É
do conhecimento geral o que é o contrabando. No entanto, cai-se por vezes no
erro de assumir que é uma atividade dos tempos modernos muito associada às
drogas, por exemplo. No entanto, o contrabando pratica-se há vários séculos,
sendo que em Portugal terá tido início por volta do séc. XIII.
Pretende-se
com este artigo explicar (de uma forma resumida) o que é o contrabando e de que
forma era praticado, assim como passou a produto turístico, nomeadamente na
zona de Portalegre, onde durante décadas foi contrabandeado café.
O
contrabando constitui a entrada clandestina de produtos num território
demarcado por uma fronteira político-administrativa (Rovisco, Fonseca &
Freire, 2009, cit in. Silva, 2009, p. 6). Surgiu em Portugal aquando da
definição da fronteira entre Portugal e Espanha, por volta do séc. XIII.
Durante séculos foram contrabandeados um sem número de produtos e de pessoas
(escravos que atravessavam a fronteira vindos de África), de acordo com as
necessidades de cada época específica. Era, maioritariamente, praticado por
gentes da terra que viam na atividade forma de providenciar o sustento que não
conseguiam apenas através da sua profissão.
Numa
fase inicial, quase todos tinham um trabalho convencional e dedicavam-se ao
transporte ilícito de mercadorias esporadicamente, com mais ou menos
frequência. Frequência essa que dependia sempre da resistência física e da
vontade de correr riscos, não esquecendo que sempre se tratou de uma atividade
bastante arriscada, não só por se tratar de uma travessia ilegal e, por si só,
perigosa, como também por ser extremamente desgastante física e emocionalmente.
Os
contrabandistas, ainda que na sua maioria jovens, percorriam quilómetros com
carregamentos às costas, percursos feitos durante a noite para assim tentar
evitar que fossem intercetados pelas autoridades. Faziam-no aliciados pelo
facto de poderem, em determinadas ocasiões, ganhar apenas numa noite quantias
que demorariam cerca de dois meses a arrecadar nas suas profissões.
Avançando
para o início do séc. XX, durante e após a guerra civil em Espanha (1936-1939)
o contrabando ganha outra expressão, nomeadamente na região de Campo Maior,
concelho de Portalegre. Começa a ser catalisador de movimentações nas camadas
sociais da altura. Deixa de ser uma atividade praticada pela necessidade e para
a sobrevivência para passar a ser uma forma de ascender na sociedade.
Coexistiam
nesta altura dois tipos de contrabando: o formal e o informal. Se numa altura
anterior esta prática era feita de forma mais solitária ou familiar, passa
também a existir uma forma organizada (Rovisco, Fonseca & Freire, 2009, cit
in. Silva, 2009, p. 6).
A
partir dos anos 70 há uma mudança no que diz respeito à forma como o contrabando
é realizado, e as indústrias do café passam a tomar conta da atividade, o que
faz com que deixem de existir contrabandistas “amadores” e muitas das pessoas
que anteriormente se dedicavam a esta atividade saem de Portugal.
O
contrabando fez parte do dia-a-dia de muitas pessoas durante décadas, e, ainda
que se tenha extinguido em Portugal (pelo menos este tipo de contrabando), são
muitas as memórias e as marcas deixadas, tanto na população como nas próprias
zonas do país onde era praticado. No entanto, pouco mais existia do que as
memórias de quem o viveu e os relatos de situações vividas há décadas.
Mundialmente
falando, existem alguns museus dedicados ao contrabando, sendo que na sua
maioria estão concentrados no Reino Unido. Em Portugal existe uma exposição
permanente “Espaço Memória e Fronteira” em Melgaço, museu criado em parceria
entre a Câmara Municipal de Melgaço e o Departamento de Ciências Sociais da
Universidade do Minho.
Por
outro lado, tem sido explorado outro aspeto do contrabando que foi sendo
tornado turístico: as rotas dos contrabandistas. Algumas destas rotas,
percorridas durante décadas durante as noites para levar mercadoria
contrabandeada de Portugal para Espanha, podem hoje em dia ser visitadas por
populares. Um dos exemplos é o município de Marvão, em Portalegre, que realizou
em Abril de 2016 uma caminhada em homenagem aos antigos contrabandistas
raianos. A rota, de 9 quilómetros, passa por várias aldeias ligadas à
atividade.
A
turistificação destas rotas permite, para além do valor turístico e económico
que traz à região, uma eternização da memória que as gentes têm do contrabando.
A memória do heroísmo do contrabandista que arriscava a vida para que
conseguisse melhores condições de vida.
O
contrabando foi preponderante em determinadas localidades no que diz respeito
ao desenvolvimento das mesmas. As más condições económicas aliadas à ambição de
melhores condições de vida proporcionaram um terreno fértil para o crescimento
desta atividade. Em Campo Maior, por exemplo, as torrefações que empregam
grande parte da população são uma consequência direta do contrabando na região.
Décadas
depois do fim do contrabando aposta-se agora na turistificação do mesmo,
através de exposições exemplificativas do que acontecia na altura e da abertura
das rotas dos contrabandistas ao público, que as pode percorrer, e assim se consegue
manter viva a memória do contrabando.
Sara
Carvalho
Referências
Freire, D.,
Rovisco, E., & Fonseca, I. (2009). Contrabando na fronteira
luso-espanhola: práticas, memórias e patrimónios (Vol. 1). Edição: Edições Nelson De Matos.
Zarinato H.S.,
& Ribeiro C.W. (2006). Patrimônio
cultural: a percepção da natureza como um bem não renovável. Revista Brasileira
de História, 26(51).
Webgrafia
http://www.viaalgarviana.org/wp-content/uploads/2015/07/Rota-do-Contrabandista-PT.pdf
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, do curso de Mestrado em Património Cultural do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)
(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, do curso de Mestrado em Património Cultural do ICS, a funcionar no 2º semestre do ano letivo 2017/2018)
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