judaico de Praga (República Tcheca) são ícones do segmento turístico de que se fala e gozam de grande relevância entre os roteiros de turistas das mais diversas nacionalidades, uma vez que oferecem ao público não apenas a experiência pelo viés da história da arte, ao conter estilos distintos de arte e arquitetura, mas também a história de toda uma população, seja ela local, regional ou nacional.
É possível visualizar, nos dias de hoje, que o interesse na cultura contida, implícita e explicitamente, em campos-santos, tem crescido em Portugal entre residentes e grupos vindos do exterior, fazendo com que esse ramo do turismo passe a obter maior visibilidade e, por consequência, incentivo por parte de instituições públicas e privadas. A cidade do Porto, por exemplo, conta atualmente com alguns eventos culturais nesta área, tais como a Semana à Descoberta dos Cemitérios e o Ciclo Cultural dos Cemitérios do Porto (já encaminhando-se para a sua décima edição), sem mencionar ainda a oferta de cursos de mediação para que guias turísticos possam adentrar este mundo ainda pouco explorado, quando em comparação com outros segmentos da área. Desde o ano de 2003, visitas mediadas são oferecidas em cemitérios do concelho e sabe-se que há demanda por parte de turistas estrangeiros, os quais contabilizam grande parte do percentual de visitação nos mesmos.
No entanto, não é apenas a cidade do Porto que está a explorar as potencialidades do turismo cemiterial - outros diversos sítios em Portugal passaram a perceber o leque de possibilidades e o consequente retorno económico, social e cultural oportunizado por esta área em questão. O turismo emergente passa então a atuar no fomento e na ampliação de atividades empreendidas pelas câmaras e autarquias, uma vez que nota-se o aumento de demanda e, portanto, ações voltadas ao campo são organizadas.
Por fim, a afloração do chamado turismo cemiterial representa a abertura de novas possibilidades, no quadro do desenvolvimento cultural de determinadas cidades e regiões, fazendo com que haja um aumento no movimento de turistas e possivelmente um incremento na economia destes sítios. No entanto, ainda é cedo para determinar os impactes a longo prazo deste tipo de turismo na economia e no âmbito do desenvolvimento local e regional, uma vez que os estudos sobre a matéria são muito recentes, mas um ponto é certo: o crescimento deste segmento do chamado turismo macabro só tem a acrescentar, tanto no âmbito educacional, quanto no cultural e econômico, visto que significa um novo estilo de experiência não apenas para a população que vive nas proximidades destes sítios de importância histórica e turística, mas também para todos os curiosos que optam por estas vivências.

Angélica Vedana

Bibliografia:


[1] “Rojek [1] is probably the earliest scholar that coined the term “dark tourism or thanatourism”, which describes any form of tourism activities revolving around a destination that involves notable death.”

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, do curso de Mestrado em Património Cultural do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2018/2019)

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