segunda-feira, março 19, 2018

“Braga Barroca”: um ex-libris modesto

Braga é comumente associada à sua fundação romana. A sua história fundacional e a importância que detinha como Município Romano são aspetos fortemente exaltados no evento da “Braga Romana”. Contudo, Braga encerra em si uma herança bem demarcada da Era Barroca, sendo ainda mais patente a visibilidade do seu património edificado, ao contrário da carência de edificações romanas.
A arte Barroca prima por uma confusão agradável de elementos decorativos. Um cabal exagero cénico que nos transporta para uma Era de teatralidade materializada nas artes. É de facto com o barroco que assistimos a um exacerbar da arte e dos artistas. O embelezamento dos espaços torna-se uma prioridade. O novo gosto arquitetónico propõe um espetáculo do sensível, permitindo um modo de vivência humana focado na estética e naquilo que é belo e sumptuoso. Braga não foi indiferente e abriu portas a tal, deixando-se embeber por este atrativo estético da arte barroca ao ponto de hoje ser conhecida como a Capital do Barroco, “Portas” estas abertas graças, sobretudo, a D. José de Bragança e ao magnífico arquiteto e artista bracarense André Soares.
Foi exatamente por este motivo que em Setembro de 2014 a cidade decidiu, finalmente, apostar no evento “Braga Barroca”. Tal pretende glorificar este passado de grandioso esplendor e expressão artística, de quotidianos próprios e únicos de uma moda extravagante e sumptuosa.
A agenda cultural da “Braga Barroca” é promissora: o evento em si tem gerado excelentes críticas. A caraterização dos participantes e a performance dos atores, que encenam a vivência da época, são excelentes e com grande dignidade de reprodução histórica. Quanto aos vários conjuntos arquitetónicos da cidade alusivos ao barroco, estes têm sido, de forma geral, bem aproveitados sempre com o maior dos rigores e cuidados necessários para evitar exageros descomedidos e fantasias.
Apesar de tudo, o evento não têm grande destaque mediático, a afluência turística e o impacto económico é diminuto, se comparado com outros eventos da cidade. Tendo em conta a preenchida agenda que possuí, durante os cinco dias do evento, e estando ciente que a “Braga Barroca” sobressai pelo louvor a uma época de teatralidade, estravagância, imponência e verdadeira sprezzatura, seria de esperar que o evento fizesse jus a tal, contudo mantêm-se comedido, quase abafado, por outros eventos já existentes.
Trata-se de um acontecimento bastante recente e deve ser dado o espaço necessário para que cresça, se desenvolva e assuma uma derradeira posição no calendário cultural da cidade. Para tal, são necessárias algumas mudanças primordiais, que na minha opinião caso se não se efetuarem não vão permitir a devida expansão.
A primeira mudança deve ocorrer ao nível da sua calendarização. Setembro não me parece um período por excelência que justifique um acontecimento como este. A meteorologia é incerta, a época um tanto baixa para o turismo e a cidade está a meio gás - alguns ainda de férias, outros no começo das suas atividades laborais. Sendo assim, seria mais oportuna a escolha de outro período do ano para o posicionamento da “Braga Barroca”, de modo a atrair os curiosos e os interessados.
Uma segunda mudança passaria pela questão do cortejo. À semelhança da “Braga Romana”, também aqui se faz um cortejo onde personagens históricas se passeiam pelas ruas mostrando aos bracarenses o modo de vida e as roupas da época. No entanto, este cortejo barroco em nada se compara à amplitude, mediatização e afluência do público do cortejo romano, muito por culpa de uma imensa falta de divulgação. Para muitos, o facto deste se realizar durante a tarde não é conveniente, pois é sabido que para este tipo de atividades é mais propenso o horário noturno. Contudo, não é possível de todo a mudança visto que tal iria contra o rigor histórico, dado que neste momento é encenada a entrada triunfal de D. José de Bragança na cidade, um ato de consolidação do seu cargo como Arcebispo, sendo assim impensável essa mudança. Porém existem soluções que apaziguam aqueles que pretende uma maior dinamização noturna, que passariam pela participação em recriações de festas nos jardins dos palacetes ou mesmo em jardins públicos ou, quem sabe, um pequeno cortejo noturno onde as figuras se passeiem como em jeito de se dirigirem a um concerto ou uma festa social.
A época em si é recheada o bastante para que se dê azo à criatividade. São inúmeras as possibilidades de montagem de cenários da sociabilidade barroca, e a própria arquitetura bracarense é riquíssima e permite um fácil recuo a esses tempos excêntricos, possibilitando, assim, a todos os que assistem uma fácil associação entre o tempo e o espaço. Apenas é necessário exigir uma maior divulgação junto da população.

Andreia Margarida Fernandes Pacheco de Azevedo

Bibliografia[1]

Cabrerizo, Félix Alonso. «Braga Barroca: um evento de relevância», Correio do Minho, 8 de Novembro, 2017.
Loureiro, Joana. «Braga Barroca, uma herança recordada em cinco dias», Visão, 21 de Setembro, 2016.
Oliveira, Eduardo Pires de. Estudos sobre o século XVIII em Braga. Braga: Edições APPACDM Distrital de Braga, 1993.
Pereira, José Fernandes. Arquitetura Barroca em Portugal. Lisboa: Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1992.
Serrão, Vítor. História da Arte em Portugal – O Barroco. Lisboa: Editorial Presença, 2003.
Smith, Robert C. André Soares: arquitecto do Minho. Lisboa: Livros Horizonte, 1973.



[1] Sob a norma de Chicago.

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, do curso de Mestrado em Património Cultural do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)

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