A região do Vale do Ave é constituída por dez municípios desde há muito tempo relacionados com a indústria têxtil. Na verdade, a história desta região começa por estar ligada ao linho e à sua transformação como actividade complementar da agricultura. As terras da bacia do rio Ave eram propícias à cultura do linho, pelo que as tecedeiras não tinham de se preocupar com a falta de matéria-prima, pelo contrário, esta era tanta que as senhoras aproveitavam cada momento para fiar e tecer.
Por volta de 1884, o linho deixa de ser a principal actividade industrial da região (a produção local do linho diminui e, por esta altura, o seu fio é importado) lugar que passa a ser ocupado pelo algodão. Graças ao seu baixo custo, à sua facilidade de transformação e aos diversos produtos finais possíveis, o algodão torna-se num produto muito popular e na primeira indústria nacional. Esta indústria instala-se no Porto mas vai migrando para zonas rurais que ofereciam menores custos de produção, quer pelo baixo preço da mão-de-obra, quer pela possibilidade de prolongar os horários laborais, quer pelo aproveitamento da energia hidráulica. Ora, é precisamente para aproveitar os benefícios energéticos dos cursos e quedas de água que fábricas algodoeiras, até então instaladas no Porto, se deslocam para a bacia do rio Ave. O excesso de produção de fio de algodão leva ao desenvolvimento da tecelagem surgindo fábricas que se dedicam a estas duas actividades simultaneamente.
A produção de algodão e de bens finais cujo fabrico depende do algodão torna-se de tal forma intensiva que, em 1899, a Associação de Classe dos Industriais de Tecidos de Algodão pede ao governo “para limitar o número de fábricas de tecidos, não permitindo por espaço de cinco anos mais montagens de fábricas, visto os depósitos acharem-se completamente cheios”. No entanto, apenas em 1931, o governo consegue dar resposta a esta solicitação com a institucionalização do chamado “condicionamento industrial”, cujo objectivo era estabilizar a produção, impondo regras para a criação, ampliação e reequipamento de empresas, procurando garantir a estabilidade das empresas instaladas e a manutenção do emprego. Só em condições especiais, mais concretamente, em alturas de guerras, era possível esgotar as quantidades que existiam em stock e aumentar a produção.
Na década de 50, grande parte das empresas do Vale do Ave redimensionaram-se e modernizaram-se sobrevivendo ao pós 25 de Abril de 1974 e afirmando-se como grandes empresas têxteis. Contudo, as crises no sector têxtil têm-se repetido. As empresas que até há bem pouco tempo pareciam estar no rumo certo, encontram-se neste momento a atravessar sérias dificuldades. A produção excessiva é apenas uma das diversas razões que levaram grande parte das empresas do Vale do Ave a encerrar portas. A falta de mão-de-obra qualificada, a produção domiciliária (da qual ainda hoje encontramos exemplos: é ainda frequente encontrarem-se pequenas unidades de tecelagem, confecção em garagens e barracões), falta de investimento na modernização das linhas de produção, a falta de competitividade dos produtos portugueses nos mercados estrangeiros (por exemplo, pela adopção da moeda única) e o surgimento da forte concorrência chinesa e indiana são alguns exemplos.
A região do Vale do Ave que outrora foi a grande impulsionadora da economia nacional, sendo responsável por uma percentagem significativa no PIB nacional, neste momento, encontra-se assolada pela grave crise financeira mundial sendo bem visíveis as consequências da mesma, entre elas, o desemprego. É difícil encontrar uma família que não tenha pelo menos um elemento desempregado, é praticamente impossível não conhecer uma história de um conhecido que tenha sido despedido. São muitas as famílias afectadas pelo desemprego, muitas vezes ambos os progenitores encontram-se em situação precária ou a receber o subsídio de desemprego.
No entanto, existem também empresas que são verdadeiros casos de sucesso e que devem servir de exemplo para todas as outras. São empresas que apostam na modernização, no design, na diversificação da oferta tentando produzir quase personalizadamente, na qualidade. Estas são algumas das chaves para abrir a porta de saída da crise, que deve ser encarada como uma oportunidade para atingir um fim e não como sendo um fim em si mesma. Um exemplo de sucesso é o grupo Somelos. Esta empresa exporta para mais de sessenta países, trabalhando com mais de dois mil clientes, entre os quais podemos encontrar nomes como Armani, Gucci, Ferrari, Burberry, e terminou o ano de 2010 com um volume de negócios consolidado de cerca de 63 milhões de euros. Este é um exemplo da aposta na qualidade do produto que é notoriamente valorizada pelo cliente.
A história do Vale do Ave é visível através de uma viajem ao longo deste. É impressionante a quantidade de edifícios que outrora eram o local de trabalho de milhares de pessoas, que respiravam e davam vida às localidades em que estavam instaladas, que agora se encontram abandonados, degradados, vandalizados. O drama social que se vive na região é, de facto, preocupante. Contudo, é possível dar a volta a esta situação de ruptura para a qual a maioria das empresas parece caminhar. Disto são exemplos empresas que apostam na qualidade do produto, no design, na diversificação do produto tentando oferecer diversos bens finais para diferentes públicos-alvo.
[Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Regional” do 3º ano do curso de Economia da EEG/UMinho]
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