quarta-feira, abril 10, 2019

Vaca das Cordas – um evento adaptável a mudanças?

A Vaca das Cordas, um dos maiores eventos que ocorrem na vila de Ponte de Lima, é uma tradição que remonta a 1646 e ocorre todos os anos, na véspera do feriado do Corpo de Deus.
Esta tradição consiste em obrigar um touro a sair à rua ao final da tarde, sendo preso por duas cordas e conduzido até à Igreja Matriz, onde é preso à janela de ferro da Torre dos Sinos, banhado com vinho tinto da região, dá três voltas à Igreja e levado para o areal junto ao Rio Lima, sendo sempre “desafiado” por populares durante o percurso, resultando frequentemente em sustos e ferimentos nestes últimos (por vezes, havendo casos mais graves).
No entanto, o evento Vaca das Cordas, principalmente nas últimas duas décadas, evoluiu para algo mais do que a corrida: é também tudo o que ocorre em seu torno, como a festa e animação durante a noite e os eventos gastronómicos focados nos produtos da região.
Nos últimos anos, temos também assistido a um aumento de movimentos defensores dos direitos dos animais contra, por exemplo, touradas ou o uso de animais em circos. A Vaca das Cordas, sendo uma atividade tauromáquica, não foi exceção, tendo sido, em 2018, alvo de uma petição dirigida ao Presidente da Assembleia da República, Presidente da Câmara de Ponte de Lima e Assembleia Municipal de Ponte de Lima que defendia o fim da tradição. Esta petição online foi assinada por 3211 pessoas.
Estes acontecimentos referidos no parágrafo anterior levantam algumas questões: será possível manter o evento sem a tradição? Será possível alterar a tradição mantendo a sua essência? Qual será o impacte de uma alteração destas proporções em termos de visitantes?
Tal como foi referido anteriormente, a Vaca das Cordas já não é apenas a corrida tauromáquica. É possível perceber que muitas pessoas que se deslocam ao centro histórico de Ponte de Lima durante o evento fazem-no pelas outras atividades (sendo provavelmente o maior exemplo disto a maior presença da camada jovem nas festividades noturnas, em comparação com a corrida). Os cada vez maiores movimentos defensores dos direitos dos animais refletem uma crescente mudança (ainda que lenta) de mentalidades da população em relação a este assunto.
Estes factos apontam para que o fim da corrida seja muito provável, ou seja: não começar a planear uma solução apenas irá fazer com que o evento, incluindo o que ocorre para além da atividade que dá o nome ao evento, “caia por terra”.
Culturas e tradições sofrem frequentemente mutações e acabam por evoluir, quer positiva quer negativamente, e o fim da corrida tauromáquica não seria nada mais do que isso. Em caso de mudança, é muito improvável que esta última se conseguisse manter, pois o touro e o que lhe é feito é o centro da desta. No entanto, as restantes atividades, havendo um maior empenho e investimento por parte do município e produtores locais, conseguiriam manter-se como um chamativo, tanto para turistas como para locais, principalmente tendo em conta o crescente número de visitantes da vila. A longa história e tradição da Vaca das Cordas abriria, também, portas para outras atividades, por exemplo, exposições, não necessariamente para vangloriar a corrida mas para mostrar que faz parte da história da “vila mais antiga de Portugal” e foi, efetivamente, algo que ajudou a colocar Ponte de Lima no radar do turismo.
O maior argumento contra o possível fim da corrida seria, provavelmente, as possíveis repercussões económicas que acabar com esta traria ao município e negócios locais. Contudo, tal como foi referido no parágrafo anterior, com o empenho, iniciativa, investimento e criatividade certos, o evento conseguiria aguentar a mudança e, possivelmente, melhorar-se, continuando assim a ser um ponto de paragem obrigatório para turistas e de convivência para os locais.

Diana Gonçalves

(Artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Património Cultural e Políticas de Desenvolvimento Regional”, do curso de Mestrado em Património Cultural do ICS, a funcionar no 2ºsemestre do ano letivo de 2018/2019)

Sem comentários: