Guimarães vai acolher dentro de poucos meses uma das Capitais Europeias da Cultura a concretizar em 2012, o que, naturalmente, aquando da aprovação da candidatura, veio reforçar a auto-estima e o orgulho dos residentes do município. Ficou, também, criada grande expectativa sobre os efeitos económicos, sociais e culturais derivados do acolhimento de tal mega-evento. Em anos precedentes, duas outras cidades portuguesas acolheram este evento cultural: Lisboa (1994) e Porto (2001).
A iniciativa da realização de Capitais Europeias da Cultura (CECs) foi lançada em Atenas, em 1985. Originalmente, os seus objectivos eram puramente culturais, pois procurava-se divulgar a cultura das cidades junto dos cidadãos europeus e, ao mesmo tempo, construir um espaço comum a partir do mosaico de culturas dos vários países. Com o passar dos anos, o conceito foi-se moldando às necessidades de cada cidade organizadora.
O ponto de viragem foi Glasgow, em 1990, que, ao contrário das anteriores cidades culturais (Florença, Amesterdão, Berlim e Paris), não era um destino cultural na Europa. Por isso, os objectivos da candidatura foram alargados, contemplando-se a regeneração urbana e a melhoria da imagem da cidade como destino cultural. Na avaliação do impacto económico do evento, a organização de Glasgow foi considerada um sucesso, gerando um benefício para a cidade devido ao acréscimo verificado no número de turistas e de receita associada.
Se a organização de um mega-evento como uma CEC pode contribuir para a dinamização da cultura local e para a preservação do meio ambiente e do património local, pode, igualmente, estar na origem de impactos negativos, de diversa ordem, incluindo o desenvolvimento de conflitualidade entre residentes e visitantes, decorrente da competição que se posse gerar no acesso a certos equipamentos e serviços, nomeadamente. Por esta razão, importa contar com o apoio dos residentes para que estes eventos possam ser bem sucedidos e os impactos positivos dos mesmos sejam majorados e prolongados no tempo.
Atento a esta dimensão, o autor deste texto, em parceria com outros investigadores, desenvolveu um estudo que consistiu em aferir como é que a imprensa local, através de dois semanários locais, “Notícias de Guimarães” e “O Povo”, se têm feito eco da posição da opinião pública e das associações culturais de Guimarães sobre a preparação da CEC 2012. O período coberto pela análise foi o que medeia entre Janeiro e Agosto de 2011.
Da análise de conteúdo das notícias e outros textos publicados, foi possível concluir que: i) foi elevada a produção de notícias de índole negativa, incidindo sobretudo sobre a estrutura de gestão da CEC 2012 e a relação frustrada que se foi verificando entre a autarquia local e a Fundação Cidade de Guimarães (FCG) ou entre esta entidade e a população; ii) foi identificada apenas a produção de uma notícia em que era levantada a preocupação com o que ficará para além de 2012, aparte as obras realizadas e os equipamentos que estão ou venham a ser criados; iii) fica por esclarecer porque é que existem associações que viram aprovados os seus projectos e outras que ficaram mais de um ano à espera de qualquer interacção com a FCG; e iv) resulta a impressão de que o fraco envolvimento da população não decorrerá tanto de um esquecimento por parte da entidade organizadora mas, antes, da prevalência de uma concepção pouco democrática na montagem da CEC, na sua dimensão programação cultural e planeamento de equipamentos e renovação urbana.
Exprimindo o seu desapontamento em relação ao evoluir da organização da CEC 2012, em comentário produzido em fórum electrónico, há poucos dias, dizia a propósito uma residente de Guimarães (Sara Oliveira) o seguinte: “Foi notória uma ânsia de protagonismo e tentativa de aproveitamento de vantagens financeiras [decorrentes] por parte de um grupo restrito de pessoas, cuja escolha pode ser questionada e que encontrou acolhimento por parte quem tem o poder de ´homologar` quem serão os agentes culturais que podem entrar para o Clube VIP da CEC 2012. É triste também verificar a opacidade em termos de informação, relativamente à programação concreta e aos agentes culturais que estarão envolvidos”.
Tentada que foi recentemente a correcção de trajectória da estrutura organizadora do evento, pode ser que a iminência do fracasso fique mais longe. Seguro é que o mega-evento ficará longe de vir a produzir os efeitos de renovação da dinâmica socioeconómica e cultural do município que se estimaria à partida que pudessem ocorrer, e as populações e os agentes de desenvolvimento presentes no território ambicionariam.
(artigo de opinião publicado em 2011/10/06 no Jornal de Leiria)
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