Em
França, na Borgonha, nos arredores da vila de Saint-Sauveur-en-Puisaye, está a
ser construído um castelo medieval: o Castelo de Guédelon. A construção do
castelo segue as normas de um castelo tipicamente francês e tenta imitar o que seria,
na época, uma fortaleza de um pequeno senhor feudal: uma planta poligonal, o
fosso seco em redor do castelo, uma torre de menagem, muralhas altas e torres
com seteiras e dois torreões, onde fica a entrada.
Michel
Guyot, o dono deste castelo e o homem que teve a ideia de, em pleno século XXI,
construir um castelo como se vivêssemos no século XIII, sempre foi apaixonado
pela história, e ainda mais pela história medieval. Quando teve em mãos a
hipótese de recriar um pequeno pedaço de história, não hesitou.
A
premissa para o início das obras era clara: só se usariam técnicas e métodos do
século XIII e qualquer equipamento elétrico, ferramenta moderna, cimento ou
veículos motorizados estavam completamente proibidos. Além disto, só se usariam
materiais daquela época, como a pedra, argila, terra e madeira. O local
escolhido, obviamente, também não foi aleatório. Um local com terrenos
calcários, rodeado por florestas e com zonas de barro facilmente acessíveis.
Acrescentando a estas caraterísticas, havia ainda uma pedreira abandonada nas
redondezas, o que significa que todos os materiais estariam na zona. Esta
conjuntura é muito importante já que o único meio de transporte utilizado é a
carroça puxada a cavalos.
Com
estas condições, estava tudo pronto para o começo do projeto, que aconteceu em
1998, isto é, 1228, data escolhida pelos mentores do projeto. No local, os
turistas perdem-se numa viagem no tempo, já que todos os trabalhadores estão
vestidos como na época, vivem e trabalham como se estivessem efetivamente na
Idade Média. Entre os mais variados tipos de trabalhadores, podemos encontrar
lenhadores, carpinteiros, ferreiros, carroceiros, ceramistas e tecelões de
cordas. Em Guédelon, tudo é feito à mão, desde pregos de ferro gigantes a
cestos de vime, usados no transporte de materiais.
Este
castelo tornou-se num grande destino turístico, tendo sito visitado, em 2013,
por 340.000 pessoas, incluindo 60.000 crianças da escola francesa. Apesar de a
premissa desta atração ser já razão suficiente para merecer uma visita, há
ainda mais um ponto a favor: de cada vez que se visita, está completamente
diferente, já que está sempre em constante evolução. Esta mutação contínua não
só torna cada visita mais encantadora e única como, também, é muito importante
de um ponto de vista histórico e científico, já que há várias pesquisas e
teorias que podem ser comprovadas ou refutadas. Para um arqueólogo, ver crescer
um edifício, ao invés de estudar as suas ruínas, é altamente inovador e
produtivo.
A
equipa de trabalho conta com dezenas de trabalhadores – a maior parte locais, o
que desenvolveu economicamente a área – e um comité de conselheiros
científicos. No entanto, centenas de voluntários são enquadrados na equipa
todos os anos, pelo que qualquer pessoa se pode inscrever.
Este
projeto, além de ser inovador, originar estudos para historiadores e
arqueólogos, resultar em crescimento económico, seja pelo turismo resultante ou
pela contratação de pessoas da região, tem ainda um outro objetivo no
horizonte: o ambiente e a sustentabilidade. Como já referi, todos os materiais
são provenientes da região e nada é comprado, já que a maior parte da
matéria-prima é oriunda da pedreira. Tudo é retirado e feito no local, seja a
pedra para as muralhas e paredes, a madeira para os telhados e varandins e o
barro para as telhas. E nada é desperdiçado: as pedras de fraca qualidade ou
que já não possam ser aproveitadas para paredes ou para a zona exterior, num
contexto estético, são utilizadas para encher a muralha, que deverá ter três
metros de espessura; e, de um ponto de vista ambiental, nenhuma árvore é
cortada sem se saber especificamente onde a madeira vai ser usada.
As
reações do público não poderiam ser melhores: todos eles destacam “como é
incrível poder voltar atrás no tempo”; “ver como as pessoas trabalhavam há 800
atrás é maravilhoso”; “as pessoas estão vestidas como na época e ensinam como
produzir os materiais”. Os pontos negativos são, apenas, “andar muito e
enfrentar alguma lama”, como já era de esperar. O preço por pessoa está fixado
nos 14€ para adultos e 11€ para crianças, e o local está aberto das 10 às 18.
No
meu entender, este destino turístico é um exemplo praticamente perfeito de como
o turismo deve funcionar. Dinamiza o local e emprega pessoas locais; usa
materiais da região; não polui o ambiente e ainda o tenta preservar, uma vez
que tentam recriar uma época passada; a fauna e a flora não são afetadas, não
há ruídos excessivos e muito menos o aumento de área construída e redução das
áreas naturais. Depois de uma breve pesquisa, posso afirmar que o preço por
noite, para duas pessoas, nos hotéis da região, ronda os 60-70€, pelo que me
parece que o turismo não levou ao aumento exagerado dos preços. No fundo, o
único problema será o aumento de resíduos, uma vez que, com a afluência de
pessoas, é algo que não se pode evitar, já que quem polui são as pessoas e não
o local.
Miguel Rodrigues
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, do curso de Mestrado em Património Cultural do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2018/2019)
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, do curso de Mestrado em Património Cultural do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2018/2019)
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